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EUA

Trump participa de Marcha pela Vida após perdoar 23 ativistas antiaborto

Aliados avaliam ser improvável que ele tente impedir esforços de conservadores para implementar novas restrições ao aborto

Donald TrumpDonald Trump - Foto: Roberto Schimidt/AFP

Ativistas contrários ao aborto nos Estados Unidos têm visto, nos últimos meses, a consolidação do movimento: encorajados por aliados poderosos em Washington, uma maioria na Suprema Corte e por oportunidades legislativas em estados conservadores, eles parecem avançar com a missão de buscar o fim do direito ao aborto em âmbito nacional.

Na Marcha pela Vida desta sexta-feira, é esperado que os três homens mais poderosos do país façam declarações: o presidente, Donald Trump, por meio de videochamada; e o vice-presidente, JD Vance, e o presidente da Câmara, Mike Johnson, pessoalmente.

O comício, que os organizadores esperam que reunirá pelo menos 150 mil pessoas, ocorre apenas um dia depois de o republicano assinar um decreto concedendo perdão a 23 ativistas antiaborto.

Embora Trump não tenha especificado os nomes das pessoas que receberam os indultos, a ordem executiva que ele exibiu diante das câmeras incluía os nomes de dez ativistas que foram processados durante o governo de seu antecessor, o democrata Joe Biden, por suas participações no bloqueio de uma clínica de aborto na capital americana, Washington, em 2020.

Os réus nesse caso foram acusados de dois crimes federais: conspiração contra os direitos civis e violação do FACE Act, lei de 1994 que torna crime ameaçar, obstruir ou ferir uma pessoa que busca acesso a uma clínica de saúde reprodutiva.

O regulamento foi raramente utilizado durante o primeiro mandato de Trump (2017-2021), mas, em resposta à uma lei restritiva ao aborto pelo estado do Texas em 2021, Merrick Garland, o procurador-geral do governo Biden, disse que a Justiça priorizaria sua aplicação para proteger o direito ao aborto.

Lauren Handy, uma das ativistas antiaborto, foi condenada a quase cinco anos de prisão no ano passado por seu papel como líder do bloqueio de 2020. Seu caso ganhou grande atenção logo após ela ser acusada, em março de 2022, quando a polícia afirmou ter encontrado cinco fetos em sua casa.

Outros réus receberam penas inferiores a três anos de detenção. Um deles, Jay Smith, de 34 anos, declarou-se culpado e foi condenado a dez meses.

Mais tarde naquele ano, a Suprema Corte revogou o direito constitucional ao aborto. Três juízes nomeados por Trump tiveram papel decisivo na medida, e o republicano reivindicou o mérito pelo feito.

— Eles não deveriam ter sido processados. É uma grande honra assinar [o decreto] — disse o líder republicano na quinta-feira, quando concedeu o perdão presidencial aos 23 ativistas.

Sinais de Trump sobre o aborto
Escondida no decreto de Trump que afirmava que o governo americano passaria a reconhecer apenas dois gêneros — masculino e feminino — havia uma frase que chamou a atenção de ativistas que esperam poder conceder direitos constitucionais a embriões.

De acordo com a ordem executiva assinada pelo presidente, as pessoas eram classificadas como homens ou mulheres “na concepção”. Para ativistas, as medidas enviam um sinal após uma campanha presidencial durante a qual Trump enviou sinais mistos sobre quais seriam suas medidas nesse tema.

Ainda assim, não está claro se as decisões mais recentes indicam uma abordagem mais agressiva da segunda gestão do republicano. Poucos acreditam que o aborto seja uma prioridade para Trump no mesmo nível que imigração ou o comércio, por exemplo, e até onde ele avançará para limitar o aborto em âmbito nacional — ou se tomará qualquer medida — permanece incerto.
 

Donald TrumpFoto: Roberto Schimidt/AFP

Ao mesmo tempo, é improvável, segundo avaliação de aliados e ativistas, que ele tente impedir os esforços de estados conservadores para implementar novas restrições.

Quando questionado sobre o aborto durante a campanha, Trump disse que o governo federal “não deveria ter nada a ver com essa questão”. Mas, em eventos diante de organizações cristãs, ele prometeu apoio firme, comprometendo-se a estar “lado a lado” com elas.

Ao mesmo tempo, muitos ativistas contrários ao aborto ficaram decepcionados quando ele nomeou Robert Kennedy Jr., que apoiou os direitos ao aborto, para liderar o Departamento de Saúde e Serviços Humanos — uma agência-chave onde esperavam avançar com sua causa.

— As respostas que temos recebido repetidamente indicam que a posição de Kennedy será a mesma posição de Trump — disse Marjorie Dannenfelser, presidente da Susan B. Anthony Pro-Life America, organização que busca reduzir o aborto no país. — O que estamos ansiosos para saber é exatamente o que isso significa.

O papel dos ativistas
Ativistas que apoiam o direito ao aborto alertam para a possibilidade de ações muito mais abrangentes no governo Trump. Eles acreditam que a administração atual processará quem facilita o aborto e fará valer a Lei Comstock, conhecida legislação de 1873 contra a “obscenidade” que definia contraceptivos como ilícitos, para criminalizar o envio de qualquer material usado num aborto — incluindo pílulas abortivas, que representam a maioria dos abortos nos Estados Unidos.

Enquanto isso, ativistas contrários ao aborto estão propondo uma enxurrada de legislações nos estados, incluindo maneiras de enfraquecer proteções ao aborto aprovadas pelos eleitores e aumentar as penalidades para mulheres e instituições que facilitam o aborto em estados onde o procedimento é proibido. Essas iniciativas têm o objetivo de restringir o acesso e gerar novas disputas nos tribunais, onde veem vantagem.

Legisladores conservadores em estados como Carolina do Sul e Oklahoma, por exemplo, estão tentando avançar com projetos de lei que permitiriam que mulheres que realizam abortos fossem processadas por homicídio.

Em Ohio, onde os eleitores incluíram os direitos ao aborto na Constituição Estadual em 2023, o procurador-geral republicano, Dave Yost, está argumentando nos tribunais que restrições de longa data ao aborto — incluindo um período de espera de 24 horas antes do procedimento — ainda são legais no estado.

Alguns ativistas estão olhando para o Texas, onde quase todos os direitos ao aborto agora estão proibidos, como modelo para os próximos passos. John Seago, presidente da organização sem fins lucrativos Texas Right to Life, afirmou que impedir o fluxo de medicamentos para aborto é uma prioridade.

E os republicanos apresentaram uma série de projetos de lei visando restringir o acesso a essas pílulas, incluindo a classificação de remédios para o aborto como substâncias controladas perigosas e sua comercialização online como uma prática comercial enganosa.

— O governo federal pode definitivamente ajudar em muitas dessas questões, se estiver disposto —, disse Seago.

Na Marcha pela Vida desta sexta-feira, pelo menos, o governo Trump será destaque. Jennie Bradley Lichter, a nova presidente da passeata, foi vice-diretora do Conselho de Política Doméstica durante o primeiro mandato de Trump. Ela apontou para os palestrantes de alto nível como um sinal otimista, indicando que, ao olhar para o histórico do presidente, antecipa que o movimento verá “algumas grandes vitórias”.

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