Regime Maduro avança sobre imprensa e ONGs de direitos humanos
O VPI (Venezuelanos pela Informação) teve seu sinal retirado do ar por uma sanção imposta pela Conatel (Comissão Nacional de Telecomunicações)
Em uma mesma semana, a ditadura venezuelana, comandada por Nicolás Maduro, avançou sobre veículos de comunicação e ONGs de direitos humanos. Os ataques ocorrem logo depois da posse da nova Assembleia Nacional, de maioria chavista, que foi eleita em uma votação contestada do dia 6 de dezembro.
Os alvos foram o canal de streaming VPItv, que costuma ser o único a transmitir atos e entrevistas da oposição, os sites independentes Efecto Cocuyo, Tal Cual, El Pitazo e Caraota Digital, o jornal regional Panorama (Maracaibo) e as ONGs Médicos Sem Fronteiras, Provea (Programa Venezuelano de Educação e Ação em Direitos Humanos) e Azul Positivo.
O VPI (Venezuelanos pela Informação) teve seu sinal retirado do ar por uma sanção imposta pela Conatel (Comissão Nacional de Telecomunicações), o Tal Cual teve sua página suspensa indefinidamente, e o Efecto Cocuyo está sendo acusado de receber financiamento direto do governo do Reino Unido – o que o site nega.
Os Médicos Sem Fronteiras estão se retirando de parte do país devido a restrições a seu trabalho, e a ONG Azul Positivo teve cinco membros presos no estado de Zulia.
A Anistia Internacional condenou, na quinta (14), as "recentes campanhas de estigmatização e operativos empreendidos pela administração de Maduro contra meios de comunicação na Venezuela". Acrescentou, ainda, "que calar esses meios é privar a sociedade de informar-se sobre abusos de direitos humanos praticados".
A Organização das Nações Unidas também divulgou um comunicado, afirmando estar "profundamente preocupada pelos constantes ataques contra organizações da sociedade civil, de direitos humanos e jornalistas na Venezuela". Disse que a prisão dos cinco ativistas de direitos humanos foi ilegal.
"O jornalismo independente é a última fronteira para que o governo tenha controle total dos meios de comunicação na Venezuela", diz à reportagem a jornalista Luz Mely Reyes, uma das fundadoras e diretoras do Efecto Cocuyo.
O site é atacado por veículos alinhados ao governo, como a Globovisión e o jornal El Universal – antes independente, mas há alguns anos comprado com fundos públicos e repassado a empresários ligados ao chavismo.
Desde o início do regime, os principais canais de TV foram expropriados, e jornais tradicionais, acabaram vendidos ou sufocados.
"Foram nos tirando o papel, o acesso ao que é preciso para manter o jornal impresso. Agora, estamos só no digital, mas nossa página só pode ser vista fora da Venezuela. Na Venezuela, ela está bloqueada. Distribuímos nossas notícias e apurações por redes sociais", diz à reportagem Miguel Enrique Otero, diretor do El Nacional, principal jornal independente do país.
Otero está no exterior, pois na Venezuela é alvo de processo por difamação por conta de revelações de corrupção sobre Diosdado Cabello, o número dois do chavismo, veiculadas pelo jornal.
Em 2020, o Colégio Nacional de Jornalistas (CNP) registrou 944 ataques à liberdade de expressão, como ameaça a jornalistas e fechamentos de meios de comunicação. De 2004 a 2019, saíram do ar 165 emissoras de rádio, 18 canais de TV e 42 jornais.
"Essa é uma ditadura diferente. Porque não fecha tudo diretamente. O que é concessão estatal é retirado. O que é privado é comprado ou sufocado economicamente. Isso vai durar muito tempo. Porque eles tentam passar ao mundo a ideia de que não estão censurando tudo, mas na verdade estão, ao fazer com que nosso trabalho seja quase impossível", diz Otero. "É pior que uma ditadura".
Desde que a nova Assembleia Nacional tomou posse, porém, os avanços ficaram mais evidentes. Cabello, que é vice-presidente do PSUV (partido do chavismo), afirmou querer fazer com que saiam do país as ONGs ou outras organizações que permitem a entrada de dinheiro para a ajuda humanitária. Segundo ele, esse dinheiro financiar o trabalho dos opositores.
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"Os ataques têm como objetivos a criminalização da cooperação internacional na Venezuela, mesmo aquela que é prevista por leis e tratados internacionais dos quais o país é signatário", diz Reyes.
Na filial venezuelana da VPItv, cuja sede é em Miami, a Conatel entrou com agentes da polícia e confiscou equipamentos e documentos. "A medida de tirar nosso canal do ar fará com que deixemos de emitir nosso sinal a todo o país. Mas continuaremos fazendo nosso trabalho pelos meios que forem possíveis. Estamos fazendo isso há cinco anos", disse o canal, que emprega cem jornalistas e técnicos, em comunicado.