Quênia acusa policiais de 'crimes contra a humanidade' em repressão a protestos de 2017
Tragédia ocasionou 94 mortes, 201 casos de violência sexual e mais de 300 feridos
Em uma ação histórica, o Ministério Público do Quênia acusou nesta sexta-feira (28) policiais de seu país de "crimes contra a humanidade" cometidos durante a repressão às manifestações pós-eleitorais de 2017.
As acusações incluem estupro, assassinato e tortura, além da morte de um bebê que se tornou símbolo da violência policial cometida após as eleições neste país do leste da África.
"Este é o primeiro caso de crimes contra a humanidade imputados no âmbito do direito nacional queniano, que utiliza a Lei de Crimes Internacionais, e também o primeiro processo penal por violência sexual relacionada às eleições", disse o procurador-geral, Noordin Haji.
Um funcionário da Procuradoria afirmou que 12 agentes de polícia, quase todos de alta patente, enfrentam acusações.
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A repressão policial após as eleições presidenciais de agosto de 2017 deixou dezenas de mortos em quatro meses. A Comissão Nacional dos Direitos Humanos do Quênia registrou 94 mortos, 201 casos de violência sexual e mais de 300 feridos atribuídos essencialmente às forças de segurança.
"Os ataques foram planejados, coordenados e não foram aleatórios", os delitos "foram cometidos por ou sob a autoridade de altos oficiais da Polícia Nacional", declarou o gabinete do procurador em nota.
Samantha Pendo, de seis meses de idade, morreu após ser agredida pela polícia em uma operação em Kisumu, no oeste do país. Os agentes lançaram gás lacrimogêneo em sua casa, antes de agredir sua mãe que a carregava nos braços. A autópsia revelou que Samantha sofreu graves lesões cranianas.
Uma investigação concluiu que cinco comandantes de polícia foram responsáveis por sua morte, e apesar de terem sido condenados, nunca foram para a prisão.
Uma decisão sem precedentes
O novo alto comissário de direitos humanos da ONU, Volker Türk, comemorou nesta sexta-feira a decisão "sem precedentes" das autoridades judiciais quenianas, que segundo ele, constitui um "passo importante para a responsabilização das flagrantes violações dos direitos humanos no Quênia".
Haji afirmou nesta sexta-feira que muitas pessoas viveram incidentes indescritíveis de dor e sofrimento durante a repressão aos protestos.
A polícia queniana é frequentemente acusada por grupos de defesa de direitos humanos de usar força excessiva e por mortes ilegais, especialmente em regiões pobres.
Este mês, o novo presidente William Ruto desarmou uma temida unidade policial, ativa por 20 anos e que foi acusada por mortes ilegais. Ruto também prometeu a reestruturação do setor de segurança.
Os protestos de 2017 eclodiram depois que foi declarada a vitória do então presidente Uhuru Kenyatta, que irritou os apoiadores de seu principal opositor, Raila Odinga. O resultado foi anulado pelo Tribunal Supremo, após uma contestação de Odinga, mas Kenyatta venceu as novas eleições.
Segundo o Missing Voices, um grupo ativista contra execuções extrajudiciais no Quênia, 1.264 pessoas morreram nas mãos da polícia, desde que começou a registrar dados em 2017.