Sisu 2025 não teve bônus para alunos locais pela primeira vez desde 2010
Decisão do STF de proibir benefício a estudantes que moram na mesma região da universidade incomodou instituições, que agora buscam alternativas
O Sistema de Seleção Unificada (Sisu) 2025, cujas inscrições terminaram nesta terça-feira, não teve, pela primeira vez desde 2010, vagas com qualquer tipo de bônus regional — uma pontuação extra que 1,3 mil cursos deram para candidatos que vivessem nas imediações dos campi. Essa foi uma decisão do Supremo Tribunal Federal ( STF) que incomodou as universidades, especialmente de áreas distantes de grandes centros urbanos, e que agora buscam alternativas. Uma delas, inclusive, deixou o Sisu já neste ano.
O bônus regional é uma medida que ganhou tração no Norte, Nordeste e Centro-Oeste. Ele aumenta a nota dos candidatos de ampla concorrência — um aluno não pode escolher concorrer pela cota e ganhar o auxílio — que moram na mesma área da universidade. O acréscimo é de 3%, 5%, 10%, 15% ou 20%, dependendo da instituição. A abrangência geográfica dos beneficiados também varia a cada universidade. Algumas aumentam a nota apenas para moradores da cidade, mas também há aquelas que consideram uma região administrativa ou o estado inteiro.
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No ano passado, o doutorando de Economia do Insper que pesquisa o tema Pedro Borges descobriu que cursos com bônus regionais recebem menos alunos de outros estados do que outros com perfil semelhante. Em outras palavras, isso significa que eles são eficientes no objetivo de reservar essas vagas.
Por isso, o tema viveu nos últimos anos sob intenso questionamento. As universidades alegam que a expansão das instituições de ensino superior a partir de 2007 — o chamado Reuni — tinha como um dos objetivos contribuir para o desenvolvimento de regiões interiorizadas, com a formação e fixação de pessoas e profissionais qualificados.
— O que se observa, na prática, é que a maioria das vagas, principalmente em cursos mais procurados, passa a ser ocupada por estudantes oriundos dos grandes centros e que, impreterivelmente, retornarão para suas origens após a conclusão do curso — defendeu o pró-reitor de Gestão Acadêmica da Universidade Federal do Sul da Bahia (UFSB), Francesco Lanciotti. — O bônus regional não está focado no favorecimento do indivíduo: ele surge como um instrumento que busca atenuar as desigualdades verificadas e corrigir essa distribuição.
Em agosto do ano passado, no entanto, a ministra Cármen Lúcia, relatora do caso no STF, alegou que a norma, embora tenha boas intenções, é contrária à Constituição, que proíbe distinções entre brasileiros com base em origem ou procedência. Ela foi seguida de forma unânime pelos colegas da Primeira Turma, composta também por Alexandre de Moraes, Luiz Fux, Cristiano Zanin e Flávio Dino.
A decisão, no entanto, gerou uma ampla reação entre as universidades que defendem esse mecanismo. A Universidade Federal de Rondonópolis (UFR), por exemplo, decidiu sair do Sisu e passou a usar um sistema de seleção próprio, que foi aberto também na última sexta-feira, mesmo dia do Sisu. A instituição de Mato Grosso também vai usar a nota do Enem e já anunciou que aplicará um bônus de 15% nas notas dos estudantes que cursaram integralmente o ensino médio no estado.
Outras instituições se mantiveram no Sisu, mas declararam ao Globo que vão analisar medidas para atender demandas regionais. A Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira (Unilab), que tem campus em Redenção (Ceará), Acarape (Ceará) e São Francisco do Conde (Bahia), afirmou que está estudando a possibilidade de realização de vestibular próprio para inclusão de políticas afirmativas regionais. Já a Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT) afirmou que “está comprometida em garantir acesso ao ensino superior para os estudantes da região” e, por isso, “constituiu uma comissão para elaborar novas formas de ingresso que atendam à regionalidade”.
“Como recebemos a notícia do MEC em meados de dezembro, não houve tempo hábil para realizar alterações no processo seletivo deste ano. No entanto, estamos planejando a implementação de uma nova modalidade de ingresso a partir do próximo ano, que incluirá a reserva de um percentual de vagas, com critérios que estão sendo avaliados, como a análise do histórico escolar. É importante ressaltar que a UFMT continuará utilizando o Sisu como principal via de seleção, mas busca alternativas para atender às demandas regionais e fortalecer nosso compromisso com a inclusão educacional”, alegou.
No Ministério da Educação, existe um grupo de trabalho com reitores que defendem essa medida para a discussão do tema. Em nota, a pasta afirmou que “vem dialogando com as instituições de ensino e demais atores envolvidos, a fim de estruturar medidas que atendam às especificidades regionais e garantam transparência, equidade e eficácia no processo seletivo” e informou que, para esse ano, a estimativa é de que ainda no primeiro semestre sejam realizados estudos técnicos para fundamentar a discussão e orientar a melhor execução dessas políticas públicas.