Stalker de MG: todo perseguidor tem um problema mental? Especialistas respondem
A artista plástica, Kawara Welch, de 23 anos, foi presa pelo crime de stalking após perseguir um médico de Ituiutaba, MG
A artista plástica, Kawara Welch, de 23 anos, foi presa no início de maio pelo crime de stalking após perseguir um médico de Ituiutaba, em Minas Gerais. Segundo a vítima, a mulher chegou a mandar 1.300 mensagens e ligar 500 vezes para ele e sua família.
Segundo o delegado do caso, Rafael de Freitas Faria, a jovem acreditava ter um relacionamento com o médico e chegava a frequentar os mesmos ambientes que o homem. O médico chegou a registrar mais de 40 boletins de ocorrência contra a mulher.
Mas muitos questionam se todo stalker tem problemas mentais. O Globo conversou com um médico psiquiatra e uma psicanalista que revelaram que não necessariamente. Segundo eles, o comportamento perseguidor pode ter relações com transtornos de personalidade e outros problemas mentais, porém não é critério diagnóstico para nenhuma doença.
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"Ele pode ser sintoma de um quadro de doença mental. Apesar de não ser um critério determinante, o ato pode ser parte, uma das informações e um dos sintomas que constituem o quadro de doença mental" afirma a a psicanalista Fabiana Guntovitch, especializada em comportamento humano.
O médico psiquiatra Rodrigo Martins Leite, professor colaborador do Instituto de Psiquiatria da Universidade de São Paulo (USP) diz ainda que o comportamento stalker pode ter associação com transtornos de personalidade do tipo borderline ou antissocial e eventualmente com transtornos delirantes persistentes.
"A erotomania, por exemplo, um delírio persistente em que a pessoa se apaixona por alguma figura idealizada pode explicar o comportamento dessa mulher" afirma o médico.
A doença citada é a mesma que muitos especialistas citaram como sendo de Martha (Jessica Gunning), na série da Netflix que virou febre nas últimas semanas, “Bebê Rena”. Também chamada de síndrome de Clèrambault, é uma desordem delirante em que a pessoa acredita que alguém, em geral de um status mais elevado, podendo ser mais rico, bonito, ou até mesmo uma figura pública, está apaixonado por ela.
Também chamada de “síndrome do amor”, ela pode ser dividida em três fases. São elas:
- Sentimento de esperança: a pessoa acredita que é amada por um determinado indivíduo;
- Sentimento de decepção: nesta fase, o paciente desenvolve sentimentos vingativos baseados na mágoa por seus sentimentos não serem correspondidos;
- Sentimento de ódio: por fim, a pessoa sente muita raiva, a ponto de se tornar ódio. Este sentimento resulta em ameaças vingativas ao indivíduo que ela acredita que ama.
Apesar de não ser muito comum, essa forma de delírio pode resultar em violência ou até mesmo em algo mais grave contra o interesse amoroso ou contra pessoas que sejam consideradas possíveis rivais do paciente.
"Nem todo stalker é doente mental e nem todo doente mental é um stalker. Não podemos justificar o ato como uma doença, mas não podemos excluir a possibilidade de uma doença numa pessoa que persegue os outros" explica Guntovitch.
Segundo a psicanalista, a Stalker de MG, pela intensidade de perseguir o médico, pode ter uma questão mental que precisa ser olhada.
"Ela me parece estar desconectada da realidade, ter no mínimo uma ansiedade importante ou um quadro de mania, mas não podemos fazer o diagnóstico só pelo ato de stalkear" diz.
Leite concorda e diz ainda que o ato pode ser simplesmente resultado de:
"Comportamento criminoso, sendo cabíveis as sanções legais" diz o psiquiatra.
Transtorno de Personalidade Borderline
A condição é considerada muito comum no Brasil com mais de dois milhões de casos por ano no país. A raiva é um sentimento comum no transtorno, causada pelos pensamentos de abandono e negligência. Esse receio é um dos sintomas mais presentes, mesmo em estágios iniciais, e podem correr para tais extremos a ponto do paciente se isolar voluntariamente para evitar que outros o façam.
Os indivíduos que sofrem do Transtorno de Personalidade Borderline (TPB) tem medo de que as emoções fujam do controle e, por isso, tendem a se tornarem mais irracionais em situações de muito estresse, criando dependência em relação a outras pessoas e “válvulas de escape” para se sentirem mais confortáveis.
De acordo com o Instituto de Psiquiatria Paulista, o tratamento mais adequado para pessoas com Borderline é a conciliação entre o atendimento psicológico e o psiquiátrico. Os dois tipos de profissionais são aptos para realizar o diagnóstico da doença. Apesar de não ter cura, o uso de medicamentos pode ser indicado para minimizar os sintomas, fazendo com que o indivíduo possa seguir a vida sem maiores prejuízos. É importante lembrar que o ambiente tem um peso importante no manejo do transtorno, sendo indispensável uma rede de apoio saudável na vida do paciente.
Os três tipos de tratamento também são considerados para Erotomania. A ideia da utilização de medicamentos é tratar dos sintomas de maneira isolada, com combinação de antidepressivos, estabilizadores de humor e antipsicóticos, por exemplo, sempre conciliados ao tratamento psicoterapêutico.