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ESTADOS UNIDOS

Trump, um parceiro "imprevisível" e amigo das "ameaças"

O retorno do ex-presidente republicano, quatro anos após uma saída caótica sem reconhecer sua derrota nas urnas, levanta muitas questões

Alguns especialistas acreditam que o  risco de Trump polarizar a política interna de vários países é realAlguns especialistas acreditam que o risco de Trump polarizar a política interna de vários países é real - Foto: Jam Sta Rosa/ AFP

A América Latina pode esquecer as gentilezas quando Donald Trump voltar à Casa Branca em janeiro, opinam os especialistas, que temem uma diplomacia das "ameaças" com consequências imprevisíveis.

O retorno do ex-presidente republicano, quatro anos após uma saída caótica sem reconhecer sua derrota nas urnas, levanta muitas questões.

Como ele governará? Cumprirá a promessa de deportação em massa de imigrantes? Irá impor tarifas de dois dígitos?

"Será simplesmente uma diplomacia sem valores, baseada em motivos transacionais e em seu projeto político", resumiu Christopher Sabatini, pesquisador para a América Latina na Chatham House.

Existe a possibilidade de que ele ignore os direitos humanos em países como El Salvador e México para alcançar seus objetivos em "imigração e na melhoria das relações econômicas", acrescenta.

Em sua opinião, o risco de Trump polarizar a política interna de vários países é real. Isso já foi visto com seu apoio ao ex-presidente Jair Bolsonaro no Brasil e aos presidentes Javier Milei na Argentina e Nayib Bukele em El Salvador.

- China e México -
Como região, a América Latina deixou de ser uma prioridade para os Estados Unidos, e é "pouco provável" que isso mude com Trump, antecipa Michael Shifter, professor da Universidade de Georgetown em Washington.

No entanto, ele prestará atenção ao papel da China, sua grande rival, e ao México, principal parceiro comercial e ator-chave no controle dos fluxos migratórios.

"Se ele repetir os erros de sua primeira administração, ameaçando e punindo governos latino-americanos por sua proximidade com a China, isso será contraproducente", adverte Shifter.

E "se ele implementar sua promessa de realizar a deportação em massa mais significativa da história dos Estados Unidos, haverá uma forte reação na América Latina" e "as tensões interamericanas aumentarão consideravelmente".

Trump tem o México na mira. Ele deixou isso claro até mesmo em seu último comício de campanha. Por duas razões: primeiro, porque, segundo o republicano, a China constrói fábricas no país sul-americano para vender produtos nos Estados Unidos, em vez de fabricá-los em território americano.

E pelo fentanil, que, segundo Washington, é uma droga sintética produzida no México com substâncias provenientes da China.

O septuagenário acredita ter encontrado a solução para todos os seus problemas.

"A palavra mais bonita do dicionário é tarifa", repete Trump a cada discurso.

"Vamos ter uma boa relação com a China (...), mas se eles venderem fentanil para os Estados Unidos através do México, vamos impor uma tarifa de 25% até que parem de fazê-lo", afirma.

Ele pensa em fazer o mesmo com o México "se eles não impedirem a entrada desse veneno" nos Estados Unidos. Segundo ele, "eles podem impedir isso não aceitando da China", embora "provavelmente tenham que chegar a um acordo com os cartéis".

Sergio Manuel Alcocer, presidente do Conselho Mexicano de Assuntos Internacionais, acredita que está por vir uma relação "muito complexa".

"A questão é se ele cumprirá suas promessas de campanha."

Suponhamos que sim. "Uma deportação terá efeitos sobre a força de trabalho nos Estados Unidos, na economia" e "graves consequências para o México no aspecto migratório", afirma.

Se a economia dos Estados Unidos "desacelerar, o crescimento do México estará em risco", explica.

Para lidar com Trump, a recém-empossada presidente mexicana, Claudia Sheinbaum, "teria que adotar uma posição muito pragmática".

"A vitória de Trump pode ser complicada, mas boa para o país" porque ele imporá normas e reagirá se o México se aproximar demais da China ou da Rússia, opina Alcocer.

"O México dirá que é um país soberano e pode fazer o que quiser" e Washington lhe dirá: "ou você vai com a China ou fica com o acordo" T-MEC, o tratado de livre comércio da América do Norte que, por sinal, Trump quer renegociar.

Em relação à migração ilegal, segundo o especialista, "o México deve ter aprendido a lição e não pode ceder às pressões dos Estados Unidos".

Se Washington quiser que os migrantes esperem do outro lado da fronteira até que seus casos migratórios sejam resolvidos nos tribunais, o México "deverá pedir dinheiro, muito dinheiro" como compensação, sugere Alcocer.

Vanda Felbab-Brown, diretora da Iniciativa sobre Atores Armados Não Estatais do Brookings Institution, com sede em Washington, também acredita que, de início, Trump usa "a diplomacia do porrete". "É fanfarronice, são ameaças, uma linguagem agressiva".

Rússia e China podem se beneficiar.

Se, sob a administração Trump, as relações se deteriorarem com um país latino-americano, "a China está bem posicionada para tirar vantagem", assegura Felbab-Brown.

Os Estados Unidos "não têm espaço fiscal nem interesse político para investir em grandes projetos de infraestrutura", como faz a China, acrescenta Sabatini. De modo que competem com Pequim "de mãos atadas nas áreas diplomática e econômica".

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