Saiba como é a Catedral de Milão, onde ocorre o funeral de Berlusconi nesta quarta (14)
Cerimônia será transmitida ao vivo pela televisão e em dois telões posicionados em frente à igreja; Itália decretou luto nacional pela morte do ex-primeiro-ministro
Conhecido como um dos políticos mais extravagantes da Itália, o ex-primeiro-ministro Silvio Berlusconi, morto na segunda-feira aos 86 anos, terá um funeral compatível com seu estilo: o funeral de Estado será realizado nesta quarta-feira, às 15 horas, na Catedral de Milão, uma das mais célebres e complexas edificações em estilo gótico da Europa.
O caixão ficará exposto por alguns minutos e a cerimônia será transmitida ao vivo pela televisão e em dois telões posicionados em frente à igreja. Também foi decretado luto nacional, um gesto do qual o vaidoso fundador do Força Itália se gabaria.
De acordo com a imprensa local, o funeral deve replicar o esquema já testado nos últimos anos com grandes eventos na cidade: número limitado de convidados, entradas controladas com portões bem visíveis e rotas de fuga para eventuais intervenções de veículos de emergência. O plano de segurança foi desenvolvido nesta terça-feira em uma reunião no Palazzo Diotti, sede da Prefeitura de Milão, e após uma inspeção no interior da Catedral.
O presidente Sergio Mattarella e a primeira-ministra Giorgia Meloni estarão presentes. Também são aguardados o presidente iraquiano, Abdul Latif Rashid, o emir do Qatar, Tamim bin Hamad al-Thani, ambos os capitães-regente da República de San Marino, Alessandro Scarano e Adele Tonnini, o primeiro-ministro húngaro, Viktor Orbán, e os chanceleres da Croácia, Gordan Grli-Radman, Kosovo, Meliza Haradinaj-Stublla, Malta, Ian Borg, e Tunísia, Nabil Ammar. Além de representantes do governo da Armênia, Holanda, Sérvia e um enviado especial do primeiro-ministro japonês Fumio Kishida. Haverá também 47 embaixadores e sete encarregados de negócios, de acordo com o canal Skytg24.
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Não está claro, porém, onde o quatro vezes primeiro-ministro da Itália será enterrado. De acordo com o jornal Today da Itália, fala-se do Cemitério Monumental de Milão — onde repousam milaneses ilustres —, mas também do mausoléu que o próprio Berlusconi construiu em Arcore, dentro do parque da Villa San Martino, onde morava desde 1974, distante 25 km do centro de Milão. A obra foi concluída em 1990, mas nunca inaugurada.
Mármore raro
A Duomo di Milano, como é conhecida a catedral, possui dimensões monumentais: seu interior conta com cinco naves, divididas por 40 pilares e mais de 17 mil metros quadrados (157 metros de comprimento por 109 metros de largura), com pés direitos que chegam a 45 metros de altura. Seu transepto — a galeria transversal do edifício, que separa o coro da grande nave e forma os braços da cruz — possui três naves.
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A construção da Catedral de Milão começou em 1386 sob a iniciativa do arcebispo Antonio da Saluzzo, em um estilo gótico tardio de influência francesa e centro-europeia, distinto ao estilo corrente na Itália de então. Mas, oficialmente, só foi concluída em 1965, 579 anos depois, explicando o ditado italiano para algo que nunca termina: “è come la fabbrica del Duomo” ou “é como a construção da catedral”.
O edifício, juntamente com as cerca de 3.400 estátuas e entalhes que adornam seus incontáveis cantos e recantos, contrafortes, torres e pináculos, é trabalhado com raro mármore rosado extraído de uma única pedreira nas encostas dos Alpes, cerca de 100 km para o norte. Suas características físicas e químicas únicas o tornam particularmente bonito, apesar de bastante frágil, o que faz com que o Duomo seja também um ícone de manutenção extraordinariamente cara há seis séculos, exigindo cuidados constantes.
— O mármore pode quebrar repentinamente — disse ao New York Times Francesco Canali, gerente local da Veneranda Fabbrica del Duomo, a associação responsável pela restauração e preservação do monumento desde 1387.
Segundo Canali, veios no mármore contêm vestígios de materiais ferrosos e quando eles, ou os pinos de ferro colocados ao longo dos séculos para ligar as pedras, oxidam, eles se expandem e estilhaçam o mármore em “pequenos pedaços ou até lascas”.
As mudanças climáticas e a poluição estão aumentando os desafios. As ondas de calor recorde dos últimos verões significam que as diferenças de temperatura entre as partes da catedral mais expostas ao sol e aquelas na sombra ao norte podem colocar um estresse adicional no monumento. Poluentes como óxido nítrico e dióxido de enxofre criam crostas negras no mármore, "como o tártaro que prenuncia cáries nos dentes", explicou Canali.
Especialistas da Veneranda Fabbrica monitoram de perto o bem-estar estrutural do Duomo, com todo o monumento conectado com sensores que fornecem medições digitais constantes de vários tipos, “como um eletrocardiograma em funcionamento permanente”, contou Canali. Duas vezes por ano, também, os elementos estatuários e decorativos da catedral passam por um exame físico por trabalhadores especializados que se penduram em guindastes, inspecionando-os em busca de fraturas e fissuras.
Do risoto ao boxe
Situada na região da Lombardia, no norte do país, a catedral de Milão reina inquestionavelmente como o marco mais querido da capital financeira e da moda da Itália. Sua fama, porém, extrapolou as fronteiras nacionais após o domingo de 13 de dezembro de 2009, quando Berlusconi foi agredido com uma miniatura em metal do duomo durante um comício na cidade. O então primeiro-ministro foi atingido na cabeça por um indivíduo que sofria de distúrbios mentais, segundo a imprensa italiana reportou à época, e a pancada lhe deixou dois dentes quebrados e cortes na boca, além de contusões no rosto.
Após o ataque, as réplicas da catedral bateram recordes de venda e instantaneamente se esgotaram nas lojas, sendo a maioria dos clientes opositores ao governo do então premier. A reprodução de sua forma gótica e pontiaguda, com 136 pontas de mármore, explica a gravidade dos ferimentos ocasionados em Berlusconi, que precisou ser amparado por seus seguranças e ficou sob observação por 24 horas no Hospital de Milão.
A fama do Duomo di Milano, porém, se espalha por diversos setores. Há apenas um século, havia um café no topo do edifício onde os milaneses se reuniam para socializar e fofocar. No local, os operários da construção da catedral descobriram que o açafrão que usavam para colorir os vitrais de amarelo tinha um efeito colateral saboroso quando adicionado às cubas de risoto preparado para o almoço, agora conhecido como risotto alla Milanese.
E se os santos e mártires dominaram por séculos como as imagens favoritas da catedral, os escultores ao longo dos anos se aventuraram em figuras mais contemporâneas, incluindo o boxeador Primo Carnera, campeão mundial dos pesos pesados na década de 1930, e até mesmo uma pequena cabeça do ex-presidente dos Estados Unidos Abraham Lincoln (1861-1865). Centenas de estátuas e motivos decorativos também foram substituídos, tendo os originais acabado num cemitério de reposição nos arredores da cidade. (Com The New York Times)