Candidatos a prefeito brincam e dançam no TikTok, fenômeno entre crianças e adolescentes
No mês passado foi o aplicativo não relacionado a jogos mais baixado da Google Play e da App Store
O sucesso do aplicativo chinês TikTok chamou atenção de candidatos que estão aderindo à rede social frequentada principalmente por crianças e adolescentes. Na plataforma, os políticos tentam dar movimento e graça aos perfis mesclando conteúdo da campanha com danças, memes e games rápidos. Fácil de editar e de publicar vídeos curtos (até 60 segundos) com músicas, filtros e efeitos especiais, o TikTok cativa jovens do mundo todo.
No mês passado foi o aplicativo não relacionado a jogos mais baixado da Google Play e da App Store, com 61,1 milhões de instalações, de acordo com a consultoria Sensor Tower. O Brasil (11% do total de downloads) e os Estados Unidos (9%) foram os principais mercados.
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Em ano eleitoral, parte dos novos usuários figura na política nacional, como Guilherme Boulos, Joice Hasselmann, Arthur do Val e Jilmar Tatto, que disputam a Prefeitura de São Paulo. Boulos (PSOL), 38, virou um "tiktoker" em maio. O primeiro vídeo publicado por ele mostra, em poucos segundos, a preparação de um macarrão com molho de queijo.
Assíduo na rede, Boulos participa inclusive dos chamados "challenges" (desafios). No "Jogo Rápido da Quarentena", confessou ter se sentido sozinho e disse que até estocou papel higiênico na pandemia.
Boulos também usa a rede para tirar onda dos adversários. No "Quiz para as Pessoas de Esquerda", o candidato, questionado se "ficaria com alguém que defende o Bolsonaro", responde que não com expressão de ironia e desprezo. É a postagem de maior sucesso do candidato: teve 604 mil visualizações.
É o próprio candidato do PSOL que faz as postagens buscando alcançar o público mais jovem e engajado, segundo o coordenador da campanha de Boulos, Josué Rocha. Ele aponta que os resultados têm sido positivos: nos últimos três meses o perfil ganhou mais de 25 mil seguidores.
"A proposta é mostrar o Guilherme como ele é: um ser humano como qualquer um de nós", diz. O coordenador do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto é o candidato da capital paulista com o maior número de seguidores na plataforma: são 29 mil.
O candidato do PSOL lidera também o ranking de popularidade digital elaborado pela consultoria Quaest e publicado semanalmente pela Folha de S.Paulo, que avalia o desempenho dos candidatos no Facebook, Instagram, Twitter, YouTube, Wikipedia e Google.
Joice Hasselmann (PSL), 42, também aderiu à rede social. "O potencial do TikTok é muito grande. É simples de ser usado, tem dinamismo e muita música, atributos que os jovens procuravam fazia tempo", diz Daniel Braga, coordenador de comunicação da campanha.
A candidata do PSL estreou na rede no mês passado com um vídeo em que surgem fotos suas sérias na atuação como parlamentar e na sequência um vídeo em que aparece dançando sorridente e acenando para a câmera, ao som de uma música tranquila.
Três dos seis vídeos publicados pela candidata foram editados pela filha de 12 anos do coordenador de comunicação Daniel Braga. No perfil, a candidata se descreve como "Joice Pepita do coração". Em um dos vídeos, a candidata e a personagem Peppa Pig aparecem dançando em tela dividida. "Para de filmar!", diz brincando no fim do vídeo publicado na rede social.
Nos últimos dias, ela usou imagens da personagem de desenho animado Peppa para responder a bolsonaristas, que passaram a atacá-la após seu rompimento com o presidente Bolsonaro (sem partido). Jilmar Tatto (PT), 55, e Arthur do Val (Patriota), 34, também aderiram ao TikTok. Dono do canal Mamãe Falei no YouTube, do Val postou vídeos em que aparece com falsos moicanos e sabre de luz em meio a confusão com parlamentares na Alesp (Assembleia Legislativa de São Paulo).
Mas nas campanhas, a descontração e linguagem jovial do político no TikTok podem ser mal recepcionadas, traduzindo-se eleitoralmente em verdadeiros "tiros no pé". Segundo o diretor da Associação Brasileira dos Consultores Políticos no Paraná, Vinicius Nagem, no mundo da política, a plataforma pode ser melhor adaptada por candidatos a vereadores, que conseguem focar nichos.
Ele avalia que os riscos são maiores nas eleições majoritárias (prefeito, senador, governador e presidente da República), com menor chance de vantagem para as campanhas. "Um candidato a vereador, por exemplo, pode implementar discurso para quem gosta de animais, publicar vídeos com cachorro, e se eleger em cima disso. Na eleição para prefeito, o eleitorado é mais amplo e o candidato pode despertar críticas dos que não gostam da postura ou dos mais conservadores", afirma.
Muitos internautas manifestam desconfiança em relação a candidatos que aderiram ao aplicativo chinês. São críticas que vão da "ausência de autenticidade" a frases como "não confie em político que usa TikTok".
No início do mês até o TSE (Tribunal Superior Eleitoral) estreou perfil na rede. Em nota, a corte ressalta a importância do TikTok, afirmando que "o formato da publicação com postagens que possibilitam a inserção de músicas, dublagens e filtros conquistou o público jovem, uma vez que 41% dos usuários têm entre 16 e 24 anos". O perfil é @tsejus.
No primeiro vídeo, o presidente do órgão, ministro Luís Roberto Barroso, 62, adotou linguagem coloquial, o que não é comum ao magistrado. "Estou aqui para mandar mensagem para os jovens. Aliás gostaria de dizer que sou jovem também, só que há muito mais tempo", disse.
No TikTok, os políticos brasileiros ainda têm poucos seguidores quando comparados a celebridades como a cantora Anitta (mais de 8,9 milhões), e influenciadores digitais como Felipe Neto (mais de 8,6 milhões). Mas, na rede chinesa, eles têm uma vantagem: não precisam disputar espaço com o clã Bolsonaro que, por enquanto, não se empolgou com o aplicativo.
O governo de Donald Trump acusou o TikTok de espionagem e ordenou seu bloqueio nos Estados Unidos. A decisão foi temporariamente suspensa no fim de setembro, mas as partes ainda vivem imbróglio. O presidente brasileiro é alinhado ao posicionamento político do republicano.