UE e ONU pedem investigações independentes sobre os mais de 300 corpos encontrados em Gaza
Idosos, mulheres e crianças estavam entre os cadáveres; com indícios de tortura, eles foram achados depois que militares israelenses saíram de hospitais
A União Europeia (UE) pediu, nesta quarta-feira (24), uma investigação independente sobre os mais de 300 corpos encontrados em valas comuns em dois hospitais da Faixa de Gaza que foram alvos de incursões do Exército de Israel. O porta-voz do serviço diplomático do bloco afirmou que, com base nas informações iniciais, a “impressão” é a de que “poderiam ter sido cometidas violações dos direitos humanos internacionais”. Nesta terça-feira, as Nações Unidas também solicitaram uma “investigação independente, eficaz e transparente” sobre o caso, e o Alto Comissário da ONU para os Direitos Humanos, Volker Turk, lamentou a destruição e disse estar “horrorizado” com os relatos.
"É importante realizar uma investigação independente e garantir a prestação de contas. Isso é algo em que a União Europeia é coerente, seja na Faixa de Gaza ou em qualquer outro lugar do mundo" disse Peter Stano, porta-voz do serviço diplomático da UE.
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Já Turk declarou, em sessão informativa da ONU e por meio de um porta-voz, que, “dado o clima de impunidade reinante, os investigadores internacionais devem participar do processo” de investigação. Ele pontuou que os hospitais têm “direito à proteção especial nos termos do direito internacional humanitário”, e que “o assassinato de civis, detidos e outros que estejam fora de combate é um crime de guerra”. Também na terça, o Departamento de Estado dos EUA expressou preocupação com a descoberta. Ao todo, 324 corpos foram encontrados pela Defesa Civil nesta semana no Complexo Médico Nasser, na cidade de Khan Younis. Em al-Shifa, pelo menos 381 cadáveres foram recuperados.
Segundo Ravina Shamdasani, porta-voz do Alto Comissariado da ONU para os Refugiados, as vítimas “foram enterradas profundamente no solo e cobertas de lixo”, e havia idosos, mulheres, crianças e jovens entre os cadáveres. Alguns, disse, foram achados “com as mãos amarradas e sem roupa”. Para o porta-voz da Defesa Civil de Gaza, Mahmund Basal, estas são evidências de que eles “sofreram tortura e abusos”. À CNN, o coronel Yamen Abu Suleiman, diretor da Defesa Civil local, disse que alguns tinham sinais de execução, e que não era possível determinar se eles foram enterrados vivos ou mortos. Ele pontuou que a maior parte já estava em decomposição, o que dificultou o processo de identificação.
Moradores relataram à agência Reuters que tropas israelenses enterraram corpos no local com escavadeiras. O Exército de Israel, por sua vez, afirmou que suas tropas desenterraram alguns corpos da região e os enterraram novamente para garantir que não havia reféns entre eles. Conforme a Associated Press, a área de sepultamento no hospital Nasser foi construída quando o Exército ocupou a instalação no mês passado. Na ocasião, as pessoas não conseguiam enterrar os mortos em um cemitério e, por isso, cavaram covas no pátio do hospital.
A Defesa Civil estima que ainda haja 2 mil pessoas desaparecidas apenas em Khan Younis, além de outras mil na região central do território, que ainda não foram recuperadas por falta de condições e equipamentos para remover os destroços das construções danificadas.
Os corpos foram encontrados depois que militares israelenses saíram do hospital, que abrigava milhares de palestinos deslocados. A última incursão ocorreu no mês passado sob a justificativa de que as autoridades de Tel Aviv tinham “informações confiáveis de uma série de fontes, incluindo de reféns libertados”, de que o grupo terrorista Hamas já havia mantido sequestrados no local. As evidências, porém, não foram divulgadas. Na ocasião, o Ministério da Saúde de Gaza, controlado pelo Hamas desde 2007, declarou que “a ocupação israelense” invadiu o hospital e o transformou num “quartel militar”.
Em março, dias após as Forças Armadas israelenses iniciarem um ataque contra o Hamas dentro e ao redor do hospital al-Shifa, veículos militares cercaram o Nasser e o al-Amal. Segundo o Crescente Vermelho Palestino, bombardeios pesados e tiros ecoaram na área, e ao menos um trabalhador voluntário do hospital foi morto pelo Exército. Mensagens transmitidas por drones, acrescentou a organização, exigiam que todos saíssem nus de al-Amal, que teve suas portas bloqueadas e barricadas feitas com sacos de lixo. A ONG declarou, na época, que todas as suas equipes estavam “sob extremo perigo” e não podiam se mover.
Um mês antes, também durante uma invasão ao Complexo Médico Nasser, a Organização Mundial da Saúde (OMS) chegou a declarar que o local não era mais “funcional” – ainda que, na ocasião, abrigasse 200 pacientes. Diretor-geral da OMS, Tedros Adhanom afirmou, naquele contexto, que equipes da organização não foram autorizadas a entrar no hospital para “avaliar as condições dos pacientes e as necessidades críticas”. Até então, a unidade era a maior em funcionamento no enclave. O hospital, porém, não pode mais atender pacientes que precisam de cuidados intensivos e foi prejudicado por cortes de água e eletricidade. (Com AFP e New York Times)