Com interina prestes a completar um mês no posto, Lula deve voltar a discutir escolha de novo PGR
Elizeta Ramos tirou aliados de Aras de cargos estratégicos
Procuradora-geral da República em exercício, Elizeta Ramos completa um mês na interinidade do cargo na próxima sexta-feira no momento em que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, recuperado das cirurgias no quadril e nas pálpebras, volta a se debruçar sobre a escolha do titular do posto. A interina já tomou medidas que, em tese, podem agradar o atual governo. Elizeta desalojou aliados do antecessor Augusto Aras de postos-chave da PGR e optou por uma saída administrativa que eleva as chances de investigações contra o ex-presidente Jair Bolsonaro serem aceleradas.
A principal mudança promovida foi a substituição da subprocuradora-geral Lindôra Araújo no posto de vice-procuradora-geral da República. Agora, este cargo passou a ser ocupado pela também subprocuradora-geral Ana Borges, a quem competirá cuidar de todos os casos da esfera criminal. Coube a ela o parecer concordando com a operação da Polícia Federal no caso de espionagem na Agência Brasileira de Inteligência (Abin), revelado pelo Globo.
Elizeta também decidiu que as investigações envolvendo Bolsonaro estarão sob o guarda-chuva do subprocurador-geral Carlos Frederico. É que, embora a matéria criminal fique na vice-presidência, tudo o que envolve o 8 de janeiro e milícias digitais, em uma temática mais ampla, foi declinado para o escopo de Frederico, até mesmo as apurações envolvendo o fechamento de rodovias no final de 2022, de acordo com interlocutores da PGR ouvidos pela reportagem.
No último dia 19 a PGR, em parecer de Carlos Frederico, defendeu que a Polícia Federal investigue os R$ 17 milhões repassados via Pix a Bolsonaro, a título de doação para o pagamento de multas eleitorais. Na semana passada, a procuradoria também enviou para homologação os primeiros acordos firmados com os réus do 8 de janeiro.
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No Planalto, auxiliares do presidente Lula consideram que a Elizeta tem seguido o script esperado para quem ocupa o cargo de forma interina. Há um entendimento que ela tem sido discreta. Nenhuma das iniciativas tomadas até agora provocaram descontentamento do Planalto. Isso não significa, avaliam integrantes do governo, que a sua chance de ser efetivada no cargo tenha crescido.
A expectativa é que Lula, que voltou a despachar no Palácio do Planalto na segunda-feira, retome as discussões sobre a escolha do novo procurador-geral nesta semana. Em todas as suas administrações, esta é a primeira vez que o petista demora tanto tempo para escolher um nome para o comando da PGR, órgão estratégico por ser responsável, entre várias atribuições, pelas investigações envolvendo o chefe do Executivo.
STF vê posições “mais claras”
No Supremo, local onde se dá principalmente a atuação do procurador-geral da República, o desempenho da interina tem sido bem avaliado. Três ministros da Corte ouvidos de forma reservada dizem que as posições adotadas agora são "mais claras" e apontam que a procuradora-geral tem dado um andamento mais ágil nos casos em que está envolvida — a “discrição” também é citada, assim como no Planalto. Para esses magistrados, o tom sóbrio da chefe interina da PGR foi dado no momento de sua estreia, a posse do novo presidente do STF, ministro Luís Roberto Barroso, em 28 de setembro.
Em seu discurso, ela afirmou que Barroso pode contar com um Ministério Público que "age preventivamente" e de forma "socialmente efetiva", que "se traduz no combate a crimes que extraem recursos que deveriam ser destinados à educação, saúde, segurança, que se traduz na fiscalização de leis que promovam equidade de gênero nas relações políticas e trabalhistas”.
Ao longo do último mês, a PGR apresentou 621 manifestações ao Supremo, entre pareceres, ajuizamento de ações, agravos internos, pedidos de arquivamento e recursos.
Entre esses posicionamentos estão um pedido de preferência para reinclusão em calendário de julgamento do STF de recurso que discute a concessão de licença-maternidade à mãe não gestante, em união estável homoafetiva; um parecer contrário à emenda constitucional que dá anistia a partidos políticos que não destinaram recursos mínimos a mulheres, negros e programas de fomento à participação feminina nas últimas eleições; e a ação de inconstitucionalidade contra uma lei de São Paulo que homenageou personagem da ditadura militar brasileira ao batizar via pública com seu nome.
Em outro movimento que atingiu um aliado de Aras, Elizeta trocou o comando da 5º Câmara, responsável por cuidar de casos de corrupção e lavagem de dinheiro de políticos. Ela indicou o subprocurador Alexandre Camanho para o posto antes ocupado por Ronaldo Albo, próximo ao ex-procurador-geral. Como mostrou a colunista do Globo Malu Gaspar, os colegas de Albo pediram seu afastamento do cargo após ele reduzir em R$ 6,8 bilhões a multa a ser paga pelo grupo J&F no seu acordo de leniência.
Relatório da CPI
Nesta terça-feira, ela presidiu sua primeira sessão no Conselho Nacional Superior do Ministério Público (CNMP) e destacou a atuação do Ministério Público para conter a letalidade policial.
Ela também recebeu o relatório da CPI do 8 de Janeiro das mãos da senadora Eliziane Gama (PSD-MA), em que foi pedido o indiciamento de Bolsonaro. Caberá à PGR também definir o destino que será dado aos pedidos feitos pela CPI. Aos senadores, a PGR interina prometeu que o órgão examinará os documentos com celeridade. O responsável pelo tema é o subprocurador Carlos Frederico.
Além da PGR interina, pelos menos quatro nomes despontaram como candidatos. Dois deles têm sido tratados como favoritos: os vice-procuradores-gerais Paulo Gonet e Antonio Carlos Bigonha. Ambos já foram recebidos por Lula. Gonet conta com o apoio de dois ministros do Supremo Tribunal Federal: Gilmar Mendes e Alexandre de Moraes. Bigonha, por sua vez, é o preferido de lideranças do PT. Assim como Elizeta Ramos, Aurélio Virgílio Veiga Rios e Luiz Augusto dos Santos Lima correm por fora na briga pela cadeira.