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"Vi como meu bebê começou a congelar", diz mãe de recém-nascido que morreu de frio em Gaza

Pelo menos sete recém-nascidos foram vitimados pela hipotermia devido à falta de calefação ou estruturas adequadas para aplacar as baixas temperaturas no enclave

Criança palestina anda de bicicleta passando por tendas encharcadas durante uma tempestade de chuva em um acampamento improvisado na Cidade de Gaza em 31 de dezembro de 2024 Criança palestina anda de bicicleta passando por tendas encharcadas durante uma tempestade de chuva em um acampamento improvisado na Cidade de Gaza em 31 de dezembro de 2024  - Foto: OMAR AL-QATTAA/AFP

Yahya al-Batran agarra-se às roupas minúsculas do seu filho, Jumaa, poucos dias depois de o recém-nascido ter morrido de frio em uma barraca na Faixa de Gaza devastada pela guerra entre Israel e Hamas, que se arrasta há mais de um ano.

— Estamos vendo nossos filhos morrerem — lamenta o homem de 44 anos.

Seu bebê foi uma das sete crianças que morreram de frio no pequeno território palestino em apenas uma semana, segundo o Ministério da Saúde de Gaza, cujo território é governado desde 2007 pelo Hamas.

— Fugimos dos bombardeios de Beit Lahia para que ele morresse de frio aqui? — questiona Noura al-Batran, a mãe do bebê, de luto, referindo-se à sua cidade natal, no norte de Gaza, de onde a família fugiu devido aos incessantes bombardeios israelenses.

 

A mulher de 38 anos ainda está se recuperando do parto prematuro de Jumaa e do seu irmão gêmeo, Ali, que atualmente recebe tratamento em uma unidade de cuidados intensivos em um hospital no sul do enclave palestino.

De acordo com a rede britânica BBC, os bebês têm um mecanismo de regulação de temperatura corporal subdesenvolvido, podendo desenvolver hipotermia facilmente em um ambiente frio. Bebês prematuros são especialmente vulneráveis.

A família Batran, deslocada várias vezes pela guerra, sobrevive atualmente sob uma barraca improvisada em Deir el-Balah, feita de cobertores e tecidos gastos. Assim como centenas de outras pessoas deslocadas que agora moram em acampamentos, eles lutaram para se manter aquecidos e secos em meio a fortes chuvas e temperaturas que caíram para 8 ºC.

— Não temos cobertores suficientes ou roupas adequadas. Vi como meu bebê começou a congelar, sua pele ficou azul e então ele morreu — lembra Noura al-Batran.

Os gêmeos nasceram prematuros e, segundo ela, o médico decidiu retirar os bebês da incubadora mesmo que a família não tivesse acesso à calefação. Em um tapete encharcado de chuva, o pai abraçou firmemente os filhos mais velhos com cobertores e panos em um canto da barraca.

O diretor regional do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), Edouard Beigbeder, disse que as mortes "evitáveis" desses bebês "expõem as condições desesperadoras e deteriorantes enfrentadas por famílias e crianças em Gaza". Argumentou que, com "a previsão de que as temperaturas cairão ainda mais nos próximos dias, é tragicamente previsível que mais vidas de crianças sejam perdidas devido às condições desumanas que estão enfrentando."

'Tudo leva à morte'
Assim como milhares de outras famílias, os pais do bebê falecido sobrevivem em meio a uma grave escassez de alimentos, combustível e medicamentos. As Nações Unidas já alertaram para o colapso iminente do sistema de saúde em Gaza. Desde o início da guerra, em outubro de 2023, até 30 de junho passado, Israel realizou pelo menos 136 ataques contra 27 hospitais e outras 12 instalações médicas, nos quais 500 profissionais de saúde morreram, cometendo possíveis crimes de guerra e contra a Humanidade, alertou o Escritório da ONU para os Direitos Humanos.

Em Khan Yunis, no sul da Faixa de Gaza, Mahmoud al-Fasih também diz que encontrou a sua filha, Seela, "congelada pelo frio" na sua pequena barraca perto da praia de al-Mawasi. A família de al-Fasih foi deslocada pelo conflito mais de dez vezes. À BBC, a mãe, Nariman al-Najmeh, disse ter acordado de manhã e relatado ao marido que a bebê não se mexia há algum tempo. Foi então que a mulher reparou que seu rosto "estava azul, [e a bebê estava] mordendo a língua, com sangue saindo pela boca".

O homem, deslocado da Cidade de Gaza, levou-a rapidamente para o hospital local, mas sua filha já estava morta. Ahmad al-Farra, médico e diretor do serviço de emergência e pediatria do Hospital Nasser, disse à AFP que o bebê de três semanas chegou ao hospital com "hipotermia grave, sem sinais vitais e com parada cardíaca que causou sua morte".

Outro bebê de 20 dias, Aisha al-Qassas, também morreu de frio na região, segundo sua família.

— Em Gaza, tudo leva à morte — diz o tio do bebê, Mohamed al-Qassas. — Aqueles que não morrem sob o bombardeio israelense sucumbem de fome ou de frio.

A assessoria de imprensa do governo do Hamas em Gaza emitiu um alerta na segunda-feira sobre as condições climáticas esperadas para os próximos dias. Representam uma "ameaça real para dois milhões de pessoas deslocadas", a maioria das quais vive em barracas de campanha, sublinhou.

— A vida nas barracas é perigosa devido ao frio e à escassez de fontes de energia e calefação — explicou al-Farra, temendo que o mau tempo provoque "a morte de um maior número de crianças, bebês e idosos". 

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