Reflexões que geram Cidadania
Gerência da Secretaria de Educação forma professores para saber dialogar com alunos sobre os temas do cotidiano
Em uma sociedade onde o acesso à informação é cada vez mais rápido e livre de barreiras, os jovens são bombardeados com um volume intenso de temas. Impeachment, Big Brother, pregações religiosas, músicas carregadas de um forte conteúdo sexual, youtubers, o casal gay da novela... É mais do que natural que essa enxurrada de temas, que geram debates e reforçam posicionamentos, seja levada para o ambiente escolar. Nessa hora, como a escola deve se portar?
Nas unidades da rede estadual de ensino público, o posicionamento é não se abster dos debates. Muito pelo contrário. É papel da escola, dos professores, alimentar a reflexão entre os alunos sobre os mais diversos temas, a fim de que a educação cumpra a tarefa fundamental de promover Cidadania. Esse trabalho é tocado pela Gerência de Políticas Educacionais de Educação Inclusiva, Direitos Humanos e Cidadania (GEIDH), que conta com cerca de 50 profissionais que realizam formações para professores de todas as disciplinas e ainda atuam diretamente nas escolas, promovendo atividades com os estudantes.
“O professor, seja de Português ou Biologia, precisa também estar pronto para o diálogo sobre esse debate mais amplo que hoje está na sociedade. Nós o subsidiamos para que ele consiga ter propriedade de dialogar em pé de igualdade com um estudante que, lá na casa dele, soube, por exemplo, que um ataque motivado pela homofobia causou 50 mortos nos EUA. O jovem vai trazer esse debate para a sala de aula. E se a gente não promove uma reflexão sobre isso, sobre essa violação de direito, sobre a diversidade, sobre as diferenças, como é que esse professor vai ter condições de dialogar com esse aluno? A escola não vai estar cumprindo o seu papel de Cidadania”, questiona a gerente da GEIDH, Vera Braga.
O trabalho desenvolvido pela Gerência tem o poder de amenizar uma prática cada vez mais recorrente e discutida nas escolas, que é o bullying. Um ato de violência que, muitas vezes, nasce a partir de uma situação ocorrida fora do ambiente escolar. Através das atividades que promovem a reflexão sobre temas como diversidade étnica, religiosa e sexual, Direitos Humanos, relações interpessoais, entre outros, a GEIDH promove uma troca de informações com os estudantes.
“É uma produção de saberes. Esse aluno sai da comunidade, vem para a escola, traz suas questões e volta para casa. Se ele volta com questões que não são bem debatidas e refletidas, ele pode fortalecer e reproduzir um preconceito, uma agressão, e a violência pode se instalar na comunidade ou em casa. Ou pode ter o efeito inverso, de provocar uma outra reflexão que venha a erradicar o preconceito e a violência. Ele pode levar essa discussão, mais esclarecedora, com os argumentos que ele debateu na escola”, exemplifica Vera.
Esse contato com os alunos se dá nas aulas regulares e os professores são formados para saber como utilizar métodos e técnicas que promovam o debate e o pensamento sobre os temas discutidos. Em outros momentos, são realizadas rodas de diálogos, seminários, palestras, tanto no ambiente escolar quanto em outros locais que solicitam a presença dos técnicos da GEIDH, mesmo fora da rede estadual. O trabalho de formação continuada em serviço, acontece tanto com os formadores da própria Secretaria de Educação estadual (SEE), quanto com parceiros externos, como a Universidade Federal de Pernambuco, a Universidade Federal Rural de Pernambuco, o Instituto Federal Tecnológico ou diversas entidades não-governamentais.
Para que os professores sejam municiados não apenas com uma perspectiva teórica, mas, principalmente, com orientações didáticas e metodológicas, a GEIDH lançou, há alguns anos, o Caderno de Orientações Didáticas e Metodológica, distribuídos a todos os professores da rede. “Porque não adianta eu falar que o bullying precisa ser superado nas escolas se eu não dou ao professor as condições de vislumbrar como, didaticamente, ele pode trabalhar essa temática. Aliando com os conteúdos previstos pelo currículo. Por exemplo, um professor de Educação Física pode utilizar algumas dinâmicas, em seu espaço de aula, para provocar reflexões sobre o corpo, sobre o homem, a mulher, sobre questões de gênero de um modo geral”, explica Luciano Freitas, técnico da GEIDH.
Esporte como ferramenta de inclusão
O esporte é uma ferramenta importante para o processo de inclusão social de crianças e jovens. Sabendo disso, a Gerência de Políticas Educacionais de Educação Inclusiva, Direitos Humanos e Cidadania (GEIDH) da Secretaria de Educação do Estado se uniu à Secretaria de Turismo, Esportes e Lazer para realizar a Olimpíada Criança Cidadã, que realizou, este ano, a sua oitava edição.
O objetivo do evento é contribuir para a formulação, implementação e avaliação de políticas públicas de prevenção e enfrentamento da violência, por meio do esporte, em escolas localizadas em áreas de situação de vulnerabilidade social. Para a GEIDH, as duas semanas de atividades esportivas são, na verdade, a culminância de um processo que começa bem antes, com um trabalho que leva para os alunos dessas escolas a possibilidade de refletir sobre uma série de temas que, quase sempre, são agentes geradores a violência.
“O trabalho acontece durante todo o ano, com rodas de diálogo nessas escolas. A culminância acontece nessas duas semanas de práticas esportivas, onde os estudantes aprendem valores como perder e ganhar. A gente tem uma devolutiva que esses jovens voltam mais motivados, mais confiantes, para o seu ambiente escolar”, comenta a gerente da GEIDH, Vera Braga.
Os jogos deste ano aconteceram no mês de junho e reuniram cerca de dois mil alunos, com idades entre 14 e 17 anos, de 20 escolas da rede estadual. Eles competiram em nove modalidades: voleibol, handebol, futsal, atletismo, basquete, damas, xadrez, dominó e queimado. Visando à inclusão social, 30 alunos com necessidades especiais e alunos privados de liberdade dos Centros de Atendimento Socioeducativo (CASE) também tomaram parte do evento. “As Olimpíadas já acontecem há oito anos. Cada ano a gente aprimora mais. Esse ano colocamos estudantes com deficiência. Há dois anos a gente está incluindo os estudantes privados de liberdade”, explica Vera Braga.
Preocupação com projetos restritivos
O ambiente político do País e as discussões sobre os rumos que a educação irá tomar no novo Governo tem gerado uma série de incertezas entre os técnicos da Gerência de Políticas Educacionais de Educação Inclusiva, Direitos Humanos e Cidadania (GEIDH). Propostas como o projeto de lei Escola sem Partido, que tramita no Congresso Nacional, podem coibir o trabalho de quem promove o debate sobre assuntos que não fazem parte da grade curricular.
“Projetos dessa natureza são muito problemáticos para quem trata das temáticas dos Direitos Humanos, porque ele coíbe e inibe, basicamente, a autonomia do professor. E geralmente são as temáticas dos Direitos Humanos que geram impasses com os grupos religiosos e conservadores. É uma questão que a sociedade precisa estar atenta e discutindo”, afirma o técnico educacional da GEIDH, Luciano Freitas.
Segundo os profissionais da Gerência, é impossível dissociar o papel do professor do de um ator político. No sentido de ser alguém que está apto a promover o debate e o diálogo com os alunos sobre os mais diversos temas, sobre as mais diversas ideologias, algo que projetos como o Escola sem Partido questiona. “Eles esvaziam a prática do docente em termos de sentido. É como se o professor fosse um tecnicista e estivesse ali para ensinar os conteúdos sem provocar uma reflexão e alimentar o senso crítico. É um princípio ditatorial, que inibe o professor em termos de prática. Não defendemos que existam discussões político-partidárias, mas de temáticas que são necessárias para incluir pessoas”, ressalta Freitas.
Na visão dos técnicos da GEIDH, uma escola deve estar preparada para debater, nas salas de aulas, as diversas temáticas que fazem parte do dia a dia da sociedade. “Essa interlocução é uma das diretrizes da nossa gerência. A escola não pode prescindir de promover esse tipo de discussão. Esses projetos querem justamente inibir essa prática. Veja um exemplo: as novas organizações familiares são uma realidade na nossa sociedade. Pais homossexuais, famílias homoparentais. Independentemente da minha formação familiar ou religiosa, como é que eu vou fazer para incluir um aluno que vive essa realidade?”, pergunta a gerente Vera Braga.