Tanques russos às portas de Kiev, União Europeia prevê milhões de refugiados
Seguem negociações para um cessar-fogo entre os dois países
Os tanques russos chegaram às portas de Kiev nesta quinta-feira (10), seguindo a estratégia de Moscou de cercar as grandes cidades da Ucrânia, provocando um êxodo em massa para países da União Europeia (UE), que se prepara para receber "milhões" de refugiados.
As operações militares continuaram paralelamente às primeiras negociações de alto nível entre a Rússia e a Ucrânia, nas quais o objetivo de um cessar-fogo no conflito que o presidente Vladimir Putin iniciou em 24 de fevereiro não foi alcançado.
Os Estados Unidos e seus aliados da UE disseram que estão considerando novas sanções contra a Rússia devido a sinais de uma "escalada" nos ataques a civis.
No solo, uma equipe da AFP viu colunas de fumaça na cidade de Skybyn, a algumas centenas de metros do último posto de controle no extremo nordeste de Kiev.
Os tanques russos já haviam chegado aos subúrbios do norte e do oeste.
A cinco quilômetros da capital, a cidade de Velyka Dymerka foi alvo de foguetes russos Grad.
Segundo o Estado-Maior ucraniano, as forças russas continuam avançando para cercar Kiev sem descuidar de outras frentes, como as cidades de Izium, Petrovske, Sumy, Ojtyrka e a região de Donestsk.
"Corredores humanitários" para a Rússia
A reunião entre os ministros das Relações Exteriores da Rússia e da Ucrânia, Sergei Lavrov e Dmytro Kuleba, na cidade turca de Antalya, não registrou nenhum resultado tangível para a cessação das hostilidades.
Kuleba indicou, no entanto, que ambos os chanceleres decidiram "continuar seus esforços", embora "a Ucrânia não desistiu, não desiste e não desistirá", acrescentou.
Lavrov disse que seu país está disposto a continuar as conversas no mesmo formato das três primeiras reuniões entre autoridades em Belarus e que uma reunião entre Putin e o presidente ucraniano, Volodimir Zelensky, foi descartada por enquanto.
Diante da impossibilidade de chegar a um acordo de cessar-fogo, o ministro russo afirmou que Moscou queria "falar sobre corredores humanitários" para evacuar civis das cidades sitiadas.
À noite, o governo russo anunciou que, mesmo sem acordos, seu exército abriria "corredores humanitários" dessas cidades para a Rússia.
Na Turquia, Lavrov reiterou que a Rússia "não atacou a Ucrânia", mas respondeu a "ameaças diretas contra (sua) segurança", e insistiu na desmilitarização e neutralidade da ex-república soviética.
O ministro também descreveu como "perigosa" a entrega de armas de países ocidentais a Kiev.
- 80.000 evacuados em dois dias -
A Rússia mantém o cerco de grandes cidades ucranianas, o que obriga milhares de civis a passaram dias se protegendo de bombardeios em porões e abrigos improvisados. Em alguns lugares, a situação humanitária é crítica, segundo testemunhas.
De acordo com um representante do Comitê Internacional da Cruz Vermelha (CICV), Sasha Volkov, os habitantes de Mariupol, um porto estratégico no Mar de Azov, "começaram a brigar por comida".
"Todas as lojas e farmácias foram saqueadas há quatro ou cinco dias", acrescentou Volkov, que está na cidade, em uma gravação de áudio enviada à imprensa.
O clamor de indignação aumentou após o bombardeio na quarta-feira de um hospital pediátrico daquela cidade, que deixou pelo menos três mortos, incluindo uma criança, segundo o prefeito.
O presidente francês, Emmanuel Macron, descreveu o atentado como um "ato indigno de guerra", ao chegar a uma cúpula da União Europeia no Palácio de Versalhes (oeste de Paris) dedicada aos impactos do conflito russo-ucraniano.
A Rússia negou que suas aeronaves tenham realizado missões de ataque na área de Mariupol e afirmou que "o suposto bombardeio aéreo é uma provocação completa encenada para manter a agitação contra a Rússia entre uma audiência ocidental".
Em Kiev, metade da população fugiu desde o início da invasão, relatou o prefeito Vitali Klitschko.
E mais de 80.000 pessoas foram evacuadas em dois dias da cidade sitiada de Sumy e nos arredores de Kiev, segundo o governo ucraniano.
Em duas semanas, a UE recebeu mais de 2 milhões de refugiados ucranianos, um número apenas comparável ao afluxo de requerentes de asilo, principalmente sírios, entre 2015 e 2016.
A comissária europeia para o Interior, Ylva Johansson, acredita que o fluxo não parou.
"Vamos ver cada vez mais pessoas fugindo da Ucrânia (...) Não sabemos exatamente quantos, mas eu diria milhões", estimou a comissária sueca, que considera a situação "um desafio muito grande" para os 27 membros da UE.
- Sanções, mas sem 'via rápida' para a UE -
A cúpula europeia de Versalhes não deve dar seguimento ao pedido ucraniano de adesão à UE por procedimento expresso.
"Não há uma via rápida para a entrada na UE. Isso não existe", afirmou o primeiro-ministro holandês, Mark Rutte.
Desde o início da invasão, os Estados Unidos e seus parceiros da Otan apoiaram Kiev, mas evitaram se envolver diretamente no conflito.
No entanto, a Câmara dos Representantes dos Estados Unidos adotou um novo orçamento federal que inclui uma alocação de quase 14 bilhões de dólares para ajuda à Ucrânia, na forma de assistência humanitária, armas e munições.
O Ministério da Defesa russo acusou os Estados Unidos de financiar um programa de armas biológicas na Ucrânia e disse ter encontrado evidências disso em laboratórios ucranianos.
Na Rússia, as sanções ocidentais estão começando a pesar sobre a população. As últimas empresas estrangeiras a sair foram as gigantes japonesas de videogames Sony e Nintendo.
Putin alertou que as sanções podem causar um aumento na inflação global devido ao aumento dos preços dos alimentos, já que a Rússia não poderá exportar fertilizantes suficientes. Por enquanto, segundo o mandatário, a Rússia manterá todas as suas entregas de hidrocarbonetos apesar do conflito.
Membros das potências industrializadas do G7 pediram aos países produtores de petróleo e gás que "aumentem suas entregas" para lidar com o aumento dos preços da energia e os riscos de escassez decorrentes da invasão da Ucrânia.