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POSICIONAMENTO

Filho de João Candido, o Almirante Negro, ataca comandante da Marinha por carta contra o pai

Nomeado por Lula tenta barrar homenagem ao Almirante Negro, líder da Revolta da Chibata

Adalberto Cândido, filho de João CândidoAdalberto Cândido, filho de João Cândido - Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil

Após o comandante da Marinha, Marcos Sampaio Olsen, se posicionar contra o projeto que inclui João Cândido Felisberto, o "Almirante Negro", no livro oficial de Heróis da Pátria, o único filho vivo do líder da Revolta da Chibata disse que seu pai não era um herói da Marinha, mas sim "um herói do povo". Adalberto Cândido, que se recusou a ler a carta de Olsen na íntegra, disse que o episódio de agora é apenas mais um capítulo da perseguição que sempre foi imposta a seu pai.

— Se fizesse um plebiscito, uma eleição para saber sobre o reconhecimento, ele (João Cândido) ia ganhar — afirmou Adalberto, o Candinho, de 85 anos, o caçula dos sete irmãos e morador de São João de Meriti, município onde seu pai terminou a vida. — Não quero que meu pai seja um herói da Marinha, ele é um herói popular. Quero que meu pai seja um herói do povo.

"Seu Candinho", como é conhecido na vizinhança disse que seus familiares precisaram lhe contar sobre a carta. Ele não teve coragem de ler o texto, que classificava a Revolta da Chibata, de 1910, uma rebelião liderada por João Cândido contra os castigos físicos sofridos pelos marinheiros, a maioria negros, como "episódio vergonhoso" e "deplorável". Olsen ainda chamou os marinheiros participantes do movimento de "abjetos".

— Meu pai está na história do país. Ele é conhecido internacionalmente. O que um oficial da Marinha representa perto do João Cândido? — questiona Candinho, que admitiu que não seria "cordial" em um suposto encontro com Olsen.

O filho do Almirante Negro, eternizado com esse "título" em célebre canção de João Bosco e Aldir Blanc, e enredo do último carnaval da Paraíso do Tuiutí, diz que seu pai tinha perfil "reservado", e não contava muito sobre o movimento que liderou. Candinho nasceu após a revolta, mas conviveu com os atos de perseguição, como a tentativa frustrada de seu pai trabalhar na Marinha Mercante, e também da proibição de instalação de um busto em homenagem em Porto Alegre (João Cândido nasceu no Rio Grande do Sul).

Expulso da Marinha em 1912 e após décadas de esquecimento, João Cândido teve sua imagem resgatada a partir do livro "A Revolta da Chibata", de Edmar Morel, lançado em 1958, conta Candinho.

— Meu pai sempre foi perseguido. De 1910 a hoje a Marinha mantém rancor, um ranço danado contra meu pai. Porque não achavam que marinheiros teriam capacidade em organizar aquele movimento, e pelas mortes ocorridas no confronto — afirma Candinho.

O único filho do Almirante ainda luta pela obra de um museu na cidade em memória à luta do pai. No ano passado, Candinho participou de uma reunião para construção da Casa de Memória Marinheiro João Candido, projeto da Fundação de Artes do Estado do Rio de Janeiro (Funarj) com a prefeitura de São João de Meriti. Apesar dos esforços, o projeto segue engavetado:

— Continuamos na luta pelo seu reconhecimento.

Nesta sexta, os deputados federais Lindbergh Farias e Benedita da Silva, do PT, visitaram Candinho em um ato de resposta ao movimento da Marinha. Enquanto senador, Lindbergh foi autor do projeto de lei para inclusão de João Cândido no livro de Heróis da Pátria. O projeto foi aprovado no Senado e agora tramita na Câmara, onde Benedita é relatora.

Lindbergh, que chamou as declarações de "agressivas'" e "completamente sem sentido", pediu retratação ao comandante e marcou uma audiência com o ministro da Defesa, José Múcio, por causa do caso. O deputado ainda lembrou que no primeiro governo Lula já houve homenagens a João Candido, como a inauguração de uma estátua e nomeação de navio no Porto do Suape.

— Sinceramente nos pegou de surpresa tamanho a contundência. Falar em "abjetos marinheiros" e "fatos nefastos da história" 114 anos depois. Caiu como uma bomba, porque João Cândido é heroi da resistência do povo negro. Por isso é tão importante colocar ele formalmente escrito como herói nacional — afirmou o deputado petista.

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