"Surfe" em ônibus: texto de projeto sofre alterações e retira multa para infrator
Alegando que motoristas poderiam ser penalizados pela lei, grupos da categoria protestaram esta semana
O texto do projeto de lei que pretende proibir as práticas de "surfe" e "amorcegamento" nos ônibus da Região Metropolitana do Recife (RMR) passou por alterações após protestos de rodoviários.
Um dos pontos mudados é o que citava, no texto anterior, que os ônibus deveriam ter a circulação vedada enquanto houvesse pessoas praticando o "surfe" e o "amorcegamento". O motorista não poderia seguir viagem enquanto o infrator não se retirasse das partes externas do veículo.
Esse tópico foi um dos que motivou as manifestações dos rodoviários, na segunda-feira (4), no Recife, e na terça-feira (5), em Olinda. A reportagem questionou à Assembleia Legislativa de Pernambuco (Alepe) se o projeto precisará novamente passar pelas comissões da casa e aguarda resposta.
O novo texto também retirou a parte que previa multa ao infrator, anteriormente de 10 a 100 vezes o valor da tarifa aplicável ao transporte, consideradas as circunstâncias da infração.
Leia também
• "Surfe" em ônibus: PGE diz ter prazo de 15 dias para emitir parecer sobre projeto aprovado
• "Surfe" em ônibus: Raquel Lyra diz aguardar parecer da PGE antes de sanção ou veto a projeto de lei
• Homem que fazia "surfe ferroviário" cai em trilhos do Metrô do Recife, nesta sexta (25); CBTU se pronuncia
O texto anterior citava que:
Constatada a existência de usuário descumprindo o disposto nesta Lei, caberá ao motorista, fiscal ou qualquer outro responsável pelo transporte:
I- solicitar imediatamente ao usuário que interrompa a prática; e
II - caso o usuário não a interrompa, solicitar a intervenção da força policial.
Agora, o novo texto diz que:
Os responsáveis pelos veículos deverão adotar as seguintes providências caso constatem a existência de usuário descumprindo o disposto nesta Lei:
I - convidar o usuário a se retirar do veículo; e
II - caso o usuário não se retire do veículo, solicitar a intervenção policial.
Reunião com o deputado
Membros da Associação de Benefícios Independente dos Rodoviários de Pernambuco (Abirpe) se reuniram com o autor do projeto, o deputado estadual Pastor Júnior Tércio (PP), na terça-feira, para repassar as queixas da categoria.
Essa questão da parada do coletivo diante da infração foi um dos pontos abordados pelo grupo, que faz oposição à atual gestão do Sindicato dos Rodoviários e fechou o TI PE-15 por três horas na terça-feira.
O deputado Pastor Júnior Tércio ressaltou que a parada deve ser feita na presença de autoridade policial e que a multa, também rechaçada pela categoria, não seria aplicada ao profissional, mas à empresa.
"A nossa lei, ela é uma lei que fala dos princípios, é uma lei genérica. Lá no finalzinho, diz que ela será regulamentada pelo Governo do Estado. Mesmo que a lei esteja bem clara que a multa é para a empresa, nós vamos nos comprometer junto com o Governo do Estado de deixar isso bem claro. A multa será da empresa", detalhou o parlamentar.
O artigo 4º do novo texto do projeto também alterou a questão da multa, antes dada ao infrator e à empresa. O documento agora cita que, numa primeira infração, seria dada uma advertência aos "estabelecimentos que descumprirem o disposto". Em caso de recorrência, a penalidade passaria a ser uma multa fixada entre R$ 1 mil e R$ 100 mil, "de acordo com a natureza e proporção da ocorrência". Valores seriam corrigidos pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA). Nesse novo texto, o termo "infrator" foi retirado.
Outras alterações
Na nova redação da lei, também está detalhado que a proibição compreende, além dos coletivos da RMR, outros veículos destinados ao transporte rodoviário, como demais ônibus, vans e autolotações; veículos de transporte aquaviário, como barcos, ferry boats e similares; e ao transporte ferroviário, como trens, metrôs ou VLTs.
Em 25 de outubro, um homem caiu nos trilhos do Metrô do Recife enquanto praticava o "surfe" ferroviário e precisou ser levado para o Hospital da Restauração.
O texto agora cita que é "obrigatória a fixação de avisos proibitivos nos locais abrangidos". O cartaz indicado deve ter "indicação do número e data" da lei, possuir "letras legíveis", ter "fácil visualização" e contendo a expressão "É proibido (sic) a prática de surfe e 'morcegamento', sob pena de multa".
Segundo o site da Alepe, o texto foi enviado ao Poder Executivo na tarde de terça-feira.
Sanção ou veto
Questionada sobre o tema, a governadora Raquel Lyra (PSDB) afirmou aguardar parecer da Procuradoria Geral do Estado de Pernambuco (PGE-PE) para sanção ou veto — o projeto depende dessa decisão da chefe do Executivo estadual para virar lei ou ser rejeitado.
"É claro que é muito importante impedir o que a gente chama de 'surfe' em cima dos ônibus. De fato, não sei como foi dada a questão de responsabilização. Prefiro que o parecer da procuradoria possa vir", argumentou a governadora.
A PGE-PE afirmou que tem um prazo de 15 dias para enviar parecer referente ao projeto de Lei nº 1.366, aprovado em segundo turno na Alepe, na última quarta-feira (30).
"A solicitação para encaminhamento de parecer foi recebida pela PGE-PE nesta terça-feira (5)", afirmou o órgão, em nota enviada à reportagem.
Antes da aprovação em segundo turno na Alepe, o projeto havia recebido pareceres favoráveis nas cinco comissões pela qual passou: Assuntos Municipais; Administração Pública; Desenvolvimento Econômico e Turismo; Cidadania, Direitos Humanos e Participação Popular; e Segurança Pública e Defesa Social.
Rodoviários divergem
Presidente da Abirpe, Roberto Carlos Torres, que esteve na reunião com o Pastor Júnior Tércio, agradeceu ao parlamentar pelos esclarecimentos.
"Eu quero agradecer ao deputado por nos receber e ouvir a voz do trabalhador referente a essa situação. Com a gente na rua, existe essa preocupação da categoria, mas com o senhor se comprometendo que vai deixar bem claro que o trabalhador não será responsabilizado nem com a questão da multa, nem existir a obrigatoriedade sem a presença do policiamento. Rodoviário não é policial", pontuou.
Já o Sindicato dos Rodoviários, em publicação no Instagram, criticou a oposição. "Amigos de empresários passaram de vez dos limites. Mudaram de ideia e se aliaram ao deputado autor do PL". A categoria não emitiu posicionamento após a mudança.
O sindicato reclama de possíveis punições aos motoristas diante do "costume" das empresas de "cobrar avarias indevidas". "Sem o veto a essa lei, nada garante que as empresas também repassem a multa ao trabalhador", diz comunicado.
Os grupos estão em campanha da eleição sindical, marcada para 5 de dezembro.