Documentos mostram 24 reuniões com atuação do 'ministério paralelo' da Saúde
Segundo senadores independentes e de oposição da CPI, o "ministério paralelo" seria um grupo de aconselhamento do presidente Jair Bolsonaro fora da estrutura do Ministério da Saúde
Documentos da Casa Civil entregues à CPI da Covid no Senado mostram que pessoas apontadas como integrantes de um "ministério paralelo" da Saúde no Planalto participaram de ao menos 24 reuniões para tratar das estratégias do governo federal de combate à pandemia.
Segundo senadores independentes e de oposição da CPI, o "ministério paralelo" seria um grupo de aconselhamento do presidente Jair Bolsonaro fora da estrutura do Ministério da Saúde.
O material remetido à CPI da Covid pelo Palácio do Planalto trata de informações solicitadas sobre todas as reuniões que tiveram como pauta o tema relacionado à pandemia da Covid-19.
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Entre as pessoas presentes nessas reuniões, aparecem o vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos-RJ), filho do presidente, além do deputado federal Osmar Terra (MDB-RS), o assessor especial da Presidência, Tercio Arnaud, o ex-secretário de comunicação Fabio Wajngarten e a médica Nise Yamaguchi.
Todas essas pessoas participando de reuniões relacionadas à pandemia do novo coronavírus, de acordo com os documentos enviados à comissão.
Alguns deles são citados em um mesmo evento ou em momentos distintos. Há reunião também com a presença do outro filho do presidente, o senador Flávio Bolsonaro (RJ).
Os filhos do presidente estiverem em ao menos cinco reuniões. Três foram uma videoconferência em que iriam tratar do tema "governadores e pedidos de apoio para enfrentamento da crise, as pautas são referentes a saúde, economia e outras áreas".
Em uma dessas três reuniões esteve presente o assessor Tercio Arnaud, que teve uma carreira meteórica na equipe de Jair Bolsonaro.
Integrante do chamado "gabinete do ódio", bunker digital do Palácio do Planalto revelado pelo jornal Folha de S.Paulo, ele é considerado o principal preposto de Carlos Bolsonaro na equipe do presidente.
A médica Nise Yamaguchi esteve em ao menos quatro reuniões no Palácio do Planalto, segundo os registros da CPI. Em uma delas, em abril do ano passado, tratou sobre hidroxicloroquina, remédio que não tem eficácia comprovada contra a Covid-19. O presidente chegou a fazer postagens sobre a médica nas redes sociais para falar sobre o medicamento.
Há ao menos 11 registros com a presença do deputado Osmar Terra entre 4 de fevereiro do ano passado até 30 de março deste ano. Em quatro consta na agenda somente a presença dele e do presidente, com tema classificado como "diversos". Médico, Terra tem sido um dos principais conselheiros de Bolsonaro.
Em outra, ele aparece com a presença do ex-ministro da Saúde Eduardo Pazuello. A data é a mesma em que Pazuello tomou posse como ministro. Na ocasião, a pandemia já tinha deixado 4,4 milhões de casos e 133 mil mortes desde o início de fevereiro do ano passado.
Já o ex-ministro das Comunicações Fabio Wajngarten aparece em ao menos seis agendas sobre a pandemia, abordando ações governamentais para o combate ao coronavírus, vacinação e a situação do estado do Amazonas, que passava por uma crise na falta de fornecimento de oxigênio para pacientes internados da doença.
O nome do assessor internacional da Presidência, Filipe Martins, e do ex-assessor Arthur Weintraub, além do empresário Carlos Wizard, apontados na CPI como integrantes do grupo paralelo, até então não apareceram nas listas.
No entanto, nem todos os membros que participaram dos encontros foram divulgados nas planilhas das reuniões entregues à CPI, ou a informação é de que não há lista de nomes. Algumas tratavam de temas importantes como a vacina de combate ao coronavírus e o consórcio Covax Facility.
Em seu depoimento, o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, disse desconhecer a estrutura paralela. A comissão mira em Carlos Bolsonaro para investigar o suposto grupo, assim como Arthur Weintraub.
Os parlamentares acreditam que o advogado pode ser um dos líderes do gabinete paralelo, após a revelação de vídeos em que afirmou que estava investigando a suposta eficácia da hidroxicloroquina a pedido de Bolsonaro.
Osmar Terra também deve ser convocado. Ele é apontado como um dos conselheiros de Jair Bolsonaro que combateram o isolamento social, único instrumento que existia no ano passado, além do uso de máscaras, para frear a disseminação do novo coronavírus no Brasil.
O requerimento de convocação foi apresentado pelo senador Rogério Carvalho (PT-SE). A decisão de chamá-lo foi tomada depois que o ex-ministro da Saúde Luiz Henrique Mandetta citou Terra como uma das pessoas do grupo que aconselhava o presidente de forma paralela para que ele não seguisse as recomendações da pasta da Saúde.
Segundo o relator da comissão, senador Renan Calheiros (MDB-AL), o ex-secretário de comunicação da presidência, Fabio Wajngarten, deu relatos que comprovam a existência do grupo. De acordo com o parlamentar, isso aconteceu depois que Wajngarten admitiu que participou de reuniões de negociação de vacina com representantes da Pfizer.
"Vossa excelência é a prova da existência dessa consultoria, é a primeira pessoa que incrimina o presidente da República, porque iniciou uma negociação em nome do Ministério da Saúde, como Secretário de Comunicação e se dizendo em nome do presidente; é a prova da existência disso", disse Renan, durante depoimento do ex-secretário à CPI neste mês.
Procurados através da assessoria de imprensa, a presidência e a Casa Civil não responderam aos contatos da reportagem nesta quinta-feira.