Atos da extrema direita explodiram e ficaram mais violentos no pós-eleições, mostra levantamento
Estudo de pesquisadora do Cebrap mostra que foram registradas 1.666 manifestações entre novembro de 2022 e 8 de janeiro, acima dos 1.548 nos quatro anos anteriores
O Brasil registrou mais manifestações de extrema direita nos dois meses após a eleição do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) do que nos quatro anos anteriores. O crescimento acompanhou o recrudescimento da violência nos atos, que culminou no 8 de Janeiro, quando golpistas invadiram e vandalizaram prédios dos três Poderes, em Brasília.
Pesquisa da cientista política Lilian Sendretti, do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (Cebrap), mostra que foram registradas 1.666 manifestações entre novembro de 2022 e o dia 8 de janeiro deste ano. Entre 2018 e 2021, foram 1.548 ao todo.
O número pós-eleições foi puxado pelo fechamento de estradas pelo Brasil, que começou logo após a divulgação do resultado do segundo turno, em 30 de outubro — no período, foram registrados 1.493 bloqueios.
O levantamento estuda manifestações identificadas como de extrema direita realizadas em todo o país entre o começo de 2018 e 8 de janeiro deste ano a partir de informações reunidas em um banco de dados internacional que mapeia violência política. O monitoramento considera atos noticiados em jornais nacionais e regionais.
A concentração de manifestações de extrema direita no período pós-eleitoral, na avaliação da pesquisadora, tem relação com um processo de radicalização desse segmento nos últimos anos, sobretudo a partir de 2021, com reações agressivas por parte de um movimento negacionista contra medidas restritivas impostas no contexto da Covid-19. Na sequência, tiveram as manifestações no contexto do Dia da Independência, quando o então presidente Jair Bolsonaro atacou ministros do STF, em São Paulo. No ano passado, além da data, ela cita os ataques golpistas em 12 de dezembro, no dia da diplomação de Lula — o último ato grave antes do 8 de janeiro:
— Há a radicalização desses atores que foram, durante anos, mobilizados a irem para as ruas. A panela de pressão da extrema direita estava há muito tempo para estourar, o que aconteceu com o 8 de janeiro — afirma a pesquisadora.
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Alta nos bloqueios
As manifestações agressivas, que representam a maioria dos atos analisados, são puxadas pelos bloqueios em estradas e foram bem mais frequentes que concentrações e carreatas, tidas como menos violentas. Enquanto o fechamento de rodovias representou 1.786 dos casos registrados, foram 815 concentrações e 504 carreatas no período. O crescimento dessa estratégia, de acordo com Lilian, ocorre a reboque de uma “autorização” concedida por autoridades e agentes políticos, como o próprio ex-presidente.
— Durante o governo Bolsonaro, houve inúmeros discursos, especialmente do presidente, defendendo que o adversário é alguém que tenha que ser exterminado. E tem políticos que atendem ao público e falam “eu autorizo”, mas não dizem o quê. Isso funciona como um cheque em branco aos manifestantes — afirma a pesquisadora.
De acordo com Sendretti, movimentos de esquerda utilizam ferramentas similares às aplicadas pela extrema direita para dar voz às próprias pautas. A diferença, pontua, está no teor de bloqueios, concentrações e acampamentos. Enquanto atos da esquerda mapeados no período encamparam reivindicação de direitos constitucionais ou previstos em lei, a extrema direita levava às ruas temas de cunho antidemocrático, como, por exemplo, o fechamento do Congresso e do STF e uma intervenção militar no país.