Araújo sugere deixar campanha de Doria: 'Não é emprego. É transitório'
Apoiadores de Doria têm dito que Araújo deveria defender mais o governador publicamente
Criticado por aliados do governador de São Paulo, João Doria, o presidente do PSDB, Bruno Araújo, disse ontem que a coordenação da campanha presidencial do paulista “não é emprego” e, sim, apenas uma “atribuição transitória”. O dirigente deixou em aberto a possibilidade de abrir mão do cargo para cuidar, em nome da legenda, das negociações de alianças e da formação de federações neste ano.
— Essa atribuição é transitória. Coordenação (de campanha) não é emprego. Minha função política é ser o presidente nacional do partido. É um mandato. E recebi confiança de todos os grupos políticos que fazem a legenda — disse Araújo ao GLOBO.
Apoiadores de Doria têm dito que Araújo deveria defender mais o governador publicamente e dar entrevistas em reação à pressão interna contra a candidatura do paulista. No último levantamento do Instituto Datafolha, Doria aparece com 4%.
Antes restritas aos bastidores, as cobranças a Araújo foram tornadas públicas pelo deputado federal Alexandre Leite (União Brasil) em entrevista ao jornal “Folha de S.Paulo”. Nela, o deputado acusou o presidente do PSDB de “sabotar” Doria. O deputado é filho de Milton Leite, influente político paulista — ambos são aliados dos tucanos em São Paulo e devem apoiar o vice-governador Rodrigo Garcia na campanha ao governo.
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Araújo, que deve se encontrar com Doria neste fim de semana, ironizou as críticas de Leite:
— Vou conversar com o governador, quem sabe Alexandre Leita não ajuda nessa empreitada. Não posso perder o foco nas atividades do partido, como as federações e coligações por todo o Brasil — afirmou o tucano.
O clima entre Araújo e aliados de Doria azedou no último dia 13, quando um grupo de ex-presidentes tucanos que se opõe ao paulista se reuniram em Brasília junto com o governador gaúcho, Eduardo Leite, para minar a candidatura de Doria. Na ocasião, o paulista mobilizou aliados nas redes sociais que o defenderam e ainda classificou o encontro de “jantar de derrotados”. Araújo fez uma nota, que para o entorno do paulista não teria sido enfática o suficiente contra os dissidentes.
— Sou o presidente do partido, não cão de guarda. Toda defesa precisa ser coletiva. Os que criticam ‘em off’ são os mesmos que ficam calados quando o circo pega fogo — disse Araújo.
A resistência interna ao dirigente tucano remonta à disputa acirrada das prévias do PSDB, cujo legado foi aprofundar as divisões na sigla. Nas primárias, o grupo de Doria acusou dirigentes da comissão de direcionarem o processo para favorecer Leite. Segundo eles, Araújo nada fez diante do complô contra Doria que seria orquestrado a mando do deputado mineiro Aécio Neves, desafeto do governador e entusiasta de Leite. O grupo do governador gaúcho também não gostou das atitudes do presidente do partido na reta final da disputa, quando houve uma pane no aplicativo de votação. Para o entorno de Leite, Araújo deveria ter se empenhado em investigar as falhas. A votação foi retomada uma semana depois com outro aplicativo.
Apesar da vitória de Doria nas prévias, há um grupo do partido que vem trabalhando por outra candidatura. Os senador Tasso Jereissatti, do Ceará, e o ex-senador José Anibal, de São Paulo, apoiam a senadora Simone Tebet (MDB-MS) como nome da terceira via. Avaliam que ela tem um patamar de votos semelhante ao de Doria e índices de rejeição muito menores.
Outros tucanos chegam até a defender a substituição de Doria por Leite, que também teria menos rejeição. Hoje, o gaúcho flerta com uma candidatura à Presidência pelo PSD.
Aécio, por sua vez, costumava defender a tese de que, diante da polarização entre o presidente Jair Bolsonaro e o ex-presidente Lula, o partido deveria abrir mão da dispendiosa campanha presidencial e investir na eleição proporcional para aumentar as bancadas.
O único consenso entre os opositores de Doria é que sua rejeição inviabiliza qualquer plano eleitoral e poderia contaminar as candidaturas de governadores e deputados. De acordo com o Datafolha de dezembro, 34% dos eleitores dizem que não votariam no tucano de jeito nenhum — mesmo número de Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Em meio à guerra interna, Araújo passa recado para diferentes alas:
— Minha missão é de muito equilíbrio. Desde Aécio Neves, que prega que sou o grande articulador e planejei a trajetória de Doria até aqui, até os aliados mais fervorosos do nosso candidato, que acham que falta empenho na defesa (dele). É um processo em que as emoções e interesses coletivos ou pessoais fazem cada um criar na sua mente o seu próprio mundo de convicções.