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Vacinação

Saúde ainda não tem protocolo para evitar contaminação em locais de vacinação contra Covid-19

Vacinação deve ser iniciada em meio à transmissão comunitária do coronavírus Sars-CoV-2

Testes da vacina de Oxford contra a Covid-19Testes da vacina de Oxford contra a Covid-19 - Foto: Nelson Almeida/AFP

A vacinação contra a Covid-19 vai exigir um plano para evitar a transmissão da doença nos pontos de vacinação, que inicialmente deverão receber os mais velhos, que são do grupo prioritário e passam por mais riscos.
 
O Ministério da Saúde ainda não tem orientações específicas para garantir segurança contra o coronavírus para quem vai aos postos de vacinação.
 
O Plano Nacional de Operacionalização da Vacinação contra a Covid-19, entregue ao STF (Superior Tribunal Federal) neste último sábado (12), após semanas de pressão da instituição e da sociedade civil, diz apenas que a organização da unidade de saúde deve ser feita para evitar aglomerações. "Deve-se pensar na disposição e circulação destas pessoas nas unidades de saúde e/ou postos externos de vacinação", afirma o documento, sem dar nenhum detalhe ou orientação clara.
 
Tudo indica que a vacinação deve ser iniciada em meio à transmissão comunitária do coronavírus Sars-CoV-2 no país, quando o risco de qualquer pessoa se infectar ainda é alto. As datas para o início da campanha de imunização contra a Covid-19 ainda não estão claras – o governo federal anunciou que iniciaria em março e o governo do estado de São Paulo diz que pretende começar a vacinar em janeiro.
 
O Reino Unido, primeiro país a aprovar uma vacina contra a doença pelas vias usuais – após a finalização da terceira fase de testes em humanos (clínicos) – deu início à vacinação da população no dia 8 de dezembro e publicou uma série de orientações específicas para evitar a contaminação pelo vírus nos locais de vacinação.
 
As principais vacinas em desenvolvimento são oferecidas em duas doses com um intervalo de alguns dias entre elas. A vacina da Pfizer e da empresa de biotecnologia alemã BioNTech, que é aplicada no Reino Unido, tem um intervalo de 21 até 28 dias entre as aplicações. Isso indica que o tempo até que a proteção contra a doença esteja consolidada no corpo pode levar mais de um mês.
 
"A proteção maior só vem após a segunda dose. Até que uma porcentagem grande da população esteja vacinada, mesmo os vacinados terão de seguir medidas de proteção individual. Não existe vacina 100% eficaz e ainda não sabemos se os imunizados podem se infectar e transmitir o vírus, embora não fiquem doentes", afirma Denise Garret, epidemiologista e vice-presidente do Sabin Vaccine Institute, sediado nos Estados Unidos.
 
O planejamento da campanha de vacinação no Reino Unido é feito há meses, e as orientações estão em constante atualização. No documento publicado pelo Serviço Nacional de Saúde (NHS) que define os procedimentos nos locais de vacinação, atualizado nesta última quinta-feira (10), a instituição pede que os pontos de vacinação tenham produtos para higienização das mãos e entradas e saídas separadas para propiciar um fluxo contínuo e evitar interações desnecessárias entre os pacientes.
 
Os ambientes fechados devem ser grandes o suficiente para permitir o distanciamento e os pacientes podem aguardar sua vez no estacionamento, dentro de seu carro, ou em outras áreas externas. A vacinação no Reino Unido ocorre mediante marcação prévia em um sistema nacional.
 
"Precauções para controle da infecção devem ser mantidas por todos os funcionários, em todos os locais, o tempo todo", diz o texto.
 
O monitoramento das pessoas imunizadas, este previsto no documento brasileiro, também é essencial. No Reino Unido, dois funcionários do NHS tiveram uma reação alérgica após receberem a vacina da Pfizer, ainda no primeiro dia da vacinação nacional.
 
Logo após as ocorrências, a MHRA, agência regulatória britânica, emitiu um alerta e mudou as orientações de segurança para os locais de vacinação. Embora raras, reações alérgicas a qualquer vacina podem acontecer. Mesmo assim, a agência determinou que pessoas com histórico de alergias graves a medicamentos, vacinas ou alimentos não deveriam mais receber o produto e proibiu a segunda dose para aqueles que tiverem sintomas de alergia após a primeira aplicação.
 
A agência acrescentou ainda um protocolo para responder a possíveis episódios semelhantes, determinando que injeções de adrenalina estejam próximas sempre que a vacina da Pfizer for aplicada em alguém para combater a reação alérgica. Os profissionais envolvidos na imunização devem conhecer técnicas de ressuscitação para socorrer os pacientes caso seja necessário e observar os recém vacinados por pelo menos 15 minutos.
 
Nos Estados Unidos, o Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) divulgou ainda em outubro um guia para o programa de vacinação contra a Covid-19. Embora não tão concreto quanto o documento britânico, o texto prevê treinamento para os funcionários e monitoramento continuado dos vacinados para avaliar a segurança da substância.


"O Programa Nacional de Imunizações (PNI) é muito bom para a vacinação de rotina, mas vai ter de ser adaptado para algo sem precedentes, uma demanda fora do comum", diz Garret. Segundo a médica, a experiência nas campanhas anteriores jogam a favor do país. Ela cita como exemplo a última campanha de vacinação contra a gripe, realizada durante a pandemia, que contou com opções para vacinação mais segura como o drive-thru.
 
Mas essa experiência pode não ser suficiente na situação que o país deve enfrentar pela frente. Se a vacinação contra o coronavírus for iniciada em março, pode coincidir com o início das campanhas de imunização contra a gripe (que tem um grupo prioritário e de risco semelhante). Para ela, o planejamento deveria levar em conta um espaço entre essas vacinações para que as reações adversas possam ser observadas com segurança.
 
"A campanha vai precisar de mais pessoal trabalhando e horário estendido. Locais amplos e ao ar livre, como estacionamentos e estádios, podem ser aproveitados para dar mais segurança aos grupos de risco", afirma Raquel Stucchi, infectologista e professora da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas).
 
Vacinação por etapas e equipes para levar o imunizante até a casa dos mais debilitados, ações já adotadas em campanhas anteriores, devem ser mantidas, diz Stucchi.
 
De acordo com a médica, é preciso haver um esforço de comunicação para incentivar as pessoas a voltarem aos postos para uma segunda dose, e esses pacientes não podem se misturar com os que vão aos locais para receber a primeira dose.
 
A população também deve ser informada sobre qual é a vacina que está tomando, pois os produtos não são intercambiáveis: quem receber a primeira dose da Coronavac, a vacina comprada pelo governo do estado de São Paulo, não pode tomar uma segunda dose da vacina da Pfizer/BioNTech, adquirida pelo governo federal, por exemplo.
 
As especialistas veem com preocupação o que consideram atraso e falta de coordenação do governo federal para centralizar as ações na construção de uma estratégia de vacinação. "É uma planejamento complexo e eu não vejo o Ministério da Saúde preparado para isso neste momento. Houve comodismo, incompetência e falta de interesse. O país tem um histórico de vacinação e estrutura muito boa, mas não adianta nada se não tiver vacina e planejamento", afirma Garret.
 
"Vejo as iniciativas isoladas de estados e municípios com tristeza. O processo deveria ser centralizado pelo governo federal. Deveríamos aproveitar toda a nossa experiência adquirida nas campanhas anteriores para planejar a vacinação contra a Covid-19. Podemos perder tudo o que foi construído com muito esforço por décadas", conclui Stucchi.

 

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