Caso Marielle: investigação mostra tentativas da Polícia Civil de livrar irmãos Brazão
Chiquinho, Domingos e delegado Rivaldo Barbosa foram presos em investigação
A investigação da Polícia Federal que terminou com a prisão de três suspeitos de atuação nos assassinatos da vereadora do Rio de Janeiro Marielle Franco e do motorista Anderson Gomes mostra que o grupo se movimentou com o intuito de incriminar terceiros e livrar os verdadeiros mandantes. O deputado federal Chiquinho Brazão e o irmão dele e conselheiro do Tribunal de Contas do Estado do Rio (TCE), Domingos Brazão, foram presos suspeitos de serem os mandantes. O ex-chefe da Polícia Civil Rivaldo Barbosa também foi detido suspeito de ter obstruído as investigações.
Rivaldo era chefe da Delegacia de Homicídios quando o atentado foi planejado e se tornou chefe da corporação na véspera das execuções. O ex-policial militar Ronnie Lessa, apontado como o executor dos homicídios, afirmou que após a morte de Marielle teve uma reunião com os irmãos Brazão, ocasião em que eles “teriam revelado que Rivaldo estava cuidando do redirecionamento das investigações”.
Tempos depois, surgiu uma “testemunha-chave”, Rodrigo Ferreira, chamado de Ferreirinha, que afirmou à polícia que o então vereador Marcello Siciliano e o miliciano Orlando Oliveira de Araújo (ou Orlando Curica) eram os responsáveis pela morte de Marielle e de Anderson. Havia uma atuação, segundo a PF, do delegado Giniton Lages, responsável pela investigação na época, e do policial civil Marco Antônio de Barros Pinto.
“A deflexão da investigação para a falsa imputação em face da dupla Marcello Siciliano e Orlando Curicica, por meio da utilização da testemunha Rodrigo Jorge Ferreira, no entanto, foi o ápice das diligências obstrutórias emanadas pela dupla [Giniton e Marco Antônio]”, diz a PF.
Questionado sobre esse redirecionamento da investigação relatado pelos irmãos Brazão em reunião, o próprio Lessa disse que o atribuiu à “entrada em cena” de Siciliano e Orlando Curicica.
Para a polícia, os “reiterados episódios de obstrução da investigação foram esquematizados por Giniton e operacionalizados por Marco Antônio”, sendo ambos os executores “do projeto delineado por Rivaldo”.
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“A posição dos dois na cadeia hierárquica da organização criminosa indica que, apesar de não terem participado do ajuste prévio do homicídio, ambos foram fundamentais para o sucesso da empreitada que garantiu a impunidade do crime até os dias atuais, visto que eram os responsáveis diretos pela apuração nas horas de ouro, fundamentais para qualquer investigação de homicídio”, informa relatório da PF.
A polícia cita que o miliciano Jorge Alberto Moretti, chamado de Beto Bomba, afirmou em áudio enviado a Siciliano que a testemunha Ferreirinha foi “plantada” para redirecionar a investigação para o vereador e para Orlando Curicica.
“Aqui reside uma das tacadas de mestre do grupo criminoso composto pelos Irmãos Brazão e Rivaldo Barbosa. Imputar o delito em tela ao então vereador Marcello Siciliano teria o condão não só de garantir-lhes a impunidade, mas também fulminaria politicamente um dos concorrentes eleitorais da família Brazão nos bairros da Zona Oeste carioca”, pontuou a PF.
Execução longe da Câmara
Em depoimento à Polícia Federal, o ex-policial militar Ronnie Lessa, preso em março de 2019 pela participação nas mortes de Marielle e Anderson, afirmou que Rivaldo exigiu que a vereadora não fosse executada no trajeto de deslocamento para a Câmara do RJ para evitar suspeita de conotação política do crime.
Em delação premiada, Ronnie Lessa declarou que aceitou cometer o crime, pois os irmãos Brazão expressamente afirmaram que o então chefe da Divisão de Homicídios da Polícia Civil do Rio de Janeiro "teria contribuído para preparação do crime, colaborando ativamente na construção do plano de execução e assegurando que não haveria atuação repressiva por parte da Polícia Civil".
"O Rivaldo disse que não poderia ser de outra forma; ele [Domingos Brazão] foi bem firme nisso, foi contundente, então não é não, e não pode porque o Rivaldo não quer. Então, na verdade nós sentimos até bastante firmeza pela magnitude da coisa, tá lidando com o diretor da DH [Delegacia de Homicídio]; se o diretor da DH faz uma exigência dessa, na minha concepção ele já tem uma linha traçada pra desviar o assunto" disse Lessa em trecho da delação que consta do relatório da PF.