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BRASIL

Entenda em 7 pontos a crise entre Brasil e Israel após Lula comparar guerra em Gaza ao Holocausto

Declaração do presidente brasileiro deu início à maior tensão diplomática com o país desde o início da guerra

Presidente Lula discursa na sessão de abertura da Cúpula da União Africana Presidente Lula discursa na sessão de abertura da Cúpula da União Africana  - Foto: Ricardo Stuckert/PR

Desde que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva comparou, no último domingo, a operação militar israelense em Gaza ao genocídio de judeus promovido pela Alemanha nazista, Brasília e Tel Aviv passam pela sua maior crise diplomática desde o início da guerra, em 7 de outubro. Entenda em sete perguntas e respostas a tensão diplomática entre os países.

1) O que Lula falou sobre o Holocausto?
Durante uma entrevista coletiva em Adis Abeba, na Etiópia, o presidente Lula afirmou que o conflito entre Israel contra o grupo terrorista Hamas em Gaza "não é uma guerra, mas um genocídio", comparando a ação israelense ao Holocausto. Lula ainda reforçou a defesa histórica da diplomacia brasileira por uma solução de dois Estados e condenou Israel por desobedecer todas as decisões das Nações Unidas.

— O que está acontecendo em Gaza não aconteceu em nenhum outro momento histórico, só quando Hitler resolveu matar os judeus — disse Lula na ocasião.

2) Qual foi a reação de Israel à fala de Lula?
Imediatamente, o premier israelense, Benjamin Netanyahu, declarou que Lula cruzou uma "linha vermelha" ao fazer tal comparação.

— Ao comparar a guerra de Israel em Gaza contra o Hamas, uma organização terrorista genocida, ao Holocausto, o presidente da Silva desonra a memória dos seis milhões de judeus assassinados pelos nazistas e demoniza o Estado judeu como o mais virulento dos antissemitas. Deveria ter vergonha — disse.

Após a declaração, o chanceler israelense convidou o embaixador brasileiro em Israel, Francisco Meyer, para acompanhá-lo no Museu do Holocausto, onde anunciou diante das câmeras que Lula "é persona non grata em Israel até que se retrate". No encontro, que teve como objetivo repreender o diplomata e mostrar "o que os nazistas e Hitler fizeram aos judeus", segundo Katz, o chanceler falou em hebraico, idioma não compreendido por Meyer.

O gesto foi considerado pelo Planalto como humilhante. No entanto, até o momento o presidente Lula se recusou a se retratar. O assessor especial da Presidência, Celso Amorim, classificou a decisão de considerar Lula como persona non grata como "absurda" e disse que cobrança do chanceler por desculpa "não tem cabimento".
 

— Quem tem que pedir desculpas é Israel, e não ao Brasil, mas à humanidade — rebateu Amorim na segunda-feira, descartando qualquer hipótese de retratação.

3) Como o Brasil respondeu?
O Brasil convocou seu embaixador no país, Francisco Meyer, num gesto de insatisfação na diplomacia. O representante diplomático israelense no Brasil, Daniel Zonshine, também foi chamado pelo governo brasileiro para prestar esclarecimentos, e teve uma reunião a portas fechadas com o chanceler Mauro Vieira na segunda-feira.

Segundo a coluna de Malu Gaspar, o governo Lula cogita expulsar o embaixador israelense do país — uma ação sem precedentes, considerada "drástica e indesejável" pelo Itamaraty. Tal possibilidade, no entanto, foi sugerida a Zonshine durante seu encontro com Vieira. O seu avanço dependerá dos próximos movimentos do governo Netanyahu.

Nesta quarta-feira, o chanceler Katz, criticou novamente a declaração de Lula em um vídeo postado nas redes sociais ao lado da brasileira Rafaela Triestman, namorada do brasileiro Ranani Glazer, morto no festival de música eletrônica alvo de ataques do Hamas em 7 de outubro.

De acordo com a colunista Bela Megale, o governo decidiu não responder mais aos ataques de Katz. Na avaliação de ministros palacianos e do Itamaraty ouvidos pela coluna, Netanyahu tem escalado a crise com o Brasil para se beneficiar domesticamente.

4) O que é Holocausto?
O Holocausto se refere ao extermínio de seis milhões de judeus durante 1933 e 1945, ao longo da Segunda Guerra Mundial, pela Alemanha de Adolf Hitler. O número foi equivalente a aproximadamente um terço da população judaica mundial. Outros grupos, como ciganos, homossexuais, comunistas ou identificadas com a esquerda, pessoas com deficiência e testemunhas de Jeová também foram alvos do regime nazista.

A motivação por trás do genocídio — chamado de "Shoah" pelos judeus, catástrofe em hebraico — foi a ideologia antissemita da Alemanha de Hitler. De 1933 a 1941, a população judaica foi cerceada dos seus direitos a propriedade, precisava andar com identificação e passou a viver em guetos ao redor da Europa. Nos anos finais da guerra, contudo, os judeus foram deportados para campos de concentração, ação chamada de "solução final" pelos nazistas.

5) O que é genocídio?
O termo "genocídio" foi usado pela primeira vez em 1944 pelo advogado polonês Raphael Lemkin, em referência ao extermínio promovido pela Alemanha nazista. Contudo, seu reconhecimento como crime pelo direito internacional só surgiu quatro anos depois, com a adoção da Convenção sobre a Prevenção e Punição do Crime de Genocídio pela ONU, em 1948. Apesar do termo ter sido cunhado em referência ao Holocausto, o massacre do povo judeu não foi julgado como genocídio, mas sim como crime contra a Humanidade.

Até hoje, nenhum Estado foi responsabilizado por genocídio na Corte Internacional de Justiça, órgão judicial máximo da ONU sediado em Haia. Países só foram condenados pelo crime em tribunais excepcionais criados a partir de resoluções do Conselho de Segurança, como a ação que julgou o genocídio em Ruanda, em 1996 — a primeira condenação da História por genocídio, quase 50 anos depois do estabelecimento da Convenção.

Não há um número mínimo de vítimas nem um período mínimo de ocorrência para que a prática de genocídio seja reconhecida. Enquanto o genocídio em Ruanda matou mais de 1 milhão de pessoas ao longo de um ano, o Massacre de Srebrenica, na Bósnia, durou apenas dois dias, nos quais mais de 8 mil pessoas foram assassinadas.

Em média, 250 pessoas são mortas por dia em Gaza, tornando o conflito o mais letal do século, segundo relatório da instituição britânica Oxfam de janeiro. Quase 30 mil palestinos foram mortos em Gaza em quatro meses de guerra. Do lado israelense, 1,2 mil morreram durante o ataque terrorista de 7 de outubro e mais de 200 foram feitas reféns — dos quais 100 ainda estão sob custódia do Hamas.

6) O que é sionismo?
O sionismo é apontado por muitos especialistas como a principal base ideológica que levou à criação do Estado de Israel. O pensamento sionista se baseia na crença de que a solução para o pertencimento judeu em uma sociedade viria com a existência de um Estado próprio. Até 1947, muitos judeus migraram para a região, um movimento que se intensificou durante a Segunda Guerra e a perseguição nazista. Nesta época, teve início o ciclo de violência entre árabes e judeus que dura até hoje.

7) O que é antissemitismo?
Aliança Internacional para a Memória do Holocausto (IHRA) define o antissemitismo como "uma determinada percepção dos judeus, que se pode exprimir como ódio em relação aos judeus. Manifestações retóricas e físicas de antissemitismo são orientados contra indivíduos judeus e não judeus e/ou contra os seus bens, contra as instituições comunitárias e as instalações religiosas judaicas.” O conceito foi adotado pelos 31 países-membros da IHRA, da qual o país faz parte apenas como observador.

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