Vacina contra cocaína e crack: Prefeitura de SP vai investir R$ 4 milhões no imunizante
Dose em testes na UFMG induz anticorpos que se juntam à droga para impedi-la de chegar ao sistema nervoso
A Prefeitura de São Paulo anunciou, na noite de quinta-feira (1°), uma parceria com a Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) para apoiar o desenvolvimento da Calixcoca, uma vacina terapêutica direcionada para atuar na dependência de cocaína e crack. O município acredita que, caso se mostre de fato eficaz, o imunizante pode ajudar a reduzir o impacto do consumo de drogas na capital paulista.
O acordo foi firmado após reunião do pesquisador da UFMG responsável pela vacina, Frederico Garcia, e os secretários municipais de São Paulo da Saúde, Luiz Carlos Zamarco, de Governo, Edson Aparecido, o chefe de gabinete da gestão municipal, Vitor Sampaio, e o coordenador da Vigilância em Saúde, Luiz Artur Caldeira.
Em comunicado, Sampaio diz que o prefeito, Ricardo Nunes (MDB), “determinou apoio irrestrito, tanto técnico como financeiro, para viabilizar e acelerar as próximas fases da vacina, que poderão custar, inicialmente, R$ 4 milhões”.
O imunizante demonstrou resultados promissores em experimentos iniciais, mas ainda não chegou à fase de testes clínicos, em humanos, que são divididos em três etapas e necessários para que seja solicitado o aval de uso à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).
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“Demonstramos a redução dos efeitos, o que sugere eficácia no tratamento da dependência. Pensamos em utilizar o fármaco para evitar recaídas em pacientes que estão em tratamento, dando mais tempo para eles reconstruírem sua vida sem a droga”, explicou Garcia, em comunicado recente da UFMG.
A aplicação induz o sistema imunológico a produzir anticorpos que se ligam à substância na corrente sanguínea. Com isso, a droga se torna uma molécula grande que não consegue passar pela barreira hematoencefálica, uma membrana que reveste e protege o Sistema Nervoso Central (SNC). Dessa maneira, a cocaína não chega ao cérebro.
Atualmente, não existem terapias do tipo aprovadas pelas agências reguladoras. Por isso, o tratamento da dependência é restrito a mudanças comportamentais e medicamentos que atuam nos sintomas, ou seja, ajudam a tolerar a abstinência e a impulsividade do usuário.
“Esse é um problema prevalente, vulnerabilizante e sem tratamento específico. Os nossos estudos pré-clínicos comprovam a segurança e eficácia da vacina nesta aplicação. Ela aporta uma solução que permite aos pacientes com dependência se reinserir socialmente e voltar a realizar seus sonhos”, defende Garcia.
O projeto do imunizante já concluiu as etapas pré-clínicas, em laboratório, que avaliaram a segurança e o potencial da dose em tratar a dependência de animais expostos durante a gravidez às drogas. Durante os testes com ratas grávidas, observou-se que “a vacina impediu a ação da droga sobre a placenta e o feto”. “Observamos menos complicações obstétricas, maior número de filhotes e maior peso do que as não vacinadas”, relata o especialista.
Os responsáveis esperam ainda que a vacina funcione para os derivados da cocaína, como é o caso do crack. O projeto estava em busca de financiamento para avançar até as etapas dos estudos clínicos, em humanos.
A iniciativa repercutiu recentemente após ter sido selecionada como finalista do Prêmio Euro Inovação na Saúde, feito pela farmacêutica EuroFarma e que envolve os países da América Latina. Caso vença o prêmio, Garcia aponta que o valor a ser recebido poderá ajudar na pesquisa.
De acordo com o comunicado da prefeitura de São Paulo, com o andamento dos estudos “aplicação do imunizante (será avaliada) em grupos elegíveis, incluindo os dependentes químicos em fase de recuperação”.
Se bem-sucedida, poderá contribuir para um tratamento mais eficaz de dependentes de crack e cocaína. A prefeitura ressalta que dados da Organização das Nações Unidas (ONU) mostram que as drogas respondem por 11% da dependência química no Brasil.
“Será, entre outros avanços científicos, um movimento para recuperação psicossocial e reintegração de dependentes químicos à sociedade”, disse o secretário de Saúde da capital paulista, Luiz Carlos Zamarco.