Eleições

Big Techs pedem ao TSE para não serem responsabilizadas por fake news nas eleições

Representantes do Facebook, Google e YouTube não querem ser obrigados a identificarem uso de inteligência artificial; plataformas arrecadaram R$ 375 milhões com posts impulsionadas no último pleito

Ministra Cármen Lúcia conduz audiência no TSE Ministra Cármen Lúcia conduz audiência no TSE  - Foto: Secom/TSE

As plataformas digitais miraram, em audiência pública no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ajustes na minuta de resolução sobre propaganda eleitoral da Corte. O intuito é evitar sua eventual responsabilização por conteúdos impulsionados e por postagens com desinformação sobre o processo eleitoral, ou que usem tecnologias de inteligência artificial sem a devida identificação durante o pleito de 2024. As alterações ao texto apresentado pelo tribunal foram defendidas por representantes do Facebook, Google e YouTube na sessão desta quinta-feira e ainda vão passar por análise do TSE, assim como as sugestões de outras instituições e empresas.

A necessidade de moderação de postagens patrocinadas e a possibilidade de serem responsabilizadas por elas tem como pano de fundo o alto valor arrecadado com essa forma de propaganda. Um levantamento da organização Democracia em Xeque, divulgado na audiência, aponta que, somente no pleito de 2022, as plataformas arrecadaram R$ 375 milhões com postagens impulsionadas, de acordo com as prestações de contas enviadas à Justiça Eleitoral. Do total, R$ 250 milhões foram oriundos do fundo eleitoral e R$ 125 milhões de recurso privado dos candidatos.

Uma das sugestões apresentadas pelo Facebook envolve a proibição de impulsionamento de postagens 48 horas antes e até 24 horas depois da eleição. A empresa defendeu que a responsabilidade por verificar o cumprimento desse prazo seja apenas do anunciante, ou seja, de candidatos, partidos, coligações ou federações. O trecho da minuta que a plataforma sugere alterar determina que cabe "ao provedor de aplicação, que comercializa o impulsionamento, realizar o desligamento da veiculação de propaganda eleitoral" nos períodos em que seja proibida.

— Entendemos que a proposta atual impõe um dever aos provedores de julgar o que é e o que não é propaganda eleitoral, o que muitas vezes pode ser subjetivo — argumentou o advogado da big tech, Rodolfo Ruf Martins.

O Facebook sugeriu ainda substituir "responsabilidade" por "dever" em um artigo que estabelece que é "responsabilidade" das plataformas "a adoção e publicização de medidas para impedir ou diminuir a circulação de conteúdo ilícito que atinja a integridade do processo eleitoral". Essa lista inclui, por exemplo, ataques às urnas eletrônicas.

Representante do Google, Tais Tesser também mirou em sua defesa na audiência a proibição de impulsionamento de postagens dois dias antes e um dia depois do pleito, e defendeu que o desligamento da propaganda cabe aos anunciantes. Tesser também argumentou que a responsabilidade de veicular "fato sabidamente inverídico ou gravemente descontextualizado" cabe somente aos anunciantes, "que de fato produzem o conteúdo".

— Qualquer mudança que pretenda alterar o regime de responsabilidade atribuído aos anunciantes avançaria contra o regime legal da Lei das Eleições e fora do espaço democrático de deliberação — alegou Tesser.

A plataforma de buscas também pediu alterações para permitir o impulsionamento de anúncios com a utilização de palavra-chave com o nome de partido, federação, coligação, candidata ou candidato adversário, mesmo que para campanha positiva.

Arrecadação milionária
Os dados do Democracia em Xeque apontam que Facebook e Google foram as plataformas em que candidatos fizeram o maior investimento nas eleições passadas. A empresa da Meta arrecadou R$ 128 milhões, enquanto o Google ficou com R$ 126 milhões dessa publicidade digital. Diretor da organização, Fernando Garrido ressaltou que o montante expressivo que não torna aceitável argumento de falta de agilidade e de presteza no oferecimento de transparência e também a ausência de moderação de anúncios.

— Não é admissível que a propaganda vá ao ar e não passe por um crivo de moderação das plataformas — ressaltou Garrido na audiência.

Já o YouTube propôs ajuste no artigo que impõe que o conteúdo fabricado ou manipulado por uso de tecnologias de inteligência artificial nos casos de propaganda eleitoral seja acompanhado de informação explícita e destacada sobre o uso da IA. A plataforma de vídeos sugeriu a inclusão de um novo parágrafo que especifique que essa responsabilidade é do responsável pela elaboração da peça, ou seja, de partidos e candidatos.

— O ajuste se impõe especialmente porque o uso de tecnologias cada vez mais refinadas torna a necessária identificação de conteúdo manipulado ou criado um grande desafio não só para cidadãos e autoridades, como também para as plataformas, de modo que a criação de uma obrigação às empresas demandaria maior debate e especificação de parâmetros legais mínimos — afirmou Alana Rizzo, responsável pelo setor de políticas publicas do YouTube.

O Instituto de Referência em Internet e Sociedade defendeu que o autor do conteúdo seja o responsável por identificar o uso de inteligência artificial, assim como o caráter político eleitoral. A ponderação é que as resoluções apresentadas pelo TSE não são claras sobre quem é responsável por informar ao cidadão o uso de tecnologia. Outro ponto é sobre qual informação acerca do uso de tecnologia deve ser publicizada, e quem deve identificar o conteúdo como de caráter político eleitoral.

A pesquisadora Débora Salles, do Netlab UFRJ, destacou que, para ser possível responsabilizar anunciantes que violem as regras do processo eleitoral, é essencial que as plataformas garantam que a sociedade como um todo possam fiscalizar os anúncios nelas veiculados por meio de bibliotecas de anúncios acessíveis ao público e passíveis de busca para garantir transparência.

— Apenas Meta e Google disponibilizam no Brasil repositórios de publicidade política e eleitoral — afirmou. — Sem a devida transparência, é impossível verificar o cumprimento dos pontos descritos na minuta.

Veja também

STF tem 5 votos pela recusa à transfusão por testemunhas de Jeová
STF

STF tem 5 votos pela recusa à transfusão por testemunhas de Jeová

Dino determina que estados da Amazônia expliquem focos de queimadas
Queimadas

Dino determina que estados da Amazônia expliquem focos de queimadas

Newsletter