Chapa entre Lula e Alckmin tem arestas a serem aparadas; conheça os empecilhos da negociação
A pauta econômica do PT é mais uma aresta que precisa ser aparada para a concretização da chapa entre Lula e Alckmin
A pauta econômica do PT é mais uma aresta que precisa ser aparada para a concretização da chapa entre o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o ex-governador de São Paulo Geraldo Alckmin, em articulação desde o ano passado.
O paulista demonstrou preocupação com a proposta de revisar a reforma trabalhista de 2017, defendida por petistas na semana passada. Antigos aliados de Alckmin têm classificado a ideia do PT como um “retrocesso”. Presidente do partido, a deputada Gleisi Hoffmann afirma que a sigla deve ser enfática no discurso contra a reforma e o teto de gastos, mesmo que isso assuste potenciais aliados, como o próprio ex-governador.
A nova ponta a ser arredondada para a aliança entre o petista e o ex-tucano se soma a resistências a Alckmin em alas do PT. O ex-presidente do partido Rui Falcão e o presidente estadual em São Paulo, Luiz Marinho, são alguns nomes contrários ao acerto — internamente, porém, Lula não terá grande dificuldade em levar o partido para a aliança.
Na semana passada, Lula parabenizou, em uma rede social, o governo espanhol por reverter pontos da reforma trabalhista de 2012 — inspiração para mudanças legislativas aprovadas por Michel Temer em 2017. A Espanha restringiu o tempo de contratos temporários para um ano e equiparou o salário de terceirizados ao de trabalhadores sindicalizados. A sinalização incomodou políticos de partidos de centro, que poderiam ser atraídos para o projeto petista, ainda que só no segundo turno, mas que não apoiam a proposta.
Leia também
• PSD desiste de lançar Alckmin em São Paulo; ex-tucano almeja vaga de vice de Lula
• Lula aguarda aliados para anunciar chapa para disputa presidencial até março
• Chapa Lula-Alckmin reaviva debate sobre candidatura do PSOL à Presidência
Durante encontro com o deputado Paulinho da Força (SP), presidente do Solidariedade, ontem, Alckmin revelou apreensão com a revogação da reforma trabalhista e lembrou que há preocupação no mercado financeiro com a possibilidade de alteração do projeto. Segundo Paulinho, Alckmin quis saber a avaliação das centrais sindicais sobre o assunto.
"Afirmei ao Alckmin que não foi tratado com Lula de revogar a reforma e nem de voltar o imposto sindical", disse Paulinho.
Na campanha presidencial de 2018, Alckmin afirmou que a reforma trabalhista “modernizou as relações de trabalho” e se comprometeu a não mudar o texto. Na época, ele chegou a ser pressionado por Paulinho a propor a volta do imposto sindical em troca de apoio do Solidariedade, mas não cedeu. Então no PSDB, o ex-governador propôs só rever pontos sobre trabalho intermitente e grávidas em ambientes insalubres.
As declarações de Lula e de setores do PT contra a reforma trabalhista foram mal recebidas por antigos aliados de Alckmin. Enquanto aguardam que o ex-governador explique qual posição irá tomar sobre a possibilidade de ser vice do petista, dizem que se Lula quer mesmo acenar ao centro, não faz sentido fazer propostas que afugentam este campo.
"A reforma trabalhista é uma conquista. Mudar seria um tiro no pé. Isso não é solução para o país", afirmou o ex-presidente do PSDB de São Paulo Antonio Carlos Pannunzio, que avalia a possibilidade de deixar o partido assim como fizeram outros aliados de Alckmin.
No que depender de Gleisi, o discurso de Lula e do PT não deve mudar. Além da revisão da reforma trabalhista, políticos de centro se incomodaram com a defesa que a parlamentar fez da revogação da privatização de empresas de energia na Argentina. Embora não tenha apresentado oficialmente um plano para a economia, Lula tem criticado, em discursos recentes, o teto de gastos e a atual política de preços da Petrobras.
Para Gleisi, a eleição deste ano é diferente do pleito de 2002. Enquanto a primeira eleição de Lula foi de composição política, esta será de posicionamento ideológico, na opinião da dirigente. Gleisi afirma que o partido tem que dizer claramente o seu ponto de vista sobre a economia, mesmo que isso afugente possíveis aliados, como Alckmin:
"Ele conhece o que pensamos e o que defendemos, nunca escondemos nossas posições", diz Gleisi.
Segundo ela, o PT quer mostrar, desde já, que vai revogar o teto de gastos, a política de preços da Petrobras e a reforma trabalhista:
"Não tem necessidade de carta ao povo brasileiro, as pessoas já conhecem o Lula", afirma Gleisi, que completa: "A única coisa que não vamos fazer é quebrar contratos, como o Bolsonaro fez com os precatórios. O resto nós vamos fazer. E não tem mimimi do mercado. Um país que não tem dívida externa, que tem este mercado consumidor não pode ter o povo com fome e sem renda."
Nos próximos dias, economistas petistas começam a desenhar o que deve ser o plano econômico de Lula, como mostrou o colunista Lauro Jardim. Eles vão trabalhar em cima de um roteiro elaborado pela Fundação Perseu Abramo no ano passado e conduzido por Aloizio Mercadante. O documento já trazia duras críticas ao teto de gastos e propunha, entre outras coisas, a tributação dos 1% mais ricos, ponto também defendido pelo ex-ministro Guido Mantega, em artigo publicado pelo jornal “Folha de S.Paulo”.
Além de afinar o discurso econômico para garantir a aliança com Lula, Alckmin ainda precisa decidir a qual partido vai se filiar. No encontro de ontem, Paulinho voltou a oferecer o Solidariedade como plano B. O convite já havia sido feito em dezembro, mas o ex-governador tem dado preferência ao PSB. O acerto entre socialistas e PT, no entanto, depende de arranjos regionais e da discussão da federação.