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CNMP

Derrota de Lira na PEC do Ministério Público envolveu 'pegadinha de plenário'

A PEC não passou por 11 votos

Presidente da Câmara, dep. Arthur Lira (PP-AL)Presidente da Câmara, dep. Arthur Lira (PP-AL) - Foto: Michel Jesus/Câmara dos Deputado

Parlamentar com fama de profundo conhecedor das regras e dos bastidores do Congresso, o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), acabou caindo em uma "pegadinha de plenário" na rejeição da PEC que visa ampliar a influência do Legislativo no CNMP (Conselho Nacional do Ministério Público), uma das maiores derrotas de sua gestão no comando da Casa.

Um grupo de quase 60 deputados indicou em votações preliminares que poderia apoiar a medida, mas, na hora da votação do mérito da proposta de emenda à Constituição, na noite de quarta-feira (20), votou contra.
A PEC não passou por 11 votos. Foram 297 a favor e 182 contra, mas uma emenda à Constituição exige apoio de ao menos 60% dos deputados, ou seja, 308.

Responsáveis por definir o que vai ou não a voto em plenário, e quando vai, os presidentes da Câmara têm como costume autorizar a votação de projetos em que se empenham pessoalmente apenas quando têm certeza da vitória.

No caso da PEC do CNMP, por exemplo, Lira já tinha adiado algumas vezes a votação ao avaliar que ainda não tinha os votos suficientes para sua aprovação.

A reportagem conversou com aliados e adversários da PEC e todos afirmaram que Lira e seu grupo acabaram tendo uma radiografia enganosa do apoio que tinham. Durante os dias que antecederam a votação, eles contabilizavam cerca de 340 votos a favor.

Esse número foi crucial na decisão de Lira de colocar o texto em votação. Um requerimento que visava adiar a votação da PEC foi rejeitado por 344 deputados. Ou seja, intuiu-se, como é praxe, que esses 344 deputados eram favoráveis à medida. E os outros 128 que apoiaram o adiamento, contrários.

Mas não foi o que ocorreu. Parlamentares confirmaram à reportagem que alguns deputados votaram contra o adiamento justamente para passar a impressão a Lira e aliados de que havia votos suficientes e, com isso, evitar que ele adiasse mais uma vez a análise do tema.

O grupo da "pegadinha" foi composto principalmente por PSL, PSDB, PSB, PSD e Solidariedade. Trinta e quatro parlamentares dessas legendas votaram contra o adiamento da votação, o que foi visto pelo grupo de Lira como sinalização de apoio à medida. No mérito, porém, foram contra a PEC.

O líder do PSL na Câmara, Major Vitor Hugo (GO), chegou a dizer em plenário que o partido estava convicto de que a proposta, após alterações feitas pelo relator, Paulo Magalhães (PSD-BA), estava adequada.

"A PEC, na nossa visão, neste momento, guarda todos os elementos para, primeiro, preservar a independência funcional do Ministério Público, o que era uma preocupação do PSL desde o início. De outro lado, não afronta, de forma alguma, o combate à corrupção", afirmou.

O deputado Hildo Rocha (MDB-MA), contrário à PEC, comentou o resultado das votações. "Quando viram 340 votos no requerimento [foram 344], ele [Lira] achou que estava amadurecido e pensou 'agora dá'. Eles vinham dizendo que tinham no mínimo 340 votos", afirmou.

Na saída da votação desta quarta, Lira demonstrou irritação e disse expressamente que iria analisar o mapa das votações preliminares da sessão de quarta.

"Nós temos um texto principal, temos possibilidades regimentais e vamos analisar o que mudou em três votações para fazer uma análise política. O jogo só termina quando acaba."

Conforme mostrou a coluna Painel, da Folha de S.Paulo, aliados disseram que Lira saiu em busca de "traidores" após a votação.

Parlamentares que conversam com o presidente da Câmara dizem ver com grande dificuldade a tentativa de Lira de promover nova votação do texto na semana que vem. Pelo regimento, como o parecer do texto foi rejeitado, é possível haver a votação da proposta original.

Esses deputados dizem que líderes têm manifestado resistência a essa medida por avaliar que o desgaste pode ser ampliado por causa de um tema que, afirmam, não está entre a prioridade da maioria do Congresso.
Além disso, consideram maior a rejeição ao texto original, do deputado Paulo Teixeira (PT-SP). Há a possibilidade de ajustes feitos por meio de destaques –propostas de modificação–, mas, ainda assim, a votação é avaliada como arriscada.

Bandeira de Arthur Lira, a PEC é uma tentativa de ampliar o poder do Congresso sobre o órgão de correção e controle do Ministério Público, que, na visão do centrão, o grupo liderado por Lira, cometeu diversos abusos, em especial durante a Operação Lava Jato.

A PEC de Teixeira aumenta de 2 para 3 o número de indicações do Congresso no CNMP. Além disso, não deixa claro que o corregedor, responsável por apurar abusos e desvios de procuradores, seria membro do Ministério Público, dando a possibilidade de ser um nome de fora do órgão.

O texto votado pelos parlamentares, que foi modificado por meio de acordo, ampliava de 2 para 5 o número de indicações de Câmara e Senado no órgão, que hoje é composto por 14 integrantes, além de ter a palavra final na escolha do corregedor do órgão.

Há anos que a classe política reclama de uma suposta inação do conselho em relação aos desvios de integrantes do Ministério Público e tenta emplacar propostas para interferir no trabalho do órgão.
Os defensores da PEC alegam que é necessário promover alterações no órgão para torná-lo mais eficiente. Lira disse que a ideia visava levar ao "fim da impunidade em um órgão muito forte".

Procuradores e promotores eram contra a medida, afirmando que Lira e o centrão promoviam uma "PEC da vingança" contra o Ministério Público, já que políticos desse grupo, incluindo Lira, foram e são alvos de investigações, principalmente na Lava Jato.

Associações de classe do Ministério Público dizem que a PEC representava uma tentativa de ingerência política no órgão que pode acabar com a autonomia e independência da carreira.

Em uma decisão que foi vista como uma tentativa de amenizar a pressão sobre o órgão, o CNMP decidiu na segunda-feira (18) aplicar pena de demissão ao procurador Diogo Castor de Mattos, membro da antiga força-tarefa da Lava Jato em Curitiba, pela contratação de um outdoor em homenagem à operação.

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