"Cotão da Saúde": saiba como funciona a distribuição dos recursos do SUS entre parlamentares
Dinheiro do principal fundo de saúde do país tem sido usado pelo governo Bolsonaro para contemplar aliados políticos
Apelidada de "Cotão da Saúde", a estrutura montada pelo governo de Jair Bolsonaro para angariar apoio político por meio da distribuição de recursos do Fundo Nacional de Saúde (FNS) movimentou R$ 7,5 bilhões ao longo de 2021. Como revelou o Globo, a cifra foi enviada a municípios escolhidos por parlamentares aliados do Palácio do Planalto, que privilegiaram seus redutos eleitorais em vez de critérios técnicos.
Caciques do Centrão consultam o Ministério da Saúde para saber o volume de recursos que está disponível no orçamento do FNS. Em 2021, 8,5% do que foi distribuído pelo fundo atendeu a interesses políticos.
De acordo com o valor, definem quanto cada bancada partidária poderá indicar. Cabe aos líderes dessas siglas aliadas distribuir uma cota individual a cada deputado e senador do grupo, que a partir daí escolhem as cidades para onde o dinheiro deve ir, privilegiando seus redutos eleitorais. Em troca, se comprometem a votar no Congresso de acordo com interesses do Planalto. A repartição de recursos do SUS entre os parlamentares acontece algumas vezes durante o ano, de acordo com definições orçamentárias do governo. Em geral, o líder distribui cotas maiores do fundo para os parlamentares que costumam votar mais alinhados ao governo, além de reservar uma fatia para si.
Leia também
• Saiba qual é a empresa de satélite que Musk quer apresentar para Bolsonaro nesta sexta (20)
• Bolsonaro promete empenho pessoal na campanha de Anderson Ferreira
• Sistemas do Ministério da Saúde começam a ser restabelecidos
Assim que cada parlamentar define os municípios, eles encaminham um ofício ao relator-geral do Orçamento detalhando como e para onde os repasses devem ser feitos. O relator, por sua vez, encaminha os ofícios ao Ministério da Saúde. Cabe ao ministro Marcelo Queiroga publicar no Diário Oficial da União as ordens de pagamento para cada prefeitura.
De acordo com os relatos dos parlamentares, a cúpula do Centrão não interfere na distribuição interna dos partidos, mas pode barrar a liberação do recurso caso algum parlamentar que não esteja alinhado ao Palácio do Planalto seja contemplado.
O ministro da Saúde também pode recusar o pagamento, ou mesmo mandar empenhar o recurso e depois cancelar o empenho, caso encontre algum indício de irregularidade. Parlamentares ouvidos pelo Globo, no entanto, dizem que são raros os casos de rejeição das propostas.
A destinação de emendas por meio do FNS ocorre, em sua maioria, numa modalidade conhecida como "transferência fundo a fundo". Funciona assim: o dinheiro do Orçamento vai para o fundo, que, por sua vez, envia diretamente para um fundo estadual ou municipal de saúde. A verba parlamentar indicada por deputados e senadores se mistura com outras fontes de recursos, dificultando assim a identificação de como foi gasta na ponta.
Além disso, o FNS se tornou atrativo para parlamentares em função do seu processo de tramitação. Essa modalidade de transferência também permite que o dinheiro seja usado de forma mais célere, já que sai da conta da união diretamente para contas bancárias das prefeituras.
Segundo especialistas, ao "terceirizar" a distribuição de parte dos recursos públicos para indicações de parlamentares, o governo abre mão de realizar investimentos em políticas públicas de saúde.