Operação Tempus Veritatis

Bolsonaro 'redigiu e ajustou' minuta de golpe depois de reunião com comandantes

Relatório aponta seis núcleos voltados para operacionalizar golpe

Jair Bolsonaro, ex-presidenteJair Bolsonaro, ex-presidente - Foto: Isac Nóbrega/PR

A Polícia Federal (PF) acredita que o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) teve participação direta na edição da minuta golpista que circulou entre seus aliados após o segundo turno das eleições. Conversas encontradas no celular do tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens da Presidência, sugerem que Bolsonaro ajudou a redigir e editar o documento.

Em mensagens trocadas com o general Marco Antônio Freire Gomes, então comandante do Exército, em dezembro de 2022, Cid afirma que Bolsonaro "enxugou" o texto. "Fez um decreto muito mais resumido", afirma o ajudante de ordens. "Algo muito mais direto, objetivo e curto, e limitado."

A versão inicial do rascunho previa, além de novas eleições, a prisão de autoridades, como os ministros Gilmar Mendes e Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), e o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG). Segundo a Polícia Federal, por sugestão de Bolsonaro, apenas o decreto de prisão de Moraes foi mantido.

As mensagens foram trocadas após uma reunião de oficiais supostamente aliados ao plano golpista em Brasília, no final de novembro de 2022.

A PF deflagrou nesta quinta-feira a Operação Tempus Veritatis (a hora da verdade, em latim) e prendeu aliados do ex-presidente suspeitos de envolvimento na empreitada golpistas. Entre os alvos, estão Braga Netto, Augusto Heleno, Anderson Torres, Valdemar Costa Neto, Paulo Sérgio Nogueira e Almir Garnier Santos.

O próprio Bolsonaro foi alvo de buscas na ação e deve entregar seu passaporte à PF em até 24 horas. A operação fecha o cerco decisivamente ao ex-presidente na investigação sobre tentativa de golpe de Estado e abolição do Estado Democrático de Direito.

O que dizem as defesas
O ex-chefe da Secretaria de Comunicação Social do governo Bolsonaro, Fábio Wajngarten, também advogado do ex-presidente, afirmou que ele vai entregar o passaporte, como determinado pela Justiça. As defesas de Felipe Martins e Marcelo Câmara disseram que ainda não tiveram acesso à íntegra da investigação.

Minuta golpista
A minuta de decreto “para executar um golpe de Estado”, foi entregue ao ex-presidente em 2022 pelo então assessor da Presidência para Assuntos Internacionais Filipe Martins, que foi preso preventivamente nesta quinta-feira, e pelo advogado Amauri Feres Saad, apontado como mentor intelectual do documento. 

O texto, segundo o relatório da PF, almejava a prisão dos ministros do Supremo  Alexandre de Moraes e Gilmar Mendes, e também a prisão do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG). 

O documento previa ainda a realização de novas eleições, diante do que seriam indícios de fraude nas urnas eletrônicas. 

A PF afirma que Bolsonaro teria pedido alterações no documento, para tirar os nomes de Mendes e de Pacheco. Em dado momento, a PF afirma que Moraes “foi monitorado pelos investigados, demonstrando que os atos relacionados à tentativa de Golpe de Estado e Abolição do Estado Democrático de Direito, estavam em execução”.

Nas investigações, a PF menciona que Martins embarcou para os Estados Unidos junto com Bolsonaro em 30 de dezembro de 2022, no avião presidencial, sem passar por procedimentos migratórios. Ele também teria retornado ao país, meses depois, sem registros, “o que pode indicar que tenha se evadido do país para se furtar de eventuais responsabilizações criminais”, diz o relatório policial. 

Reunião 
Um dos eventos cruciais para as investigações, conforme aponta a PF, foi uma reunião convocada por Bolsonaro com a alta cúpula do governo federal e realizada em 5 de julho de 2022. No encontro, o então presidente teria cobrado aos presentes que se valessem de seus cargos para disseminar informações falsas sobre supostas fraudes nas eleições. 

Um vídeo com a gravação da reunião foi encontrado em um dos computadores do ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, o tenente-coronel Mauro Cid, que fechou acordo de colaboração premiada com a PF, após ter sido preso preventivamente nas investigações sobre os atos golpistas de 8 de janeiro. 

“Pessoal, perder uma eleição não tem problema nenhum. Nós não podemos é perder a Democracia numa eleição fraudada!”, teria insistido Bolsonaro na ocasião. 

Algum tempo depois, o general Augusto Heleno, então ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), menciona uma “virada de mesa” em relação às eleições. "Não vai ter revisão do VAR. Então, o que tiver que ser feito tem que ser feito antes das eleições. Se tiver que dar soco na mesa é antes das eleições. Se tiver que virar a mesa é antes das eleições”, disse, segundo relatório da PF. 

A partir dessa reunião, teria se dado uma sequência de eventos para o planejamento do golpe, descritos em mensagens extraídas de celulares de Mauro Cid e nas quais o ajudante de ordens assume a tarefa de coordenação na disseminação de ataques à Justiça Eleitoral. 

Passada a eleição, com a derrota de Bolsonaro, teria se iniciado a fase de planejamento de uma ação mais efetiva de tropas do Exército. O coronel Bernardo Romão Correia Neto, por exemplo, teria organizado reunião em 28 de novembro, em Brasília, com oficiais que aderiram ao golpe para um planejamento operacional. 

Em seguida, Correia Neto envia a Cid minuta de documento chamado “Carta ao Comandante do Exército de Oficiais Superiores da Ativa do Exército Brasileiro”, que teria sido redigido na reunião e com o objetivo de pressionar o então comandante do Exército, general Freire Gomes, a aderir ao movimento golpista. 

Correia Neto foi preso preventivamente nesta quinta-feira, por ordem de Moraes. 

 

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