Tuberculose: 55% das cepas são resistentes a antibióticos
Estudo que testou amostras da bactéria em 23 países mapeou gravidade da crise e encontrou pistas para novas drogas
Uma pesquisa que recolheu em 23 países mais de 12 mil amostras da bactéria causadora da tuberculose testou todas contra 13 diferentes antibióticos, mostrando um cenário preocupante: mais de metade das cepas (55%) é resistente a pelo menos uma das drogas.
A constatação saiu do maior trabalho coletivo para investigação farmacêutica e genética já realizado no mundo, feito pelo consórcio internacional CRyPTIC, liderado pela Universidade de Oxford. O coletivo reúne mais de 50 instituições de pesquisa mundo afora, incluindo a Fiocruz e o Instituto Adolfo Lutz, no Brasil.
Ao testar todas as unidades do banco de amostras de bacilo da tuberculose coletadas pelo grupo, além de perceber que a maioria era resistente a algum medicamento, os cientistas constataram que 17% são resistentes praticamente a todas as drogas testadas, incluindo as mais fortes.
A descoberta está descrita em dois estudos publicados na edição de hoje da revista científica PLOS Biology, detalhando o cenário analisado. Entre as drogas testadas estava a rifampicina, antibiótico de amplo espectro usado desde a década de 1960, um remédio que revolucionou o tratamento da doença, causada pela bactéria Mycobacterium tuberculosis.
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No primeiro trabalho, os cientistas descrevem o que observaram ao usar uma instalação de pesquisa farmacêutica de “triagem de alto rendimento”, que testa amostras de células e lê resultados automaticamente.
“Apresentamos um compêndio de dados globais com 12.289 amostras isoladas de pacientes”, escrevem os pesquisadores. “O compêndio apresentou 6.814 isolados resistentes a pelo menos uma droga, incluindo 2.129 amostras que cumprem os critérios para definição clínica de patógenos resistentes a rifampicina, resistentes a múltiplas drogas ou extensivamente resistentes a drogas.”
No segundo trabalho, os cientistas mostram o resultado do sequenciamento do material genético de mais de 10 mil amostras da bactéria.
Alvos genéticos
Cruzando os dados genéticos com os de resistência, os pesquisadores conseguiram identificar 20 genes associados à defesa biológica que a Mycobacterium conseguiu evoluir contra os medicamentos, mas que ainda não eram conhecidos.
Os novos genes contêm informações das proteínas bacterianas que podem se tornar novos alvos de pesquisas de medicamentos. O catálogo de mutações genéticas criado pelo consórcio está aberto a cientistas.
Além de identificar novos genes relacionados à resistência, os pesquisadores mapearam a relevância de outros genes conhecidos no desempenho das diferentes cepas de bactérias testadas contra os antibióticos. Além disso, no segundo estudo, as bactérias foram submetidas a testes com diferentes concentrações de drogas.
Essa estratégia permitiu aos pesquisadores descobrir o limiar de dosagem de drogas às quais cada cepa sucumbe. Com essa informação, médicos podem tentar debelar uma infecção elevando a dose do medicamento, e não necessariamente receitando outra droga.
A Mycobacterium é só um dos muitos patógenos que evoluíram para resistir aos antimicrobianos, mas tem ganhado atenção especial da ciência, pois ainda é um micróbio muito prevalente em países desenvolvidos.
“O avanço da tuberculose resistente a drogas é de grande preocupação para a saúde global e ameaça nossa habilidade de controlar a doença”, escrevem os cientistas.