Trump promete taxas de juros mais baixas, mas presidente dos EUA não controla isso; entenda
Em encontro com jornalistas em Chicago, ao ser perguntado sobre o que faria em seu primeiro dia na Casa Branca, o candidato disse que baixaria tudo: energia, juros e inflação
O ex-presidente Donald Trump, candidato republicano à presidência dos Estados Unidos em 2024, prometeu taxas de juros mais baixas — o que um presidente não controla de fato — caso seja eleito.
Perguntado na quarta-feira sobre o que faria no primeiro dia de um novo mandato durante um painel na convenção da Associação Nacional de Jornalistas Negros, em Chicago, Trump disse que uma das prioridades seria “drill, baby, dril ("vou fundo, baby, vou fundo", em tradução livre para o português), o slogan abreviado que adotou para promover a produção de petróleo e gás nos Estados Unidos.
"Faço baixar a energia; faço baixar as taxas de juro; faço baixar a inflação ", acrescentou Trump.
Nos Estados Unidos, o presidente não exerce controle direto sobre as taxas de juros. O Federal Reserve, o banco central americano, é que estabelece uma taxa chave, que depois influencia os custos de empréstimos em toda a economia.
Leia também
• Campanha de Kamala Harris arrecadou o dobro de fundos que Donald Trump em julho
• Campanha de Trump enfrenta momento delicado após falas do candidato sobre Harris
• Trump acusa Kamala Harris de 'tornar-se negra' para eleições nos EUA
E mais: o Fed é independente da Casa Branca.
Trump, algumas vezes, sugeriu que o Fed reduziria as taxas porque a inflação provavelmente seria menor durante seu mandato, o que pode ter sido o que ele quis dizer na quarta-feira. Economistas, no entanto, sugeriram que algumas de suas políticas propostas podem, na verdade, acelerar a inflação.
Meses tensos para o Fed antes das eleições
Ainda assim, os comentários de Trump ressaltam o quanto os aumentos de preços e as altas taxas de juros continuam sendo questões politicamente relevantes à medida que a eleição de 5 de novembro se aproxima, mesmo após anos em que a inflação tem diminuído gradualmente.
E deixam claro que os próximos meses provavelmente serão politicamente tensos para o Fed, enquanto a instituição tenta manter-se fora da disputa política.
Como Trump aprendeu durante seu mandato, os funcionários do Fed demonstraram relutância em reduzir as taxas apenas porque um presidente deseja que elas baixem. Ele criticou o presidente do Fed e seus colegas no Twitter (hoje batizada de X) e em fóruns públicos em 2018 e 2019, mas o BC americano não cortou os custos de empréstimos tanto ou tão rapidamente quanto ele queria.
Na verdade, analistas do J.P. Morgan afirmam, em pesquisa divulgada nesta quinta-feira, que a política do Fed não muda de forma notável em relação ao seu padrão normal nos meses que antecedem uma eleição, com base em dados históricos.
Contas Públicas: Bloqueio ‘preventivo’ de despesas públicas chega a R$ 47 bi. É suficiente? Especialistas respondem
“Vemos pouca evidência de que a política influencia o Fed,” escreveram os pesquisadores do J.P. Morgan.
BC independente
Os funcionários do Fed valorizam sua independência em parte porque acreditam que, para terem sucesso em seus objetivos duplos — promover o pleno emprego e manter a inflação baixa — investidores e famílias precisam acreditar que eles estão definindo a política monetária tendo apenas a economia em mente.
Se os bancos centrais cortassem as taxas para ajudar um político, as pessoas passariam a acreditar que eles não estariam dispostos a fazer o que fosse necessário para controlar a inflação. E se passassem a esperar mais inflação, muitos economistas acreditam que as pessoas mudariam seu comportamento de maneira que acelerariam a alta da inflação.
Trabalhadores pediriam aumentos salariais maiores para cobrir seus custos. Restaurantes e supermercados poderiam implementar aumentos de preços mais regulares para também cobrir seus custos antecipados. Globalmente, pesquisas mostram que bancos centrais independentes são mais bem-sucedidos em controlar as expectativas de preços e a inflação.
As taxas de juros parecem, de fato, propensas a cair nos próximos meses e anos, mas por razões econômicas, e não políticas.
Fed sinaliza 'corte' nos juros
Após dois anos de o Fed subir aas taxas de juros e, em seguida, mantê-las altas para combater a inflação, o presidente da instituição, Jerome Powell, sinalizou na última quarta-feira que um corte poderia 'estar na mesa' na próxima reunião, que acontece em setembro.
Na quarta-feira, o Federal Reserve decidiu manter a taxa básica de juros nos EUA entre 5,25% e 5,5% ao ano. Foi a oitava vez seguida que a autoridade monetária americana decidiu pela manutenção dos juros, que está no maior patamar em duas décadas desde julho de 2023.
Mas os funcionários da autoridade monetária foram categóricos ao afirmar que a mudança está ocorrendo porque a inflação diminuiu substancialmente, e não porque estão cedendo à pressão de qualquer partido.
"Qualquer coisa que fizermos antes, durante ou depois da eleição será baseada nos dados e nas perspectivas. Não queremos estar envolvidos em política de nenhuma maneira", afirmou o Powell.
Ao mesmo tempo que defende taxas de juros mais baixas, Trump afirmou que o Fed não deveria reduzi-las antes da eleição, sugerindo que isso seria um presente político para os democratas.
No entanto, os formuladores de políticas estão se preparando para agir em breve porque a inflação está caindo de forma notável. Após atingir 9,1% em junho de 2022, a inflação medida pelo índice de preços ao consumidor caiu para cerca de 3%. Nos anos que antecederam a pandemia de Covid 19, em 2020, a taxa girava em torno de 2%.
Muitos economistas sugeriram que as políticas de Trump, que incluem planos para aumentar drasticamente as tarifas e deportar imigrantes, poderiam elevar os preços ao aumentar os custos de importação e causar escassez de mão de obra em indústrias-chave. Mas Trump repetidamente sugere que suas políticas de petróleo e gás reduzirão a inflação.
"Temos que reduzir o custo da energia, e isso vai reduzir o custo da inflação, tudo isso começou com uma má política energética de Joe Biden ", disse Trump.
Esse diagnóstico não está correto. A inflação disparou a partir de 2021 por uma série de razões: entre elas, os custos de carros usados e os preços de uma série de outros bens aumentaram.
Esse aumento se deve em grande parte aos problemas na cadeia de suprimentos global. Fechamentos de fábricas significaram que os semicondutores estavam em falta, tornando difícil a construção de novos veículos.
Além disso, as pessoas estavam comprando muitos bens à medida que os cheques de estímulo do governo chegavam às suas contas bancárias, e não havia navios de carga suficientes para transportá-los. Portos-chave ficaram congestionados, e a escassez atingiu as prateleiras dos supermercados.
A inflação aumentou especialmente rápido nos Estados Unidos, mas países ao redor do mundo logo enfrentaram o problema. A situação foi agravada em 2022 quando a invasão da Rússia à Ucrânia elevou os custos dos combustíveis e os preços dos alimentos.
Os preços dos combustíveis caíram significativamente desde seu pico naquele ano, embora ainda estejam mais altos do que nos anos que antecederam a pandemia.
Economistas e funcionários do Fed acreditam que os aumentos de preços continuarão a desacelerar. Se isso se concretizar, será uma boa notícia para os americanos: independentemente de quem vencer em novembro, há esperança de que tanto a inflação quanto os custos de empréstimos estejam mais baixos em breve.