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Guerra

Resposta de Israel ao Irã trava em divergências no Gabinete de Guerra e cálculos sobre represálias

Desconfiança entre membros do conselho que define abordagem militar e preocupação com repercussão da ação escolhida impediram uma resposta imediata e prolongam impasse com o regime de Teerã

Gabinete de guerra de Israel reunido no domingo, logo após ataque iraniano Gabinete de guerra de Israel reunido no domingo, logo após ataque iraniano  - Foto: Gabinete do Premier de Israel via AFP

O Gabinete de guerra de Israel marcou uma nova reunião para esta quarta-feira, pelo 4º dia seguido, em uma nova tentativa de definir como será a resposta militar ao ataque direto do Irã contra o seu território — ou mesmo se haverá reação. Embora uma série de propostas esteja sobre à mesa, divergências entre os membros do conselho e cálculos estratégicos delicados travam a decisão final, prolongando a espera pelo próximo movimento no tenso jogo político disputado pelos países.

Conselho responsável por traçar as ações militares do país, o Gabinete de guerra é formado por cinco integrantes, três deles com poder de voto: o primeiro-ministro, Benjamin Netanyahu, o ministro da Defesa, Yoav Gallant, e o ex-general Benny Gantz, principal rival político de Bibi. Como as reuniões do Gabinete acontecem a portas fechadas, não está claro qual proposta é defendida por cada um deles. O que é certo é que a ausência de uma resposta até este momento decorre da falta de entendimento entre os três.

O pouco do que se sabe sobre o conteúdo das reuniões do órgão de segurança vem de informações vazadas por fontes israelenses. Autoridades ouvidas pelo New York Times, em anonimato, afirmaram que Gantz e o general reformado Gadi Eisenkot — um dos membros observadores do Gabinete, sem poder de voto — argumentaram que Israel deveria responder imediatamente, entendendo que uma resposta rápida em autodefesa daria uma legitimidade óbvia à ação.

Publicamente, Gantz se manifestou com certa cautela. Ele prometeu, ainda no sábado, uma resposta ao Irã, mas por meio de uma "coalizão regional" e que o regime de Teerã seria cobrado no "preço certo", na hora e da forma que o país decidisse.

Gallant, que chegou a defender ataques preventivos contra Hezbollah no começo da guerra em Gaza, também foi mais cauteloso sobre agir diretamente contra o Irã, pelo menos nos últimos dias. Em uma linha similar a de líderes militares, como o chefe do Exército, Herzi Halevi, ele classificou uma resposta como inevitável, sem detalhar nenhuma ação em especial.

Quanto a Benjamin Netanyahu, o que chamou atenção foi o silêncio e a presença pública contida após o ataque iraniano. Pressionado por integrantes da extrema direita de sua coalizão de governo a tomar uma atitude decisiva contra o Irã, o premier mantém um afastamento dos grandes gestos e aparições, ao passo que também é pressionado externamente por aliados, como os EUA, para não provocar uma escalada de tensões ainda maior na região.

Embora reconheçam que uma série de fatores estratégicos delicados estão em discussão, analistas apontam que a relação de desconfiança entre os homens no órgão de segurança, anterior à formação do Gabinete, podem estar pesando na hora de tomar uma decisão tão importante para o país quanto agir contra Teerã.

Gantz é o principal rival político de Netanyahu, apontado por pesquisas de opinião como o favorito para liderar o governo se houvesse uma eleição hoje. Ele aderiu, no começo do mês, ao pedido de manifestantes por eleições antecipadas — algo que o coloca em linha-direta de disputa com Netanyahu, que tenta se manter no poder a todo custo por uma série de problemas com a justiça que podem levá-lo à cadeia.

O premier, por sua vez, tentou demitir o ministro da Defesa no ano passado, após o início da guerra contra o Hamas. O motivo seriam comentários críticos de Gaza, a pessoas próximas, de que Bibi teria fracassado nas políticas anteriores relacionadas ao enclave palestino. Gantz e Gallant quase não tinham relação antes da formação do Gabinete de guerra.

— A falta de confiança entre essas três pessoas é muito clara e muito significativa — disse Giora Eiland, ex-general israelense e conselheiro de segurança nacional, em entrevista ao jornal Wall Street Journal.

À parte as desavenças pessoais, há sinais de que o trio está trabalhando de forma intensa para chegar a uma decisão calibrada, que atenda a expectativas internas e externas. Na terça-feira, o Gabinete convocou conselheiros de segurança para uma reunião demorada em Tel Aviv, antes de convocar uma novo encontro a portas fechadas para esta quarta.

Em visita a Israel, nesta quarta-feira, o ministro das Relações Exteriores do Reino Unido, David Cameron, reuniu-se com Netanyahu e Gantz. Em uma declaração após o encontro, ele disse estar convencido de que o país lançaria uma ação contra o Irã.

— É evidente que os israelenses estão tomando a decisão de agir — disse Cameron. — Nós esperamos que eles façam isso de uma maneira que provoque a menor escalada possível.

Propostas à mesa
Informações vazadas à imprensa internacional por fontes israelenses afirmam que algumas propostas foram debatidas nos últimos dias, que vão desde um ataque direto contra o Irã, até uma decisão de não fazer nada neste momento. Ainda não há consenso sobre o que está mais perto de sair do papel.

Autoridades ouvidas pelo New York Times dizem que uma das hipóteses estudada implicaria em conduzir um ataque agressivo contra um alvo iraniano, como uma base do Corpo da Guarda Revolucionária Islâmica, em um país que não o Irã, como a Síria. A desvantagem, dizem, é que faltaria a simetria de responder a um ataque direto a Israel com um ataque direto ao Irã.

Outras alternativas seriam atacar um alvo simbólico dentro do Irã, o que provavelmente exigiria consulta aos EUA e arriscaria irritar os americanos que desaconselharam um ataque frontal, ou conduzir um ataque cibernético à infraestrutura do país. O problema da segunda abordagem seria expor prematuramente as capacidades cibernéticas de Israel, além de configurar uma resposta menos incisiva do que o grande ataque aéreo lançado de Teerã, mesmo que os danos, na prática, tenham sido poucos.

Uma ação direcionada, com pequenos ataques dentro do Irã, incluindo assassinatos seletivos executados pelo Mossad também surgiu como sugestão, mas o fato de Israel não assumir a autoria deste tipo de ação, não corresponderia à natureza pública do ataque do Irã.

Por fim, existe a hipótese de que nada seja feito neste momento. Isso permitiria a Israel alavancar a aliança internacional e regional que se uniu para ajudar a repelir o ataque iraniano, incluindo Jordânia e Arábia Saudita. Isso poderia ser reforçado por uma abordagem diplomática mais intensa, com expansão de sanções contra o Irã. O grande problema desta resposta seria, aos olhos de setores dentro do país, o enfraquecimento da dissuasão israelense — levar o Irã a acreditar que pode agir contra o território do país, sem o receio de uma resposta no mesmo sentido.

Analistas também apontam que a decisão sobre o Irã pode ser afetada pelo andamento da guerra em Gaza, com o planejamento de uma ação em Rafah tendo uma implicação direta na resposta. Concentrar os esforços no sul do enclave palestino sem temer um novo ataque direto iraniano é uma possibilidade considerada razoável.

— Israel não será capaz de levar a cabo uma ofensiva em Rafah e uma resposta contra o Irã ao mesmo tempo — considera Michael Horowitz, diretor do gabinete de segurança de Le Beck. — Haverá uma sequência e uma decisão que terá de ser tomada”, garante à AFP. 

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