Raquel Lyra veta íntegra de PL sobre "surfe" em ônibus: "Práticas ilícitas já são proibidas"
Governadora cita inconstitucionalidade no texto do veto, que será encaminhado para votação na Comissão de Justiça e plenário da Alepe
A governadora de Pernambuco, Raquel Lyra (PSDB), vetou a íntegra do texto do Projeto de Lei nº 1.366/2024, apresentado pelo deputado estadual Pastor Júnior Tércio (PP), que versava sobre a proibição das práticas de "surfe" e "morcegamento" nos ônibus da Região Metropolitana do Recife (RMR).
O texto havia sido aprovado pela Assembleia Legislativa de Pernambuco (Alepe) e foi alvo de vários protestos por parte dos rodoviários, que organizaram atos no Recife contra a eventual aprovação da lei.
No texto do veto, encaminhado na segunda-feira (25) e publicado na edição desta terça-feira (26) do Diário Oficial do Estado, a governadora cita que o Consórcio de Transportes da RMR (CTM) "manifestou entendimento em que ressaltou serem tais práticas ilícitas já proibidas pela legislação hoje vigente".
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O CTM destacou que o Código de Trânsito Brasileiro e o Código Penal já entendem as práticas de "surfe" e "morcegamento" como proibidas.
No artigo 235 do Código Brasileiro está previsto:
"Conduzir pessoas, animais ou carga nas partes externas do veículo, salvo nos casos devidamente autorizados:
Infração - grave;
Penalidade - multa;
Medida administrativa - retenção do veículo para transbordo"
E no Código Penal, no capítulo "Do Estelionato e Outras Fraudes", no artigo 176, está escrito:
"Tomar refeição em restaurante, alojar-se em hotel ou utilizar-se de meio de transporte sem dispor de recursos para efetuar o pagamento:
Pena - detenção, de quinze dias a dois meses, ou multa.
Parágrafo único - Somente se procede mediante representação, e o juiz pode, conforme as circunstâncias, deixar de aplicar a pena."
Raquel Lyra afirmou que o PL "tem o elevado propósito de combater" as práticas de "surfe" e "morcegamento". As práticas são definidas como andar no teto dos coletivos ou pendurado nas portas e/ou janelas.
"A teleologia da proposição normativa em questão já se acha devidamente contemplada na legislação nacional vigente, de modo que – em caso de não aprovação do presente Projeto de Lei – não haveria maior impacto, vez que (...) as condutas de surfe e de morcegamento nos ônibus já são proibidas", diz a governadora, no texto do veto.
Inconstitucionalidade
No veto, Raquel Lyra diz que o PL incorre em incompatibilidade com a Constituição Federal ao dispor sobre condições de trabalho do motorista de ônibus e atribuir-lhe novos deveres no exercício de sua profissão — segundo os incisos I e XVI do art. 22 da Constituição Federal tal competência é privativa da União.
"Ao determinar-se ser obrigação do motorista solicitar a interrupção da prática ilícita de surfe ou morcegamento nos ônibus e, ato contínuo, solicitar a intervenção da força policial, impedindo-o de movimentar o veículo enquanto não forem obstadas as referidas práticas, sob pena de aplicação de multa à concessionária, que fatalmente cobrará regressivamente do motorista pelo descumprimento da nova obrigação legal funcional, tais dispositivos inequivocamente avançam na dimensão da esfera trabalhista das obrigações do motorista de ônibus", explica a governadora no texto.
Raquel Lyra também cita que, do ponto de vista material, o PL atribui, ainda que indiretamente, ao motorista, "a coobrigação de prover a segurança pública nas vias públicas do Estado de Pernambuco, pois procede à cominação legal de condutas específicas por parte do motorista voltadas à interrupção das práticas criminosas".
"A segurança pública é dever do Estado e direito de todos, não sendo razoável que o próprio motorista de ônibus tenha parte na obrigação de enfrentamento desses crimes. Destarte, não se afigura proporcional o elevado grau de ônus que se opõe à classe dos motoristas, já que, diante dessas ilicitudes verificadas, são alçados à condição de garantidores da segurança pública, devendo resolvê-las sem o que não poderão movimentar os veículos e deverão interromper a viagem", completa Raquel.
A governadora fala que não parece ser a forma mais adequada de confrontar o problema atribuir a função ao motorista e que, conforme relato em audiências públicas por entidades do setor de rodoviários, tal atitude sujeitaria o próprio profissional e os pssageiros a "riscos pessoais" e à "integridade física".
Alepe
De acordo com a Assembleia Legislativa de Pernambuco (Alepe), como o veto foi por inconstitucionalidade, o mesmo será analisado pela Comissão de Constituição, Legislação e Justiça da Casa.
Em seguida, após o parecer da Comissão de Justiça, o veto será encaminhado para o plenário da Alepe, onde será acatado ou rejeitado pelos deputados estaduais.
Para que o veto seja derrubado, explica a Alepe, é necessário maioria absoluta. Ou seja, pelo menos 25 dos 49 deputados precisariam votar pela derrubada do veto.