Trump, o "inominável" da cúpula do G20 no Rio de Janeiro
O magnata republicano prometeu impor tarifas generalizadas às importações dos Estados Unidos
Para os líderes mundiais e diplomatas reunidos na cúpula do G20 no Rio de Janeiro, o presidente eleito dos Estados Unidos, Donald Trump, foi o homem que não deveria ser nomeado.
Quase ninguém mencionou diretamente o próximo ocupante da Casa Branca, embora sua iminente volta ao poder pairasse sobre o encontro.
Em vez disso, os líderes falavam em termos codificados sobre a "próxima administração", "turbulências", "negacionistas" ou "mudança".
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Mas parecia claro o que queriam dizer, mesmo quando tentavam evitar atritos com quem assumirá o Salão Oval a partir de 20 de janeiro.
O presidente francês, Emmanuel Macron, que se esforçou muito para agradar Trump durante o primeiro mandato do republicano (2017-2021), fez comentários velados na cúpula sobre tarifas e clima.
"Qualquer fragmentação ou ruptura da ordem internacional por políticas tarifárias promovidas pelos mais fortes simplesmente leva todos os outros a não respeitá-la", disse Macron, sem mencionar Trump diretamente.
O magnata republicano prometeu impor tarifas generalizadas às importações dos Estados Unidos, incluindo produtos provenientes da Europa, e de até 60% aos vindos da China.
Macron também criticou as políticas climáticas "frágeis", já que o republicano ameaça retirar os Estados Unidos dos Acordos de Paris, cujo objetivo é reduzir o aquecimento global.
Esquivar
O mesmo aconteceu quando outros líderes falaram, parecendo tratar Trump como o vilão Voldemort da saga de filmes e livros do mago Harry Potter, cujo nome os heróis evitam pronunciar.
O secretário-geral da ONU, António Guterres, evitou qualquer menção direta a Trump ao falar sobre o "papel muito importante" dos Estados Unidos no clima e sua "profunda confiança" de que o gigante norte-americano "avançará na direção da ação climática".
Os únicos lugares onde era possível ver o rosto do bilionário eram os cartazes segurados por manifestantes do lado de fora da sede da cúpula e nas redes sociais do presidente argentino, Javier Milei.
Ultraliberal e aliado de Trump, o argentino publicou uma imagem que contrastava uma foto sua sorridente com o republicano em Mar-a-Lago, na Flórida, após as eleições, com outra ao lado do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, com expressão séria.
Isso evidenciou as divergências entre Milei, que implementou uma austeridade radical em seu país para conter a inflação, e Lula, que lançou uma aliança global contra a fome durante a cúpula e mantém boas relações com Biden.
"Na luta pela sobrevivência, não há espaço para o negacionismo", disse o petista, sem mencionar o republicano.
Nos bastidores, os funcionários também foram cautelosos. Um diplomata europeu afirmou que o continente "já havia trabalhado com ele [Trump] antes" e que precisará fazê-lo novamente.
"Decisões"
Funcionários americanos insistiram repetidamente que o nome de Trump não surgiu nas últimas reuniões do presidente em fim de mandato, Joe Biden, com os colegas, nem foi uma consideração importante.
Os demais países "decidirão em janeiro, por si próprios, com base em seus interesses", como devem ser suas relações com a nova administração, disse à imprensa o assessor adjunto de Segurança Nacional, Jon Finer.
Talvez isso se deva, em parte, à deferência para com Biden, que provavelmente fez sua última grande aparição na cena internacional.
O próprio presidente democrata evitou a questão; de fato, há tempos ele reluta em mencionar o nome do homem que costuma chamar de "meu predecessor", e que agora será seu sucessor.
Aos 81 anos, Biden tentou reforçar seu legado enquanto seus pares olhavam para o futuro.
Ao apontar que esta seria sua última cúpula, pediu aos líderes que "continuem avançando, e estou confiante de que o farão, independentemente de eu incentivá-los ou não".
No último dia, parecia ciente de que o retorno de "Aquele-Que-Não-Deve-Ser-Nomeado" estava próximo. "Tenho muito mais a dizer", afirmou Biden, antes de parar e acrescentar: "Mas não o farei".