Em live com pastores, Marçal chora, reza cartilha conservadora e ataca Nunes: "Direita trans"
Empresário tenta se aproximar do segmento após sofrer críticas de líderes religiosos como Silas Malafaia e ver a rejeição subir nas pesquisas
Abalado pela rejeição e pela perda da vantagem no meio evangélico na medição do Datafolha, o empresário Pablo Marçal (PRTB) convocou uma live com lideranças religiosas nesta segunda-feira (23).
O candidato à prefeitura de São Paulo recorreu a discursos conservadores, como a defesa da liberdade de culto, chorou ao lembrar da esposa, tentou associar a crítica de pastores ao suposto recebimento de verbas da prefeitura e atribuiu a pecha de “comunista” ao principal adversário de momento, o prefeito Ricardo Nunes (MDB), que representaria uma “direita trans”, em suas palavras.
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Marçal falou ininterruptamente por 45 minutos, antes de abrir para perguntas e comentários.
Em mais de uma ocasião, afirmou que 10 mil pessoas foram cadastradas pela sua equipe e seriam direcionadas para um grupo de Telegram.
Não foi possível checar a audiência porque o público foi dividido em salas.
No link distribuído à imprensa, por exemplo, eram 85 ouvintes na abertura. Ele tentou angariar novos voluntários e pediu doações por meio da chave pix da campanha.
Após oscilação negativa entre evangélicos, Marçal convoca reunião com pastores e líderes de igrejas
Marçal tentou falar diretamente com as bases católicas e evangélicas em um momento em que recebe críticas diárias de líderes como o pastor Silas Malafaia.
Recitou passagens bíblicas e comparou a disputa pela prefeitura da cidade a um embate entre Davi, representado por ele, contra Golias, a esquerda.
No meio do caminho estariam Saul, que apesar de não ter sido dito explicitamente, era uma referência ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), e Eliabe, nome a quem já atribuiu a Malafaia.
— A gente tem perdido uma guerra cultural em que parece que esse país não é cristão. Nós, que somos a maioria, em vez de defendermos uns aos outros, nos apegamos muito a diferenças ou a falhas que acabamos cometendo e culturalmente deixamos que pessoas que gritam mais alto dominem sobre nós — declarou o candidato. — Em todas as camadas da sociedade têm um cristão e ele precisa se manifestar, porque a gente precisa colocar esses comunistas para correr. Da minha parte, vocês nunca vão ver eu rachar a direita ou o lado conservador, de maneira nenhuma.
A respeito de Bolsonaro, Marçal repetiu argumentos anteriores de que ele teria se curvado a Valdemar Costa Neto, presidente do PL, e precisou dar a palavra de apoio a Nunes.
Depois de se declarar evangélico na live e lembrar que foi batizado aos 11 anos, na Igreja Videira, em Goiânia (GO), defendeu a criação de partidos religiosos sob o argumento de que o “processo de evangelização” do Brasil não teria sido acompanhado pela tomada “dos nossos lugares na sociedade”, supostamente deixando “esses canalhas, comunistas governarem”.
— Estamos diante de um cenário absurdo, tentando ressuscitar um Frankestein. E aqui tenho que deixar um alerta: não vou expor neste primeiro momento, mas pastores estão recebendo dinheiro pesado da prefeitura de São Paulo com suas empresas, rádios, canais de TV e outorgas que lideram, para me atacar. Eu não me importo com você receber seu dinheiro e fazer o que quiser com a sua comunidade, mas eu vou trazer o nome de todos que estão atrás de cargos, de dinheiro público, para me atacar, porque isso é uma grande vergonha. Já tenho os nomes, não vou entrar nessa discussão, mas caso continuem nessa linha eu vou trazer no próximo encontro.
Marçal disse no evento que não estava fazendo um “apelo religioso”, mas como cidadão, e disse que a sua candidatura seria um “milagre”.
Disse que é um “homem de oração, de ler a palavra todo dia, e de respeitar as instituições, tanto o Judiciário quanto as igrejas” para então defender que “não vai ser um religioso” que vai levar o Brasil a ser a “nação mais próspera da Terra”, mas um cristão sem cargo.
— Nunca na história de São Paulo um evangélico sentou na cadeira de prefeito. E a coisa mais louca que eu vejo é que pastores, por conta de dinheiro público, estão se levantando contra. A gente não tem que eleger um evangélico, mas alguém com capacidade de gestão — defendeu o candidato.
Pauta de costumes e choro
Antagonizando com o deputado federal Guilherme Boulos (PSOL), Marçal tentou convencer os líderes e membros de igrejas a doarem para a campanha, atuarem como voluntários e gravarem vídeos de apoio nas redes sociais.
Para engajá-los, investiu na cartilha conservadora, como supostas ameaças de fechamento de igrejas, algo amplamente explorado por Bolsonaro e políticos de extrema-direita em outras ocasiões.
— Quando você vê uma igreja abrindo um partido você pensa: quer o poder. Quer mesmo, o poder de não ser fechada, de não ser controlada por comunistas — disse Marçal. — Eu te pergunto, se temos a maior parte da população andando conosco, por que vamos nos curvar para esse tanto de gente maluca tentando destruir o nosso Hino Nacional, os nossos filhos na escola com linguagem neutra, com a questão de sexualidade, erotização infantil, partidarização, ensinando os nossos filhos a serem petistas dentro da escola, querendo mandar na gravidez das mulheres? Não faz sentido não ter uma sensibilidade com isso. Esses caras chegam e querem descriminalizar as drogas, tirar dos presídios milhares de traficantes, colocar pessoas incompetentes na máquina pública. Eles querem comer esse dinheiro com companheirada.
Em seguida, o candidato mirou a artilharia em Nunes:
— Na cidade de São Paulo tem gente que se pinta de conservador, é uma direita trans, tipo a pessoa que nasceu de um jeito, é de um jeito, mas decidiu mudar. Esse é o candidato Nunes, que alguns pastores vergonhosamente têm defendido. Não é uma disputa para saber quem tem mais carinho, mas é um alerta. Eu tenho pastores amigos e poderia ficar indo em dez igrejas por dia. Não vou em prédio de igreja e fazer o que todo político vagabundo faz em época de eleição, que é mentir para você. O Nunes me chamou de falso profeta e que eu sou um mal para a humanidade. Eu vou colocar ele na cadeia, é um compromisso pessoal com quem está assistindo. Ele recebeu dinheiro de creche — disse, em referência à investigação da "máfia das creches" pela Polícia Federal.
Marçal também usou o evento para se defender da condenação a quatro anos e cinco meses de prisão por furto qualificado, pela Justiça Federal de Goiás, em caso que aconteceu quando tinha 18 anos, em 2005.
O candidato foi acusado de integrar uma quadrilha que disparava e-mails maliciosos para roubar senhas bancárias, mas a pena acabou prescrita.
O caso, no entanto, está sendo amplamente explorado por adversários na campanha, inclusive na propaganda eleitoral de rádio e TV. Ele diz que apenas consertava computadores para um pastor e não tinha conhecimento das fraudes.
Ao comentar, disse que a esposa, Ana Carolina, não está bem e começou a chorar ao vivo.
— A minha esposa não tá bem. Ela só me fez um pedido: voltar vivo para casa. Orem por ela, o coração dela está muito triste mesmo. Ela até parou de acompanhar tudo que está acontecendo nessas redes sociais porque é assustador o tanto de gente atentando contra a minha vida e falando coisas absurdas. É uma coisa que me faz chorar saber que o coração da minha esposa está triste por alguma coisa — afirmou o candidato.
Depois, prometeu fazer um jejum de 7 dias, consumindo apenas água e lembrou de Salomão, autor de Provérbios, dizendo que entre uma “multidão de conselheiros há sabedoria”.
Em vídeo resgatado nas redes sociais, Marçal aparece dizendo que o personagem bíblico era um “nenê” perto dele. “Salomão escreveu três livros, eu escrevi 45”, afirma ele na gravação antiga.
Durante as perguntas dos ouvintes, afirmou ainda que Karl Marx, um dos autores do Manifesto Comunista, era um “gigolô” que propagava “mentiras” e verbalizou desconforto ao pedir dinheiro: “oferta ou investimento, sei lá como você vai chamar”.
Ele também já criticou a cobrança do dízimo pelas igrejas, sugerindo que era um entrave para prosperar financeiramente. O ex-coach encerrou improvisando uma oração, novamente pedindo apoio para a reta final da disputa.