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Conselho vai recorrer da decisão que suspendeu resolução de aborto legal em crianças e adolescentes

Resolução do Conanda teve oposição de pasta dos Direitos Humanos e de aliados do ex-presidente, que foram à Justiça

Abuso infantilAbuso infantil - Foto: Freepik

O Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda) vai recorrer da decisão da Justiça Federal de Brasília, que suspendeu os efeitos da resolução que regulamenta o aborto legal em crianças e adolescentes.

Na última segunda-feira, o Conanda, vinculado ao Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania, aprovou o documento em assembleia extraordinária, na qual os 15 representantes da sociedade civil votaram a favor e os 13 integrantes do governo foram contrários. No dia seguinte, após pedido da senadora Damares Alves (Republicanos-DF), a resolução foi revogada.

"Vamos recorrer. Lutaremos de todas as formas para o texto vigorar", diz a presidente do Conanda, Marina de Pol Poniwas, para quem o “governo quer atrasar o processo”.

A resolução visa garantir atendimento humanizado às vítimas com direito ao procedimento, conforme previsto pela legislação: em casos de gravidez decorrente de violência sexual, risco de vida à gestante e quando o feto apresenta anencefalia.

O texto destaca que, identificada a situação de aborto legal e manifestada a vontade de interromper a gravidez, a criança e a adolescente devem ser encaminhadas aos serviços de saúde pelo órgão do Sistema de Garantia dos Direitos da Criança e do Adolescente para realizar o aborto.

Poniwas argumenta que “a resolução não inova em nada, apenas traduz e detalha o que já está previsto” na legislação: "A resolução é um passo a passo para orientar o sistema. Nosso papel, com esse documento, é traduzir, detalhar e explicar o que já está previsto na legislação. Não vamos criar uma lei e nem inovar em nada. Não temos esse poder".

Diferentes posições
Ao defender a suspensão do texto, Damares alegou que houve atropelo regimental durante a votação. Ao acolher os argumentos da senadora, o juiz federal Leonardo Tocchetto Pauperio disse que a negativa ao pedido de vista durante a assembleia violou o devido processo legal administrativo e agiu de forma “contrária à legalidade e à segurança jurídica que devem ser inerentes aos atos da administração”.

Na assembleia, integrantes do governo Lula entenderam que a medida, com a redação atual, deveria ser regulamentada por lei aprovada pelo Congresso. Segundo o MDHC, comandado pela ministra Macaé Evaristo, os representantes questionaram os termos da resolução e solicitaram um pedido de vista para análise mais detalhada da proposta.

A pasta requisitou um parecer da consultoria jurídica do ministério, que “indicou, entre outros aspectos, que a minuta de resolução apresentava definições que só poderiam ser dispostas em leis — a serem aprovadas pelo Congresso Nacional, indicando a necessidade de aperfeiçoamento e revisão de texto, garantindo maior alinhamento ao arcabouço legal brasileiro”.

Apesar das solicitações, o pedido de vista apresentado foi rejeitado pelo plenário do Conanda e o texto chegou a ser aprovado, mas foi suspenso no dia seguinte.

Em nota, o “Nem Presa Nem Morta”, campanha que defende a descriminalização do aborto no Brasil, e o Coletivo Feminista Sexualidade e Saúde, com foco na atenção primária à saúde de mulheres, afirmaram que “a atitude do governo foi constrangedora”.

— É um tema polêmico e debatido há anos. Parece que o governo ainda não tem disposição para entrar nesse debate — diz Laura Molinari, coordenadora da campanha.

A advogada Amanda Nunes, do Instituto de Bioética (Anis), também defendeu que a norma busca dar clareza ao que já está na lei.

— A resolução não tem poder de lei, mas, sim, força normativa. Ela é infralegal, baseada na legislação. O documento do Conanda busca dar maior clareza e organizar o que está na lei sobre aborto e saúde para crianças e adolescentes. Portanto, caso o documento entre em vigor, os órgãos são obrigados a cumprir o que está previsto no texto — detalhou a advogada.

Crítica de parlamentares
O texto também sofreu pressão e críticas de parlamentares de oposição, que defendem a agenda conservadora. Após a aprovação da resolução, a deputada Carla Zambelli (PL) defendeu que o texto é “perverso, antidemocrático e anticientífico”.

A deputada Julia Zanatta (PL-SC) chegou a apresentar um projeto para alterar a lei que cria o Conanda, proibindo-o de discutir o tema do aborto em crianças e adolescentes. Gustavo Gayer (PL-GO), por sua vez, apresentou moção de repúdio contra o conselho.

Na ocasião, o deputado federal Carlos Jordy (PL) anunciou que a oposição iria protocolar um Projeto de Decreto Legislativo (PDL) para sustar a resolução, que classificou como “absurdo do desgoverno Lula”, apesar da oposição do governo à aprovação.

O Conanda é o órgão deliberativo máximo em políticas de proteção e promoção dos direitos de crianças e adolescentes no Brasil e é o responsável por fiscalizar e regulamentar políticas públicas, conforme o Estatuto da Criança e Adolescente (ECA).

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