INVESTIGAÇÃO

"Disse muita merda, muita mesmo": coordenador da PRF criticou Vasques por reuniões

Adiel Pereira Alcântara atuava no setor de Análise de Inteligência da corporação; comentário sobre o ex-diretor ocorreu em conversa com outro agente obtida pela Polícia Federal

Silvinei VasquesSilvinei Vasques - Foto: Carolina Antunes/PR

Conversas obtidas pela Polícia Federal e anexadas à investigação sobre possíveis interferências nas eleições do ano passado mostram que a postura de Silvinei Vasques, ex-diretor da Polícia Rodoviária Federal (PRF) preso nesta quarta-feira (9), incomodou até mesmo a gestores próximos a ele.

As mensagens trocadas pelo WhatsApp entre Adiel Pereira Alcântara, coordenador de Análise de Inteligência do órgão, e Paulo César Botti Alves Júnior, um de seus subordinados, aconteceu na véspera do segundo turno, quando a PRF realizou uma série de bloqueios em estradas do Nordeste — única região do país onde Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que acabaria vencendo a disputa, superou em votos o então presidente Jair Bolsonaro (PL).

No diálogo, Adiel — que teve o celular apreendido com autorização da Justiça — reclama que havia "muito fogo amigo" dentro da corporação. Em seguida, ele cita "reuniões de gestão" e acrescenta que, nesses encontros, alguém teria dito "muita merda" sobre "policiamento direcionado" e "coisas assim".

Botti pergunta, então, se o superior estava se referindo ao "DG" (diretor-geral, ou Silvinei Vasques). "Positivo", retruca Adiel. "Não sabia", responde Botti. Por fim, o coordenador reforça: "Disse muita merda. Muita mesmo".

No relatório apresentado ao ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF) — que autorizou a operação desta quarta-feira e a prisão de Silvinei —, o delegado Flávio Vieitez Reis, da PF, utiliza o conteúdo das mensagens para reforçar outros indícios observados ao longo do inquérito.

Segundo Reis argumenta no documento, a conversa corrobora "com os elementos de prova que indicam as ações policiais visando dificultar ou mesmo impedir eleitores de votar".

A investigação traz ainda uma segunda conversa encontrada no celular apreendido de Adiel, desta vez com um superior hierárquico — Luís Carlos Reischak Júnior, então diretor de Inteligência da instituição. Na noite de 19 de outubro, Reischak disse ao coordenador que havia ficado "definido pelo diretor" que haveria no domingo do segundo turno "uma operação de segurança viária".

"Aqueles transportes de passageiros que saem de São Paulo e vão para o Nordeste, por exemplo, se a gente conseguir identificar", sugere o diretor, em um trecho de uma longa mensagem.

Na resposta, Adiel faz uma ponderação: "A gente tem que levar em consideração também essa decisão recente do Barroso (ministro do STF), que liberou o transporte gratuito de eleitores".

Em seguida, o coordenador diz: "Vai ser difícil caracterizar o transporte clandestino de eleitor". Meia hora depois do primeiro contato, Reischak avisa que vai acompanhar Silvinei em uma reunião com o ministro da Justiça, Anderson Torres.

No mesmo dia do diálogo entre os dois, de acordo com a representação remetida ao STF, também aconteceu, mais cedo, uma reunião da alta da cúpula da PRF que tratou das ações previstas para o segundo turno.

A discussão foi realizada na sessão extraordinária do Conselho Superior do órgão e incluiu tentativas de eliminar rastros de seu conteúdo, como a proibição de uso de telefone celular ou participação remota.

A existência do encontro já havia sido revelada em abril pelo blog da jornalista Malu Gaspar, do Globo. Como mostrou a colunista, mencionado também pela PF, alguns dos presentes à reunião "não teriam concordado com tal ação claramente ilegal, sendo que alguns se recusaram a assinar o documento de comparecimento na reunião".

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