'Tratamento de silêncio': o tipo de abuso psicológico que pode levar a problemas de saúde
Ele pode ser usado como uma ferramenta de defesa ou como um tipo de abuso emocional
O “tratamento de silêncio” é uma forma de condenação social e uma ferramenta psicológica para infligir dor que muitas pessoas usam com seus entes queridos em momentos de conflito de relacionamento. Esse tipo de tratamento envolve a recusa de comunicação com alguém que esteja disposto a abordar ou lidar com um problema.
O Dicionário da Universidade de Cambridge define como: o ato de não falar com alguém, ou falar muito pouco com essa pessoa, porque você está bravo ou chateado com algo que ela fez. E citam como exemplo o seguinte: “Um casal que estava com alguns problemas e optou pelo tratamento do silêncio.”
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Além disso, em uma realidade em que há tantas maneiras de se comunicar, a conversa cara a cara não é a única situação em que o tratamento do silêncio pode ser implementado. Esse tipo de comportamento pode ser realizado por meio de mensagens de texto, videochamadas, mensagens diretas em redes sociais, e-mails e/ou qualquer tipo de contato telefônico.
Por que alguém teria esse comportamento?
Em um artigo de opinião para a Psychology Today, Bernard Golden, psicólogo e fundador da Anger Management Education em Chicago e autor de vários livros sobre gerenciamento de emoções, escreve que os motivos mais comuns pelos quais as pessoas usam o tratamento do silêncio são:
Falta de autoconsciência: as pessoas podem se sentir confusas ou sobrecarregadas por seus sentimentos e só querem mostrar que estão chateadas.
Evitar conflitos: Uma pessoa pode não se sentir segura o suficiente para expressar o que sente, talvez por medo de seus próprios sentimentos, pensamentos ou comportamentos, ou daqueles da pessoa com quem está vivenciando o conflito.
Falta de habilidades de comunicação: Algumas pessoas sentem que não têm habilidades para se expressar.
Punição: Torna-se abuso quando tem a intenção de punir, controlar ou ganhar poder sobre alguém.
Para fazer a outra pessoa se sentir mal.
Para não parecer abusivo aos outros.
Para evitar assumir responsabilidades.
Uma forma de abuso psicológico ou uma ferramenta de defesa?
Há momentos em que é útil permanecer em silêncio, seja para evitar uma discussão ou a escalada de um conflito; Também é frequentemente usado em situações triviais, como quando um vizinho reconhece que alguém está muito agitado e que iniciar uma conversa seria inútil. Outros usam o silêncio como um meio de autorreflexão: para identificar melhor seus sentimentos ou pensamentos sobre uma determinada situação.
— Seja usado para qualquer um desses propósitos ou para prevenir abusos de uma pessoa narcisista, é uma ferramenta fundamental para começar a fortalecer o eu de alguém que foi ferido por um relacionamento tóxico — diz Ailen Lescano, psicóloga especializada em traumas.
Paralelamente, a especialista explica que é um comportamento nocivo/tóxico quando usado para fins manipulativos.
— Em geral, é um comportamento aprendido e intencional e provavelmente vem de uma pessoa com traços psicopáticos e/ou narcisistas. Quem o faz sabe o dano emocional que essa distância causa na outra pessoa e ainda assim decide continuar o comportamento — aponta Lescano.
E ela ressalta que esse tipo de comportamento está ligado ao gaslighting, uma forma de manipulação que faz a pessoa questionar a própria realidade.
— Essas pessoas se acostumam a alternar entre distanciar a pessoa e abordá-la de forma manipuladora; duas formas distintas de abuso psicológico — acrescenta ela.
Um estudo publicado na revista Frontiers in Evolutionary Neuroscience mostra que o tratamento silencioso estimula o córtex cingulado, a parte do cérebro responsável por fazer inferências sobre o comportamento, que é a mesma área do cérebro que registra a dor.
Isso confirma que as vítimas desse abuso não só sentem dor emocional, mas também um certo nível de dor física. Os pesquisadores responsáveis ressaltam no documento que a sujeição repetida a esse tratamento silencioso pode levar a efeitos colaterais prejudiciais à saúde. Entre os participantes observados, os sintomas mais frequentes foram: alterações de peso, aumento da pressão arterial e distúrbios do sono.
Além disso, Lescano acrescenta que a pessoa que sofre disso não é apenas uma vítima do comportamento, mas também um sujeito com personalidade narcisista ou psicopática.
— As consequências emocionais são frequentemente severas. No entanto, elas dependem do tipo de vínculo, sua duração e dos mecanismos de defesa do agressor. Uma relação mãe-filho não é a mesma que uma relação empregador-empregado, romântica ou de amizade — enfatiza.
Entre os sintomas emocionais mais recorrentes, a psicóloga destaca:
Perda de identidade;
Perda de prazer;
Alterações de humor e aparecimento de ansiedade e depressão;
Perda de laços significativos/positivos; e
Perda de julgamento ou julgamento da realidade.
Segundo Lescano, na maioria dos casos de pessoas que procuram terapia por esse motivo, fica claro que seu "eu" está completamente devastado.
— Há um longo caminho a percorrer para curar o abuso sustentado e a difamação da identidade. Recuperar a autoestima é o objetivo principal, ajudando-nos a nos libertar desse vínculo tóxico e a detectar uma potencial agressão dessa natureza no início do futuro — explica ela.
Por fim, ela ressalta que é possível curar esses tipos de enfermidades e que é possível escapar de relacionamentos tóxicos ou abusivos, mesmo que durem anos.
— É fundamental procurar um profissional especializado no assunto. Por isso, se você é ou conhece alguém que é vítima de abuso psicológico, procure ajuda — conclui.