Congresso tem 14 projetos para derrubar canetada furo-teto salarial de Bolsonaro
Segundo o Ministério da Economia, R$ 301 milhões são cortados por ano da folha de pagamento da elite do funcionalismo no Executivo federal
Após o governo Jair Bolsonaro editar uma portaria que libera uma espécie de teto salarial duplo a servidores públicos, beneficiando o próprio presidente e ministros, 14 projetos de decreto legislativo foram apresentados por congressistas para derrubar a medida.
A portaria vai derrubar em cerca de 22% a economia feita pelo governo ao cortar as remunerações do funcionalismo seguindo o limite estipulado pela Constituição.
A nova regra, válida a partir deste mês, autorizou que o teto seja contabilizado separadamente para cada vínculo de servidores aposentados e militares inativos que retornaram ao serviço público.
Segundo o Ministério da Economia, R$ 301 milhões são cortados por ano da folha de pagamento da elite do funcionalismo no Executivo federal para que os salários não superem R$ 39,3 mil.
A mudança promovida pela portaria terá impacto de R$ 66 milhões, segundo cálculos do governo, reduzindo a economia anual em quase um quarto, para aproximadamente R$ 235 milhões. O número pode sofrer variações a depender da movimentação de servidores.
Para se ter uma ideia da dimensão da medida, se o Congresso aprovar uma proposta que cria mais restrições para cumprimento do teto remuneratório, a economia adicional estimada pelo governo será de apenas R$ 23,7 milhões ao ano no Executivo federal, cerca de um terço do custo gerado pela portaria do teto duplo. O texto está travado na Câmara há mais de quatro anos.
O relator do projeto, deputado Rubens Bueno (Cidadania-PR), também é autor de um dos textos protocolados neste mês para derrubar a portaria do governo.
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Para ele, a medida avança sobre a atribuição do Congresso ao criar regras para aplicação do teto.
"Além de ferir o princípio da moralidade administrativa, [a portaria] está claramente em desacordo com a Constituição, que estabelece que deve ser aplicado o teto à soma total dos proventos de inatividade, inclusive quando decorrentes da acumulação de cargos ou empregos públicos", afirmou na justificativa da proposta.
Para a deputada Fernanda Melchionna (PSOL-RS), também autora de um projeto para cancelar a portaria, o governo concede privilégios a uma parcela de pessoas que acumula remunerações em um momento de crise provocada pela pandemia. "É vergonhoso e imoral", disse.
Os presidentes da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), ainda não sinalizaram se colocarão as medidas em votação.
Até abril, o chamado abate-teto era aplicado sobre o contracheque de 4.900 pessoas. Desse total, cerca de mil se enquadram na nova liberação que duplica o teto.
Esse é o caso de membros da cúpula do governo, que poderão receber a totalidade do salário pela função no Executivo e da remuneração como militares inativos.
Os ganhos serão de até 69%, com pagamentos mensais, que, a depender da autoridade, poderão ultrapassar R$ 66 mil.
Bolsonaro recebe R$ 30,9 mil pela função de presidente e tem mais R$ 10,7 mil em outros benefícios, mas é feito um corte de R$ 2.300 para que o teto seja obedecido.
Com a nova norma, a remuneração bruta do presidente deve passar de R$ 39,3 mil para R$ 41,6 mil, uma alta de 6%.
O vice-presidente Hamilton Mourão deve deixar de ter um abatimento na remuneração bruta feito atualmente, de R$ 24,3 mil, para respeitar o teto. Com isso, o valor passa de R$ 39,3 mil para R$ 63,5 mil, diferença de 62%.
Entre os ministros militares, o maior salto no salário fica com o chefe da Casa Civil, Luiz Eduardo Ramos. O governo deve deixar de fazer um desconto mensal de R$ 27 mil, levando a remuneração a R$ 66,4 mil, a alta de 69%.
Na lista, também aparece o ministro da Defesa, Walter Braga Netto, com aumento de R$ 22,8 mil (alta de 58%). O ministro do Gabinete de Segurança Institucional, Augusto Heleno, deve passar a receber um adicional de R$ 23,8 mil (acréscimo de 60%).
Há ainda o ministro da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações, Marcos Pontes, com elevação de R$ 17,1 mil (aumento de 44%).
O Ministério da Economia afirma que a portaria adequa o cálculo do teto a decisões do STF (Supremo Tribunal Federal) e do TCU (Tribunal de Contas da União).
Segundo a pasta, a aplicação desses entendimentos foi aprovada pela AGU (Advocacia-Geral da União) em dezembro de 2020.
De acordo com a Economia, das mil pessoas que serão beneficiadas pela regra, mais de 70% são médicos e professores. O teto duplo vale para profissionais dessas áreas que acumulam funções.
O subprocurador-geral Lucas Rocha Furtado, do Ministério Público junto ao TCU, protocolou representação para que seja apurada a adequação da portaria.
"A edição da portaria extrapolou os contornos da jurisprudência firmada pelo STF, que diz respeito a vínculos remuneratórios regularmente acumulados por servidores públicos civis, não havendo margem para se deduzir que a regra possa ou deva ser igualmente observada em situações envolvendo acumulação de vínculos remuneratórios por militares", afirmou o procurador.
As críticas ao aumento desse gasto vêm em um momento em que o governo trabalha pela aprovação da reforma administrativa, que reduz salários de entrada e acaba com a estabilidade para a maior parte do funcionalismo.
A proposta está prevista para ser votada na CCJ (Comissão de Constituição e Justiça da Câmara) nesta quinta-feira (20). Depois, o texto seguirá para uma comissão especial.