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"Decisões de Toffoli partem de premissas não verdadeiras", diz procurador do acordo com a J&F

Anselmo Lopes afirma que proposta de firmar compromisso com o MPF partiu da própria empresa e nega coação

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Ex-coordenador da força-tarefa da Greenfield, que apurou fraudes nos principais fundos de pensão do país, o procurador Anselmo Lopes afirma que o ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal (STF), acreditou em “premissas não verdadeiras” ao anular a multa de R$ 10,3 bilhões que a J&F aceitou pagar em seu acordo de leniência.

A decisão do ministro acatou um pedido da empresa, que alega, dentre outros pontos, ter sido coagida a assinar o acordo. Segundo Lopes, contudo, foram os próprios executivos que tiveram a iniciativa de colaborar com as investigações, temendo possíveis consequências futuras, como a impossibilidade de receber recursos públicos.

A J&F alega ter sido alvo de coação por parte do MPF para celebrar o acordo de leniência. Isso aconteceu?
Evidentemente que não. Eu até fiz uma representação criminal para apurar possível calúnia por parte do Francisco de Assis (advogado da J&F) depois disso. Partiu deles (da empresa) a intenção de fazer o acordo de leniência.

Há registros para mostrar que de fato partiu deles a intenção de fazer o acordo?
A verdade é que era interesse deles fazer o acordo de leniência. O MPF tinha foco principal em duas coisas: reparar o dano e buscar provas para outros casos. A PGR, por exemplo, queria ver o envolvimento de parlamentares (nas investigações). Queríamos recuperar recursos e conseguir provas criminais.

Então não era interesse do MPF fazer o acordo?
Não é que não era interesse do MPF, mas o interesse principal de fazer algo com essa nomenclatura, com esses termos, era da J&F.

Executivos da J&F disseram que só fariam delação se fechassem acordo de leniência?
Eles disseram. Na época, perguntei (à PGR) porque eles queriam acordo de leniência e me disseram que era porque, quando a coisa estourasse, iria ser algo grande e eles eram muito dependentes de crédito público. Eles tinham medo de retaliação do governo federal, e se não tivesse o acordo de leniência, viraria um efeito dominó, com os bancos privados também. Eles tinham medo de ir à falência.

Mas como é possível provar que não houve coação?
Quando nós começamos a discutir valores, chegamos em um ponto de acordo, R$ 10,3 bilhões em 25 anos, e outras condições. O relacionamento com a empresa era bom naquele momento. Chegamos a fazer aditamentos no acordo a pedido da empresa. Havia uma vontade comum. Inclusive, eles (a J&F) que trouxeram a ideia de que a Transparência Internacional poderia ser um bom parceiro para ajudar a ver o guarda-chuva, como seria a estrutura de governança (dos recursos). Estava todo mundo andando em conjunto.

O que o senhor achou da decisão do ministro Toffoli de suspender os pagamentos e de investigar a ONG?
A decisão do ministro parte de premissas fáticas não aderentes à realidade.

O ministro acreditou em premissas falsas?
Ele acabou confiando na palavra da J&F, que talvez não foi o melhor a ser feito. São premissas colocadas pela empresa e que não são verdadeiras. Com base naquelas premissas, ele deu uma decisão que claramente me parece prejudicial aos fundos de pensão, a centenas de milhares de aposentados, pensionistas, e gera um desafio para o próprio poder público no que diz respeito a ingressos que seriam para os cofres da União. Nesse ponto, é uma decisão que também, de certa forma, gera um problema de segurança jurídica para acordos de leniência em geral.

E em relação à Transparência Internacional?
Claramente, ele (Toffoli) também parte de premissas que não são corretas. Está muito claro nos documentos produzidos pelo MPF que a Transparência estava proibida de receber ou pleitear qualquer recurso que fosse parte de acordo de leniência. Quando a decisão fala de investigar possível apropriação pela Transparência, não faz sentido. Primeiro, porque os projetos, até onde se saiba, sequer foram executados; segundo, porque a Transparência era proibida de receber ou pleitear qualquer recurso. E foi a própria J&F que trouxe a ideia de que seria interessante a Transparência trabalhar em conjunto para criar estrutura, arcabouço de uma execução de investimentos sociais como medida de reparação.

A ONG não indicaria instituições que receberiam esse recursos?
Jamais. Estava proibida. Pelo acordo, era a empresa que iria decidir o que fazer (com os recursos).

Por que vocês deixaram essa possibilidade de a empresa executar ações?
A ideia era de que a própria J&F iria precisar, de certa forma, de um trabalho de reconstrução de valores. Seria uma forma de virar a página. Nosso interesse era que a empresa, ao se engajar em projetos a favor da sociedade, deixasse para trás os valores vinculados a ilicitudes.

O senhor entende que a Operação Spoofing, que revelou mensagens de integrantes da Lava-Jato, respingou em vocês?
O que eu consigo observar é que a J&F tenta puxar, de certa forma, toda essa contrarreação feita em face da Lava-Jato para tentar, a partir daí, rediscutir a multa da leniência. Ela usa estratégias processuais para tentar rever a multa. Possivelmente, ela acha hoje que a multa é muito alta, considerando o contexto comparativo em que ela vê outras empresas que acabaram não tendo que pagar multas tão altas. Isso pode ter gerado por parte dela arrependimento do acordo, e ela aproveitou uma estratégia processual.

Não tem nada na Operação Spoofing que possa atingir o acordo que o senhor firmou com a J&F
Não vi nada que tenha saído de diálogos que possam repercutir negativamente para a força-tarefa Greenfield.

Não vê relação entre a Spoofing com esse acordo de leniência?
Nenhuma relação.

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