Cotado à disputa da presidência, Tarcísio prevê mutirão de obras e reforço na propaganda
Nesta terça, deputados devem aprovar a possibilidade de remanejar parte dos recursos obrigatórios da Educação para bancar obras e custeio na Saúde
A proposta orçamentária para 2025 encaminhada pelo governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), aumenta a verba de propaganda oficial e ensaia mutirão de obras no penúltimo ano de mandato, parte delas bancadas por meio de parcerias com a iniciativa privada, ao mesmo tempo em que sinaliza para cortes em programas considerados sensíveis por especialistas, como o combate a enchentes e a incêndios no interior do estado.
O debate deve acelerar a partir desta semana na Assembleia Legislativa do Estado (Alesp), uma vez que o relator, Alex Madureira (PL), já foi designado na Comissão de Finanças, Orçamento e Planejamento com a tarefa de analisar as mais de 29 mil emendas apresentadas ao projeto.
Nesta terça (12), o governo busca ainda a aprovação da chamada PEC do Manejo, que abre a possibilidade de o Executivo destinar parte dos recursos obrigatórios da educação para a saúde.
O planejamento financeiro para o próximo ano envolve R$ 372 bilhões, R$ 44,3 bilhões a mais do que o autorizado para 2024. O governo Tarcísio pretende aumentar em quase 20% os recursos destinados à Saúde para bancar, entre outros projetos, a construção de quatro hospitais nas cidades de Itapetininga, Franca, Birigui e São Paulo, com o Complexo Hospitalar da Região Sul.
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A Secretaria de Parcerias em Investimentos, responsável pelas concessões, também foi contemplada na proposta com uma alta de 128%, e a pasta de Habitação, de outros 76,5%.
Em outubro, quando a proposta foi encaminhada à Alesp, o governo paulista alardeou uma previsão recorde de investimentos de R$ 33,5 bilhões em 2025. O plano é elevar o gasto com obras no metrô e de duplicação de estradas.
Cotado como presidenciável em 2026, Tarcísio quer ainda como marca para campanhas futuras as obras do Rodoanel Norte e do Trem Intercidades, que liga a capital a Campinas, além dos contornos da Rodovia dos Tamoios e a PPP de requalificação do Centro Histórico de São Paulo, com o acréscimo da transferência da sede administrativa do governo da Zona Sul para o bairro Campos Elíseos.
André Marques, coordenador do Centro de Gestão e Políticas Públicas do Insper, explica que o orçamento funciona como uma “carta de intenções”, porque existe a possibilidade de remanejo de verbas entre secretarias, ações e programas ao longo do ano e nem sempre as estimativas de receita se concretizam na prática.
A análise dos investimentos da gestão paulista, associada ainda a um crescimento de 133% nos recursos da pasta de Comunicação, por onde circula o dinheiro da propaganda, sugere que Tarcísio já poderia estar pensando no gasto público sob uma perspectiva eleitoral.
— Vemos de uma maneira relativamente regular os governos gastando menos, segurando um pouco mais o orçamento no primeiro e no segundo ano, quando acontecem os superávits mais importantes, e descarregando os gastos no terceiro e no quarto ano. É uma forma de deixar aquelas intervenções mais presentes na cabeça do eleitor e, consequentemente, de aumentar a probabilidade do voto — explica.
Em um nível mais detalhado, Marques chama a atenção ainda para algumas sinalizações controversas do governo, como o recuo de R$ 330 mil nas verbas da operação “São Paulo Sem Fogo”, de combate a incêndios florestais, o equivalente a 10%, e de R$ 55,6 milhões, pouco mais de 15%, para a implantação de sistemas de drenagem e combate a enchentes.
O estado de São Paulo enfrentou crises recentes nos dois cenários, com alta nos focos incêndios no segundo semestre e a tragédia de São Sebastião, no litoral paulista, em 2023.
A Secretaria da Fazenda e Planejamento declarou, por meio de nota, que os programas de combate a incêndios e a enchentes envolvem outros órgãos além da Secretaria de Meio Ambiente, como Corpo de Bombeiros e Defesa Civil, que investiu “mais de R$ 210 milhões em ações de prevenção, mitigação e enfrentamento de eventos climáticos extremos”, incluindo ações consideradas de longa duração ou permanentes, como compra de equipamentos, treinamento de equipes e obras de contenção.
Sobre a verba de Comunicação, justificou que será usada para “continuidade e expansão de campanhas de orientação e conscientização da população, como as de combate à violência contra a mulher, incentivo à doação de órgãos, prevenção ao câncer, combate à dengue, campanha do agasalho, além das ações de prestação de contas”.
Caso tenha o nome confirmado como candidato à presidência da República, o governador paulista precisa se descompatibilizar de forma definitiva até abril de 2026. Ou seja, restariam pouco mais de 16 meses de mandato para colher dividendos políticos no cargo. Tarcísio não precisaria deixar o posto caso opte por disputar a reeleição em São Paulo. Até lá, necessita ainda decidir o seu destino partidário. Antes praticamente acertado com o PL de Valdemar Costa Neto, o governador do Republicanos pode desistir da filiação, segundo conversas nos bastidores.
Tarcísio é o favorito hoje no meio político para assumir o espólio do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL); este, contudo, ainda mantém esperanças de reverter a inelegibilidade na Justiça.
Outros nomes bem posicionados politicamente na direita são os governadores de Goiás, Ronaldo Caiado (União Brasil), do Paraná, Ratinho Júnior (PSD), e de Minas Gerais, Romeu Zema (Novo), e fala-se também na ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro (PL) num cenário sem o marido. O empresário Pablo Marçal (PRTB), terceiro colocado nas eleições pela prefeitura da capital paulista, também planeja concorrer em 2026.
Como mostrou o Globo, as eleições municipais de 2024 evidenciaram mais uma vez a potência do uso da máquina em angariar votos e apoios, com o índice de reeleição atingindo o patamar mais alto da história, de 82%.
Na capital paulista, por exemplo, o prefeito Ricardo Nunes (MDB), reconduzido ao cargo com apoio do próprio Tarcísio, recebeu críticas de adversários pelo volume de obras e entregas na reta final do mandato, concentrando ainda as despesas em contratos emergenciais que superaram R$ 5,5 bilhões na sua gestão.
Na contramão da expansão dos recursos do estado, pastas voltadas a minorias, como a Secretaria de Políticas para a Mulher e a dos Direitos da Pessoa com Deficiência, que já contam com orçamentos mais escassos, tiveram proposta de corte de 60% e 4,6%, respectivamente.
A Fazenda alega que os orçamentos previstos para as pastas mantêm os valores de 2024 considerando o comparativo entre propostas orçamentárias, antes das emendas dos deputados (neste caso, o Globo apurou que os recuos são de 7,1% e 3,9%), e que esse tipo de política é executada de forma transversal dentro do governo, com programas sendo financiados por outros órgãos administrativos.
Outro ponto que pode gerar ruído mesmo na base aliada do governo Tarcísio é a previsão de gasto de R$ 2,2 bilhões na Secretaria de Governo, comandada por Gilberto Kassab (PSD). Sob condição de anonimato, parlamentares interpretam o recurso como uma “moeda de troca” do cacique partidário com as prefeituras na articulação política. O PSD foi o partido que mais ganhou espaço em São Paulo nas eleições municipais, o que gerou insatisfação em siglas como Progressistas, Republicanos e União Brasil.
O projeto de lei anterior encaminhado pelo executivo previa R$ 1,62 bilhão para a secretaria de Kassab em 2024. Deste número, R$ 1 bilhão seria destinado a transferências para municípios, sobretudo por meio de parcerias e convênios com as prefeituras, mas a quantia foi alterada para meros R$ 36 milhões na Alesp. O Portal da Transparência mostra, no entanto, que a dotação foi atualizada para R$ 906,9 milhões ao longo do ano, além de abrir crédito de R$ 11,4 milhões para aquisição de materiais e equipamentos, aproximando-se dos valores originais.
PEC do Manejo
No caso da educação, a previsão orçamentária enviada pelo governo Tarcísio para 2025 é de R$ 32,8 bilhões, com reajuste de 2,7%. Esse número ainda pode desandar para a tesourada, uma vez que o governo se movimenta para aprovar uma proposta de emenda à constituição que permite remanejar parte dos recursos obrigatórios da educação para a saúde.
O percentual que hoje é de 30% da receita líquida passaria a ser de 25%, flexibilizando os 5% restantes. A matéria tem rendido protestos de estudantes e professores.
O líder do governo na Alesp, deputado Gilmaci Santos (Republicanos), diz que a intenção é votar a PEC do Manejo, em primeiro turno, na próxima terça-feira (12), e encerrar o assunto possivelmente na semana seguinte, próximo do dia 20.
A PEC foi aprovada em agosto na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), mas não foi pautada durante as eleições municipais, segundo ele, por acordo entre os parlamentares, que estavam dedicados às campanhas ou mesmo concorrendo pelas prefeituras.
— Não está faltando dinheiro para a educação e também não é justo, por exemplo, a educação ter 30% e a saúde, 12%. Esses 5% vão fazer muita diferença na saúde — argumenta Santos.
O discurso do governo é de que o envelhecimento da população e a queda na população de crianças justificaria a mudança, que atinge cerca de R$ 10 bilhões. A oposição, por outro lado, alega que o incremento no orçamento da saúde poderia se originar de outras fontes, como um pente fino na desoneração fiscal do estado, prevista em R$ 76,5 bilhões em 2025.
— No ano passado, o governo colocou que faria uma redução nas renúncias fiscais. Ela poderia gerar para o estado em torno de R$ 20 bilhões, o dobro do que ele está prevendo com o corte na educação — alega o deputado Luiz Claudio Marcolino (PT), que representa a bancada na vice-presidência da Comissão de Finanças.
Segundo ele, essa revisão também poderia ajudar a acertar as contas dos municípios, considerando que parte do recolhimento de impostos que deixam de ser cobrados das empresas, como o ICMS, deveria ser transferido às prefeituras. Sobre o plano de obras de Tarcísio, Marcolino pondera que algumas delas, como o Rodoanel e o Trem Intercidades, podem não ser boas escadas para uma disputa presidencial contra o presidente Lula (PT) pelo fato de que tiveram apoio do governo federal, por meio de empréstimos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).