Chance de Bolsonaro em 2022 deve ditar alinhamento de Aras na PGR
Aras é acusado pela oposição de alinhamento aos interesses do Palácio do Planalto
Senadores avaliam que a recondução de Augusto Aras para mais dois anos à frente da PGR (Procuradoria-Geral da República) será aprovada com facilidade, e ele não deverá, de imediato, mudar a forma de atuar, principalmente se vir chance de o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) se reeleger em 2022.
Aras é acusado pela oposição de alinhamento aos interesses do Palácio do Planalto, avaliação compartilhada por integrantes da cúpula da PGR.
Para continuar no cargo, o chefe do Ministério Público Federal será sabatinado pela CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) do Senado, em data ainda a ser definida, e precisará do voto de 41 dos 81 senadores no plenário da Casa. A indicação foi publicada no Diário Oficial da União desta quarta-feira (21).
Bolsonaro anunciou em redes sociais nesta terça-feira (20) o envio da mensagem ao Senado sobre a recondução de Aras, cujo mandato se encerra em setembro.
Em nota da Procuradoria, Aras afirmou "compromisso de bem e fielmente cumprir a Constituição e as leis do país". Foi criticado internamente por não falar em independência do Ministério Público.
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A definição veio em meio a pressões enfrentadas tanto por Bolsonaro quanto por Aras, indicado em 2019 fora da lista tríplice elaborada após eleição interna dos procuradores federais. O gesto foi repetido neste ano.
A recondução é bem vista entre os congressistas governistas e de centro, que o consideram cumpridor da Constituição, ter perfil garantista e ser aberto ao diálogo. Dizem que a tendência é que receba voto contrário apenas dos defensores da Operação Lava Jato e da oposição ao governo.
Um dos contrários ao fim da Lava Jato, Alessandro Vieira (Cidadania-SE) chamou Aras de "desastre ambulante". No PT, senadores argumentam que o indicado tem atuado apenas a favor do governo.
Embora integrantes da CPI da Covid esperem que Aras se torne mais independente, se a recondução for confirmada outros senadores consideram que ele não deve mudar sua atuação de forma brusca.
Se se reeleger em 2022, Bolsonaro poderá indicar mais dois ministros para o STF (Supremo Tribunal Federal) em 2023, com as aposentadorias de Ricardo Lewandowski e Rosa Weber. Ao não confrontar o governo, Aras se manteria entre os cotados.
O presidente já declarou que Aras "entra fortemente" na disputa por uma vaga ao Supremo se ele puder indicar um terceiro nome à corte.
O primeiro mandato de Aras acaba em meados de setembro, mas Bolsonaro decidiu anunciar agora a recondução. Em 2015, quando Dilma Rousseff (PT) indicou Rodrigo Janot para mais dois anos na PGR, a presidente enviou a mensagem ao Senado apenas na segunda semana de agosto.
Integrantes da cúpula da PGR viram no calendário antecipado reforço ao apoio ao advogado-geral da União, André Mendonça, escolhido para a vaga aberta no STF com a aposentadoria do ministro Marco Aurélio Mello.
O gesto foi visto também como precaução do Planalto contra qualquer contratempo na tramitação da indicação de Aras no Senado, evitando o risco de uma eventual interinidade no comando da PGR, encarregada de investigações sensíveis que envolvem Bolsonaro e aliados.
O presidente é investigado sob suspeita de prevaricação no caso da compra da vacina indiana Covaxin. Também é alvo de inquérito por suposta interferência no comando da Polícia Federal, cujo prazo foi prorrogado na terça por 90 dias pelo ministro do STF Alexandre de Moraes.
Há ainda os inquéritos das fake news e da quadrilha digital responsável por ataques à democracia na internet. Ambos citam filhos e aliados do presidente.
Em eventual segundo mandato, Aras terá de avaliar o relatório final da CPI da Covid, a ser enviado neste ano à PGR.
O procurador-geral chegou ao comando do Ministério Público Federal há pouco menos de dois anos sob forte polêmica em razão de declarações que fez sobre a Lava Jato. É apontado como responsável pelo desmonte da investigação.
As críticas se intensificaram desde o ano passado em razão de apurações que não tiveram andamento, parte delas referentes à omissão do governo federal no combate à Covid-19.
Foram poucas as ocasiões em sentido contrário, por exemplo quando Aras apresentou uma ação constitucional contra ato do presidente da República.
Isso ocorreu quando o Executivo editou a medida provisória que instituiu o contrato de trabalho Verde e Amarelo, e a PGR pediu a invalidação de dois trechos do texto assinado.
A Procuradoria-Geral da República é obrigada a se manifestar na maioria dos ações que chegam ao STF, independentemente de quem é o autor do processo. Nesses casos, o procurador-geral se manifestou algumas vezes contra a atuação do Executivo.
Isso ocorreu, por exemplo, na ação em que o Governo da Bahia pediu para o STF fixar a competência do estado em adotar medidas complementares às da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) para controlar a disseminação do novo coronavírus em aeroportos.
Em raros momentos, Aras conseguiu aplacar parte das críticas ao promover uma ofensiva contra a parcela da militância bolsonarista que mobilizou manifestações que pediam o fechamento do Congresso e do Supremo.
O procurador-geral pediu abertura de inquérito para investigar os responsáveis pelos atos antidemocráticos e desencadeou, com autorização de Moraes, relator do caso, operação policial contra o núcleo da estrutura organizacional do Aliança pelo Brasil, partido que Bolsonaro tenta criar.
Em um segundo momento, no entanto, após não se entender acerca da apuração com a PF, que defendia o aprofundamento, a PGR pediu o arquivamento perante o STF e o envio de alguns casos para a primeira instância.
Moraes atendeu ao pedido da Procuradoria, mas a surpreendeu: abriu um novo inquérito para apurar a atuação da quadrilha digital na internet.
Outro ponto de alinhamento entre Aras e o Supremo, e que desagradou o bolsonarismo, ocorreu na defesa do inquérito das fake news, que apura a disseminação de notícias falsas e ameaças contra integrantes da corte. Sua antecessora, Raquel Dodge, havia defendido o arquivamento do caso.
A apuração foi instaurada de ofício pelo então presidente do STF, Dias Toffoli, sem pedido da PGR. A medida irritou integrantes do Ministério Público, que viram na decisão uma violação às regras processuais de que a Justiça só pode atuar quando provocada.
Aras, no entanto, mudou a posição da Procuradoria sobre o tema. Exigiu que a investigação siga uma série de parâmetros, mas se posicionou favorável à continuidade das apurações.
No fim, a tese prevaleceu e, um ano e dois meses depois de ser instaurado, o plenário do STF validou a instauração do inquérito.