Seca no Uruguai faz jorrar água salgada nas torneiras de Montevidéu; governo vai construir tubulação
Principal reservatório de água doce da usina que abastece a cidade está com apenas 3,1% da capacidade, por causa da estiagem
O Uruguai está correndo contra o tempo para construir uma tubulação que garanta o abastecimento de água doce na área mais populosa do país, onde, há mais de dois meses, as torneiras só recebem um líquido salgado, consequência do agravamento da seca extrema no país.
Em Paso Valdez, que fica a 65 quilômetros a noroeste de Montevidéu, o governo avançou na instalação de 13,3 quilômetros de canos para levar água do rio San José ao rio Santa Lucía, onde fica a única usina que fornece o recurso natural desde o século XIX aos 1,8 milhão de pessoas que vivem na capital uruguaia e arredores.
A empresa estatal OSE está construindo uma barragem e uma estação de bombeamento no rio San José para aliviar o déficit hídrico que afeta a região há mais de três anos. As obras devem ser concluídas em 30 dias, estimou o presidente Luis Lacalle Pou, no mês passado.
A medida é urgente, uma vez que a principal reserva de água doce da usina de Aguas Corrientes está quase esgotada. Em 11 de julho, restavam apenas 2,09 milhões de metros cúbicos no reservatório Paso Severino, que a alimenta, apenas 3,1% da capacidade total, segundo o último relatório oficial.
Água salgada
Diante da crescente escassez, a OSE construiu a represa Belastiquí, uma barragem emergencial para garantir que o fluxo da parte baixa do rio Santa Lucía — que vem do estuário do rio da Prata e contém água salgada do Oceano Atlântico — chegue a Aguas Corrientes.
Victoria Ichazo, subgerente de produção de Aguas Corrientes, destaca que três novas bombas se somaram às outras três que já faziam a captação no baixo Santa Lucía. Inicialmente, a água não era tão salgada, mas a seca que atinge toda a região também reduziu a água doce fornecida ao estuário pelos rios Uruguai e Paraná.
A usina estratégica, que completou 150 anos em 2018, passou pelo último grande projeto de infraestrutura ainda na década de 1980, quando aumentou as reservas de água doce para a área da capital com a construção da barragem de Paso Severino.
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'Exceção temporária'
Na capital e arredores, são consumidos 500 mil metros cúbicos de água diariamente. Em maio, o Ministério da Saúde Pública chegou a autorizar uma "exceção temporária" dos níveis máximos permitidos deste recurso fornecido pela OSE, aumentando para até 440mg/l de sódio e 720mg/l de cloretos, marca acima da regulamentação que estabelece o limite de 200mg/l e 250mg/l, respectivamente.
“A água fornecida pela OSE é segura, exceto para certas populações”, disse pelo Twitter a ministra da Saúde Pública, Karina Rando, na terça-feira, relembrando que é recomendável não beber mais de um litro por dia em caso de hipertensão e evitá-la em casos de doença renal crônica, insuficiência cardíaca, cirrose ou gravidez.
— Quando você escova os dentes é horrível, sente a água salgada, é nojento — descreveu Isabel Moreira, uma aposentada de 73 anos, que vive em Montevidéu. Ela reclama que precisa comprar água mineral para beber (com custo de R$ 78 por semana) e que o sal da água está queimando o sistema de aquecimento do reservatório de sua casa, assim como ocorre com outros moradores da capital uruguaia,
No centro de Montevidéu, Nicolás Pérez dirige uma empresa que aumentou consideravelmente as vendas de água mineral, isenta de impostos desde o mês passado.
— Eles têm levado até 12 (recipientes entre 6 e 10 litros) por pessoa. Depois temos lojas, restaurantes e alguns hotéis que têm levado até 20 — calcula Pérez.
No Parque Batlle, o principal da cidade, o primeiro poço perfurado pela OSE para extrair água subterrânea produz cerca de 30 mil litros por hora, que são distribuídos por caminhões-pipa aos hospitais. Desde o início de julho, o governo fornece dois litros de água mineral por dia para mais de 500 mil pessoas em situação de vulnerabilidade que moram na região metropolitana.