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RIO DE JANEIRO

Transplantes infectados: funcionária que assinou laudo negativo para HIV diz que função era corrigir

Jacqueline Iris Bacellar de Assis contou, em entrevista ao Globo, que nunca teve registro como biomédica e que seu nome foi usado indevidamente

Transplantes infectados: funcionária que assinou laudo negativo para HIV diz que função era corrigirTransplantes infectados: funcionária que assinou laudo negativo para HIV diz que função era corrigir - Foto: TV Globo/reprodução

A funcionária Jacqueline Iris Bacellar de Assis, cuja assinatura aparece em um dos laudos que atestaram que os doadores de órgãos não tinham HIV, reconhece que as rubricas nos documentos são suas, mas nega qualquer envolvimento no caso. Ela disse em entrevista ao Globo que sequer é biomédica.

O número de registro no Conselho Regional de Biomedicina (CRBM) que consta no documento como sendo dela é de outra pessoa que mora fora do Rio e não exerce mais a profissão, como mostrou a TV Globo. Já o laboratório PCS Lab Saleme afirma que Jacqueline se apresentou como biomédica e encaminhou uma troca de mensagens de agosto, na qual a funcionária apresenta um certificado de que seria biomédica. Entretanto, os laudos com a assinatura dela são de maio.

Jacqueline disse ao Globo que nunca teve registro como biomédica e que o nome dela foi usado pelo laboratório. Ela contou que foi contratada, em outubro de 2023, como supervisora administrativa com salário mensal de R$ 1.600 e só teve a carteira assinada em setembro deste ano. Ela negou qualquer envolvimento com o caso e explicou que as assinaturas eletrônicas foram coletadas pela empresa assim que assumiu o cargo técnico e que esse era um procedimento padrão para todos os funcionários.

Ela afirmou ainda que sua formação, de 2008, é de técnica de análises laboratoriais, o que não permitiria um registro de nível superior. Após o caso ganhar repercussão, Jacqueline relatou que começou a receber ameaças.

— Eles enviaram laudos em meu nome. Todo esse período o serviço que prestei para eles foi de supervisor administrativo. A gente fazia preenchimento de planilhas, pedido de insumos, conferência de estoque. A conferência de laudo que a gente fazia era administrativa: se estava digitado correto, a pontuação correta para poder enviar para os médicos. Nessa tela não aparecia nenhuma assinatura minha. Se tivesse, eu chamaria a atenção. Minha vida está de cabeça para baixo nesse momento. Nunca tive registro na área da medicina. Meu nome foi usado de forma indevida. Estou sendo massacrada, recebendo mensagens de ameaças no meu WhatsApp. Acredito que depois disso tudo meu nome possa aparecer em outros contextos e documentos. Nossa assinatura estava na base de dados deles e podia ser usada como quisessem. Mas tenho provas de que nada disso passava por mim lá dentro — defendeu-se Jacqueline.

O laboratório informou que os resultados preliminares da sindicância interna apontam indícios de erro humano na transcrição dos resultados de dois testes de HIV, o que levou à infecção de seis pessoas. Em relação a Jacqueline, diz que ela informou que possuía diploma de biomédica e carteira profissional com habilitação em patologia clínica. A empresa ainda afirma que ela assinou diversos laudos de exames nos últimos meses. Apesar disso, o laboratório ainda não informou o motivo pelo qual não fez a consulta no sistema do conselho responsável pela emissão dos registros dos biomédicos.

Função administrativa
O advogado José de Arimatéia Félix, que assumiu a defesa de Jacqueline no sábado, afirma que sua cliente foi contratada para funções administrativas, com a promessa de que assumiria uma vaga técnica no laboratório. Segundo ele, a assinatura presente nos documentos investigados foi inserida sem o conhecimento e consentimento de Jacqueline, que também seria vítima da situação. Ele ainda não teve acesso ao boletim de ocorrência, o que deve ocorrer somente hoje.

— Ela já atuou como técnica de laboratório em outras ocasiões, mas nesta empresa nunca desempenhou essa função. Apenas tinha acesso aos dados dos pacientes e encaminhava os exames para a assinatura final dos médicos responsáveis. Recebeu a promessa de que, assim que surgisse uma vaga nesse setor, seria dela, mas isso nunca aconteceu — afirmou o advogado.

Jacqueline também negou qualquer ligação com o deputado federal Doutor Luizinho, que teria influência na área da saúde da rede estadual. Mãe de duas filhas pequenas, ela diz estar muito abalada com a repercussão do caso e tem medo de sair de casa.

A Secretaria de Estado de Saúde informou que uma sindicância foi instaurada para identificar e punir os responsáveis. “Detalhes deste processo seguem em sigilo porque é necessário resguardar os pacientes, bem como o encaminhamento da sindicância”, diz a nota.

Demissão
Jacqueline que também trabalhou na Fundação Saúde, em 2014 recorreu contra a decisão que manteve sua dispensa por justa causa. Na ação, argumentou que a demissão foi injusta, pois estava grávida e, portanto, em período de estabilidade. O caso envolveu ainda um pedido de indenização por dano moral, devido a dispensa nessa condição. Jacqueline havia ingressado na instituição por concurso público para atuar como técnica de laboratório.

— Precisei me ausentar e não consegui entregar o atestado dentro do prazo estipulado, mas consegui provar, por meio de documentos, a minha situação. Eu ganhei a causa, mas, apesar disso, não senti mais clima para continuar e decidi sair da Fundação— explicou Jacqueline Assis.

A decisão foi revertida parcialmente, afastando a justa causa. Jacqueline recebeu indenização por alguns pleitos que tinha feito à justiça trabalhista.

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