Talibã alerta EUA para não desestabilizar novo regime no Afeganistão
Estados Unidos não comentaram as declarações
O Talibã alertou os Estados Unidos para não desestabilizar o novo regime do Afeganistão, no primeiro encontro presencial entre autoridades talibãs e americanas desde a retirada das tropas de Washington. Realizadas em Doha, as reuniões começaram neste sábado (9) e vão até este domingo (10).
"Dissemos claramente que tentar desestabilizar o governo do Afeganistão não é bom para ninguém", declarou o ministro das Relações Exteriores do Talibã, Amir Khan Muttaqi, à agência estatal afegã Bakhar.
"Um bom relacionamento com o Afeganistão é bom para todos. Nada deve ser feito para enfraquecer o governo atual do Afeganistão, que pode liderar a busca por soluções aos problemas de seu povo", completou, em declarações gravadas e traduzidas pela agência de notícias AFP.
Segundo Muttaqi afirmou à TV Al Jazeera, a delegação do país asiático também pediu aos EUA que suspendessem uma proibição das reservas do banco central afegão, e Washington se comprometeu em doar vacinas contra a Covid-19 a Cabul. O chanceler acrescentou ainda que o foco da delegação talibã no encontro se dirigiu à ajuda humanitária.
Os Estados Unidos não comentaram as declarações do ministro. A delegação americana é chefiada pelo representante especial para a Reconciliação do Afeganistão, Tom West, e por Sarah Charles, principal funcionária humanitária da Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional (Usaid).
A reunião em Doha, no entanto, não significa que os Estados Unidos tenham reconhecido o regime talibã no Afeganistão, insistiu o Departamento de Estado.
"Pressionaremos os talibãs para que respeitem os direitos de todos os afegãos, incluindo mulheres e meninas, e para que formem um governo inclusivo com amplo apoio", declarou nesta sexta-feira (8) o porta-voz do Departamento de Estado ao anunciar a reunião.
A volta dos talibãs ao poder em meados de agosto coincidiu com a caótica retirada das tropas americanas, encerrada em 30 de agosto, após 20 anos de ocupação. Os fundamentalistas islâmicos buscam reconhecimento internacional e ajuda estrangeira para prevenir um desastre humanitário e aliviar a crise econômica do Afeganistão.
Internamente, por sua vez, enfrentam ameaças do Estado Islâmico, que reivindicou mais um ataque realizado nesta sexta a uma mesquita xiita em Kunduz, no norte do Afeganistão. Ao menos 60 morreram, no mais devastador atentado desde a saída dos militares americanos.
Neste sábado, a cidade se preparava para enterrar as vítimas, com 62 cavadas, segundo relatou um coveiro à agência de notícias AFP. O saldo final, no entanto, pode se aproximar de uma centena de mortos.
De acordo com o EI, o homem-bomba era conhecido como "Mohamed, o uigur" –o que implica que fazia parte da minoria muçulmana chinesa, alguns de cujos membros se juntaram ao grupo terrorista.
O Talibã prometeu proteger todas as comunidades do país, mas para Michael Kugelman, especialista em Sudeste Asiático do gabinete Woodrow Wilson International Center for Scholars, será difícil para o grupo consolidar seu poder se não abordar a questão do terrorismo e da crescente crise econômica no país.
"Se o Talibã, como é provável, não for capaz de lidar com essas preocupações, terá dificuldade em obter legitimidade interna e poderemos testemunhar o surgimento de uma nova resistência armada."