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HIV: estudo internacional identifica como vírus escapa da terapia antiviral

Cientistas descobriram que uma proteína chamada SLFN12 faz com que o HIV entre em estado de "dormência" e não seja reconhecido pelos medicamentos

Partículas do HIV (azul claro) se replicando a partir de uma célula infectada (roxo). Partículas do HIV (azul claro) se replicando a partir de uma célula infectada (roxo).  - Foto: NIAD

Embora a terapia antirretroviral (TARV) tenha avançado em ritmo surpreendente nas últimas décadas, proporcionando a pessoas com o HIV vidas longevas e saudáveis, a cura ainda não é uma realidade no tratamento. Pesquisadores têm se mostrado otimistas em chegar a um procedimento capaz de eliminar o vírus de forma acessível, mas um dos entraves para esse objetivo é o fato de o HIV entrar em um estado de “dormência” no organismo. Agora, em um novo estudo internacional, cientistas da Espanha e do Japão descobriram uma proteína envolvida nesse mecanismo, o que, para eles, abre um novo caminho para se alcançar a cura.

"A latência (dormência) é uma grande barreira que impede a eliminação do vírus em indivíduos infectados pelo HIV. Não seremos capazes de curar uma infecção existente até que nos livremos das células infectadas em estado latente. É por isso que é essencial entender como funciona essa latência", explica o autor do estudo Andreas Meyerhans, professor e pesquisador do Instituto de Pesquisa e Estudos Avançados (ICREA) da Universitat Pompeu Fabra, na Espanha, em comunicado.

Publicado na revista científica Communications Biology, o trabalho identificou que uma proteína chamada Schlafen 12 (SLFN12) é um fator que impede a reversão do HIV do estado de latência para o ativo. A dormência é um problema porque os antivirais alcançam apenas os patógenos ativos. Com isso, o tratamento consegue manter o HIV sob controle, mas, quando interrompido, essas células com o vírus latente acordam e voltam a se replicar – impedindo a cura.

No estudo, os cientistas escrevem que, embora o mecanismo que leva parte dos vírus ao estado de latência tenha um papel essencial para a eliminação do HIV, ele não é totalmente compreendido pela ciência. Mas agora, eles descobriram que essa proteína, a SLFN12, restringe “a produção de partículas virais”, explica Mie Kobayashi-Ishihara, autora do estudo e pesquisadora do departamento de Biologia Molecular da Universidade Keio, no Japão.

Dessa forma, “essas células são infectadas de forma latente, invisíveis ao sistema imunológico e às terapias anti-HIV", explica a especialista. Schlafen é, inclusive, uma palavra de origem alemã que significa “dormindo”. Essa família de proteínas, além da agora identificada no HIV, também já foi associada a unidades envolvidas no câncer e na sensibilidade a medicamentos e outras funções antivirais.

Com essa descoberta, os cientistas acreditam que abre um novo caminho para desenhar estratégias terapêuticas que busquem a eliminação do vírus que, quando não controlado, causa a Síndrome da Imunodeficiência Humana Adquirida (Aids).

"Bloquear as funções antivirais do SLFN12 deve aumentar a expressão da proteína viral e, assim, permitir que o sistema imunológico do hospedeiro e os medicamentos antivirais eliminem melhor os reservatórios virais (locais onde ficam os vírus em latência). Depois de começar a produzir o vírus, ele se torna visível novamente. Você recupera seu alvo. Então, você pode atacar e, com sorte, eliminar definitivamente as células infectadas latentes", diz Meyerhans.

Encontrar uma estratégia que leve à cura de forma acessível é o principal desafio hoje no combate ao HIV. No mundo, cerca de cinco pessoas já atingiram a remissão do vírus, isto é, tiveram ele eliminado do organismo e sem retornar mesmo deixando de lado a terapia antirretroviral.

No entanto, os casos foram específicos de pacientes que sofriam com quadros de câncer em que precisavam de um transplante de medula óssea. Os cientistas sabem que existem pessoas que carregam uma mutação genética que faz com que as células não expressem o CCR5, um receptor utilizado pelo HIV como uma “porta de entrada”. Com isso, ao selecionarem os doadores de medula, buscaram indivíduos com a mutação.

A técnica de fato levou os cinco pacientes à cura, uma vez que, quando os vírus em latência acordaram, não conseguiram se replicar já que as células não tinham mais o receptor CCR5. No entanto, não é uma alternativa replicável em larga escala, já que o transplante é um procedimento de alto risco, que faz com que viver com vírus seja menos perigoso.

Ainda assim, as descobertas em relação ao CCR5 têm motivado outras técnicas para eliminar os vírus em dormência de forma mais simples. Recentemente, um estudo publicado na revista científica Proceedings of the National Academy of Sciences (PNAS) por pesquisadores da Lewis Katz School of Medicine na Temple University e pelo Centro Médico da Universidade de Nebraska, ambos nos EUA, mostrou um desses caminhos.

Os cientistas relataram testes com animais de uma nova terapia de edição genética voltada para dois alvos: o HIV e o CCR5. Junto com os medicamentos antirretrovirais, a estratégia levou 58% dos camundongos que participaram do estudo à remissão.

"A ideia de reunir a excisão do DNA do HIV-1 com a inativação do CCR5 usando tecnologia de edição de genes baseia-se em observações de curas relatadas em pacientes humanos com HIV”, explica Kamel Khalili, professor da Lewis Katz School of Medicine, em comunicado.

“(A terapia de edição genética dupla) é uma abordagem simples e relativamente barata. O tipo de transplante de medula óssea que trouxe curas em humanos é reservado para pacientes que também têm leucemia. Requer várias rodadas de radiação e não é aplicável em regiões com recursos limitados, onde a infecção por HIV tende a ser mais comum", complementou Khalili.

O próximo passo será testar a novidade em primatas não humanos, para que, caso se mostre de fato eficaz e seguro, passe para estudos com humanos e, eventualmente, seja uma possibilidade na prática clínica.

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