Soldados israelenses se filmam demolindo áreas civis e zombando da destruição em Gaza em vídeos
Porta-voz militar israelense disse que o Exército age conforme a 'necessidade operacional' e que segue as leis da guerra
Um soldado israelense dá um sinal de positivo para a câmera enquanto dirige um trator de esteira por uma rua em Beit Lahia, no norte da Faixa de Gaza, empurrando um carro danificado em direção a um prédio parcialmente desabado. "Acho que perdi a conta de quantos bairros 'apaguei'", diz a legenda do vídeo postado em seu TikTok pessoal, acompanhado de um hino militar. Desde a invasão de Israel em outubro, os soldados têm compartilhado vídeos de Gaza nas redes sociais, oferecendo um olhar raro e não autorizado sobre as operações no terreno. Alguns foram vistos por pequenos círculos de pessoas; outros alcançaram dezenas de milhares.
O New York Times revisou centenas desses vídeos. Alguns mostram partes comuns da vida de um soldado — comendo, socializando ou enviando mensagens para entes queridos em casa. Outros mostram soldados vandalizando lojas locais e salas de aula escolares, fazendo comentários pejorativos sobre os palestinos, demolindo o que parecem ser áreas civis e pedindo a construção de assentamentos israelenses em Gaza, uma ideia inflamatória promovida por alguns políticos israelenses de extrema direita.
Alguns dos posts dos soldados violam regulamentos das Forças Armadas de Israel que restringem o uso de mídias sociais por seu pessoal, os quais especificamente proíbem compartilhar conteúdo que possa "afetar a imagem das Forças Armadas e suas percepções aos olhos do público" ou que mostre comportamento que "prejudica a dignidade humana".
Em um comunicado, o Exército israelense condenou os vídeos filmados por soldados mencionados na matéria do NYT: "A conduta que emerge das filmagens é deplorável e não está de acordo com as ordens do Exército". Acrescentou que as "circunstâncias" estavam sendo examinadas.
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Mas novos vídeos continuam aparecendo on-line, um lembrete das muitas maneiras pelas quais as redes sociais estão mudando a guerra. Na Rússia e na Ucrânia, os soldados agora compartilham vídeos diretamente do campo de batalha, frequentemente publicando imagens de combate, às vezes até dando uma perspectiva em primeira pessoa de câmeras montadas em capacetes. Vídeos também foram postados mostrando tortura e execuções.
Com a guerra de Israel em Gaza sob intenso escrutínio, muitos dos vídeos dos soldados filmados em Gaza têm alimentado críticas. Um deles foi exibido e outros cinco também foram citados como evidência no caso que a África do Sul levou à Corte Internacional de Justiça acusando Israel de genocídio, uma acusação que foi negada categoricamente.
Nenhum dos soldados que filmaram e postaram os vídeos respondeu quando solicitado para comentar.
Mais de 27 mil palestinos foram mortos em Gaza desde o início da guerra, de acordo com as autoridades de Saúde em Gaza. A ofensiva de Israel seguiu os ataques liderados pelo Hamas em Israel em 7 de outubro, que mataram cerca de 1.200 pessoas, segundo autoridades israelenses.
Base na 'Praia Nova'
Após sua invasão terrestre no final de outubro, o Exército israelense estabeleceu bases ao longo da costa norte de Gaza. A área, chamada de Praia Nova pelos soldados, em referência ao festival de música onde 364 pessoas foram mortas pelo grupo terrorista Hamas em 7 de outubro, é o cenário de muitos dos vídeos de mídia social revisados pelo NYT.
"Esta era minha casa, sem eletricidade, sem gás", diz a música enquanto um soldado se acomoda entre os escombros da casa danificada antes de se dirigir à janela e fazer gestos para uma cena de destruição do lado de fora. A casa foi destruída no final de dezembro, mostram imagens de satélite.
— É de partir o coração, desumano — disse Basel al-Sourani, advogado internacional de direitos humanos do Centro Palestino de Direitos Humanos, uma organização sem fins lucrativos sediada na Cidade de Gaza, ao NYT. — Apenas demonstra que os israelenses basicamente querem que você saia de sua casa, da Faixa de Gaza.
Usando outro meme popular, o mesmo soldado também postou um vídeo no meio de novembro ao som de um remix chamado "Shtayim, Shalosh, Sha-ger", ou "Dois, três, lançar". No clipe amplamente compartilhado, os soldados dançam diante da câmera, e quando a palavra "lançar" é ouvida, o vídeo corta para uma cena de um prédio sendo explodido.
Pouco depois de o jornal questionar o TikTok sobre os vídeos apresentados nesta reportagem, os clipes foram removidos da plataforma. Um representante da rede de compartilhamento de vídeos disse que os vídeos violaram as diretrizes da empresa, incluindo suas políticas sobre discurso de ódio e comportamento.
A Meta, que é dona do Facebook e do Instagram, não respondeu a um pedido de comentário.
Brecha para demolições
Algumas das contas mais ativas revisadas pela reportagem pertenciam a soldados de unidades do Corpo de Engenharia de Combate do Exército israelense, que utiliza maquinário pesado, incluindo tratores de esteira, para desobstruir caminhos, descobrir e destruir túneis e derrubar estruturas.
Em um vídeo filmado nos arredores de Khan Younis, no sul de Gaza, no início de janeiro, soldados podem ser vistos fumando narguiles antes que explosões derrubem prédios residenciais ao fundo. Em seguida, eles erguem copos para brindar uns aos outros.
Um soldado compartilhou uma foto em 12 de dezembro em sua conta do TikTok com três tratores de esteira blindados e uma paisagem destruída perto da base israelense na costa norte de Gaza. "Isto é depois de muito trabalho. Todo o lugar estava coberto de vegetação e casas até chegarmos lá", diz a legenda.
Cerca de 1,5 quilômetro ao sul ao longo da costa, uma destruição similar pôde ser vista em imagens de satélite capturadas no final de dezembro, mostrando que pelo menos 63 edifícios, incluindo casas, foram removidos. Na época, a área estava cerca de 2 quilômetros da fronteira do território controlado por Israel, de acordo com mapas publicados pelo Instituto de Estudo da Guerra.
Os destroços visíveis dos edifícios são consistentes com os métodos de limpeza utilizados pelas unidades de engenharia de combate, conforme visto em vídeos filmados em outros lugares de Gaza e analisados pelo NYT. Israel tem usado tratores de esteira para limpar vastas áreas de terra e propriedades em toda Gaza desde o final de outubro.
O jornal enviou as coordenadas de cada uma das 63 estruturas ao Exército israelense e pediu comentários sobre a necessidade militar para a destruição delas. Em uma resposta por escrito, o Exército afirmou que Israel "estava atualmente lutando uma guerra complexa" e que "há dificuldades em rastrear casos específicos com uma coordenada específica neste momento".
Quatro especialistas legais revisaram os vídeos de mídia social e as imagens de satélite perto da base e disseram que as imagens poderiam ser usadas para mostrar destruição ilegal, uma violação das Convenções de Genebra.
John Quigley, professor emérito de direito da Universidade Estadual de Ohio, especializado em direito internacional dos direitos humanos, afirmou em um e-mail que "o escopo da destruição de edifícios residenciais em Gaza sugere que as Forças Armadas israelenses estão usando um padrão de proteção de propriedade privada que não está em conformidade com os padrões internacionais de guerra".
Em resposta a perguntas sobre a demolição de casas civis pelos soldados, um porta-voz militar israelense, Major Nir Dinar, disse que o Exército age conforme a "necessidade operacional" e segue as leis da guerra.
— As casas que estão sendo destruídas são edifícios que representam uma ameaça para as forças em operação, ou são um alvo militar de algum tipo — disse ele por telefone. — Cada alvo que está sendo eliminado, há uma boa razão para essa eliminação.
Israel também está realizando demolições controladas ao longo dos 36 quilômetros da fronteira terrestre de Gaza para criar uma "zona de segurança". Especialistas legais questionaram a legalidade dessas demolições, observando que é improvável que todos os edifícios destruídos representassem uma ameaça militar imediata.