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RIO DE JANEIRO

Gabriel Monteiro: de indisciplina na PM a acusações de abuso: relembre as polêmicas

Agora em liberdade, ex-vereador ainda responde a pelo menos três ações penais e é réu em processos cíveis por danos morais relacionados a vídeos publicados em suas redes sociais

Gabriel Monteiro Gabriel Monteiro  - Foto: Reprodução / Redes Sociais

Em liberdade desde a noite de sexta-feira, o ex-vereador Gabriel Monteiro acumula uma trajetória marcada por polêmicas. Antes de ingressar na política, ele atuou na Polícia Militar, onde recebeu diversas punições por infrações disciplinares. Já como parlamentar, teve o mandato cassado por quebra de decoro.

Após ter os vídeos publicados no YouTube desmonetizados, ele chegou a criar um serviço próprio de 'TV por assinatura', chamado "Gabriel Monteiro TV". Agora fora da penitenciária, Monteiro ainda responde a pelo menos três ações penais por crimes como estupro e assédio sexual.

Além disso, é réu em processos cíveis por danos morais relacionados a vídeos publicados em suas redes sociais. Em pelo menos dez ações, foi condenado a pagar R$ 242 mil em indenizações por "pegadinhas" e gravações feitas em unidades de saúde durante seu mandato.

 

Quem é Gabriel Monteiro?
Gabriel Monteiro ficou famoso nas redes sociais por denunciar supostos esquemas de corrupção e defender o governo Bolsonaro em 2020. A fama online o catapultou da Polícia Militar, onde tinha uma ficha marcada pela indisciplina, para a política. Ex-integrante do grupo de direita Movimento Brasil Livre (MBL), com o qual rompeu por causa das ações polêmicas como youtuber, foi o terceiro vereador mais votado do Rio em 2020 pelo PSD (depois foi para o PL), com 60.326 votos, ficando atrás apenas de Carlos Bolsonaro (então integrante do Republicanos, hoje no PL), com 71 mil votos, e Tarcísio Motta (PSOL), com 86.243.

Como estava na PM há menos de dez anos, Gabriel Monteiro teve de pedir demissão da corporação para assumir o cargo. Em agosto de 2022, teve o mandato de vereador do Rio cassado, por 48 votos a dois, por quebra de decoro parlamentar.

Enquanto esteve na PM, em menos de quatro anos na corporação, cometeu 16 transgressões disciplinares. Por 14 delas recebeu, no total, penalidades que somam 33 dias de detenção. Em outros dois casos, foi punido com repreensão. Devido às transgressões, foi classificado como um PM com “mau comportamento”, a pior das cinco classificações do estatuto da corporação. Ele chegou a ser demitido da corporação, mas conseguiu a reintegração na Justiça.

O soldado chegou a ser punido duas vezes por fatos ocorridos no Centro de Formação e Aperfeiçoamento de Praças (Cfap), quando ainda era aluno da PM e estava longe de ser um figura conhecida na internet. Em sua primeira punição, em agosto de 2016, foi acusado de ter descumprido a ordem de um oficial e cumpriu dois dias de detenção. Ainda segundo sua ficha disciplinar, em outras duas ocasiões — em março de 2018 e em janeiro de 2019 —, quando já era soldado, o youtuber foi flagrado portando a arma da PM sem que estivesse de serviço e sem autorização.

Ele também foi punido oito vezes por ter faltado ao serviço. Na metade dos casos, tinha sido escalado para integrar cercos à favela da Rocinha. Uma das confusões em que se envolveu ocorreu em 2019, quando ainda era PM. Ele invadiu e foi expulso da Câmara de Vereadores do Rio porque queria protestar contra um evento organizado por Tarcísio Motta (PSOL) em homenagem à China.

Polêmica com ex-comandante geral da PM
Em março de 2020, Monteiro publicou um vídeo em que abordava o coronel Íbis Souza e fazia questionamentos a respeito da participação dele em um evento dentro do Complexo da Maré, na Zona Norte do Rio. Na produção, ele insinuava que o oficial teria envolvimento com traficantes da Maré. Íbis esteve na comunidade para dar uma palestra. Devido ao episódio, foi condenado a indenizar o coronel em 40 salários mínimos por danos morais.

Sob o pretexto da prerrogativa de fiscalizar as condições de funcionamento de instalações públicas, Monteiro passou a entrar em hospitais e abrigos, entre outros, cercado por assessores com celulares, produzindo imagens para seus vídeos monetizados nas redes sociais. Bateu boca com médicos, enfermeiros e outro técnicos. Em um dos casos, foi condenado a indenizar em R$ 20 mil um médico, por acusá-lo, nas redes sociais, de ter deixado o plantão da UPA de Magalhães Bastos para fazer sexo com uma enfermeira nos alojamentos. O médico estava no horário de descanso.

Monteiro também invadiu um abrigo para crianças e adolescentes durante a noite. A vereadora Laura Carneiro, então secretária de Desenvolvimento Social — e que não queria liberar a entrada do youtuber no período noturno — foi seguida quase um mês por um dos assessores do vereador, que queria flagrá-la em alguma situação desconfortável. No Conselho de Ética, um dos ex-integrantes da equipe revelou que Monteiro mantinha uma estrutura apenas para tentar acumular provas contra inimigos políticos. E tinha, entre as ambições, preparar um vídeo no qual algum colega da Câmara fosse flagrado em uma situação que indicasse que estaria recebendo propina.

Por causa de Gabriel Monteiro, o prefeito Eduardo Paes chegou a baixar regras restringindo o acesso de vereadores a repartições. Mas recuou por pressão de outros vereadores, inclusive da base aliada, já que uma das prerrogativas constitucionais do Legislativo é fiscalizar o Executivo. Monteiro monetizava esses vídeos em órgãos públicos. Ex-assessores estimaram que ele faturaria pelo menos R$ 300 mil por mês com as produções. Ao Conselho de Ética, ele estimou que seria apenas a metade disso.

Acusações de abuso sexual
No início de 2022, o vereador se envolveu em mais uma confusão ao acusar um empresário de tentar suborná-lo para não fiscalizar as instalações da empresa que prestava serviços de reboque e de depósito de veículos para a prefeitura. Logo depois, uma reportagem do "Fantástico", da TV Globo, exibiu depoimentos de ex-funcionários que o acusaram de manipulação de vídeos, inclusive com menores de idade, e de mulheres que acusaram o vereador de estupro e abuso sexual.

Dias depois, começaram a circular vídeos nas redes sociais em que Gabriel aparece supostamente fazendo sexo com diversas mulheres. Um deles com uma adolescente de 15 anos que frequentou a casa de Gabriel por dez meses e era recebida ao som da trilha do infantil ''A Galinha Pintadinha''. Gabriel afirma que acreditava que a garota tinha 18 anos, mas o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) define como crime filmar relações sexuais com menores.

Em meio às investigações do Conselho de Ética, a Câmara do Rio aprovou uma resolução que afetou os rendimentos extras de Monteiro. Ele não pôde mais monetizar vídeos que estivessem relacionados com sua atividade de parlamentar nem usar a estrutura da Câmara do Rio para isso.

As acusações que pesaram contra Gabriel incluíram o fato de expor menores em situações sensíveis e as identificando nas redes sociais. A mesma tese se aplica a outro vídeo em que Gabriel orienta uma criança de doze anos sobre como proceder para a família receber doações em dinheiro. Havia também a denúncia de agressões contra um morador de rua por parte de um segurança durante a produção de um vídeo na Lapa.

Serviço próprio de 'TV por assinatura'
Em junho de 2022, pós muitas polêmicas pelos vídeos postados, Gabriel Monteiro chegou a criar uma espécie de TV por assinatura própria para continuar a faturar na internet com as produções. A iniciativa foi tomada depois que houve um movimento nas redes sociais para que marcas de grandes empresas deixassem de monetizar o conteúdo do ex-PM.

A "Gabriel Monteiro TV" oferecia três alternativas de assinatura, a partir de contribuições que podiam variar de R$ 30 a R$ 1 mil por mês.

Documentário sobre ex-parlamentar
Ainda em 2022, a história de Gabriel Monteiro virou um documentário na Globoplay. Chamado de “Gabriel Monteiro — Herói Fake”, a produção exibe relatos de quatro mulheres que registraram queixa de estupro em delegacias e entrevistas com ex-funcionários. A série mostra como o político usou as redes sociais não apenas para ganhar dinheiro com suas produções manipuladas, mas também criar uma imagem de benfeitor e moralista que não passava de uma ficção.

Liberdade após decisão do STJ
Em liberdade desde a noite de sexta-feira Gabriel Monteiro foi beneficiado por uma decisão Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça, que concedeu liberdade ao ex-parlamentar, com medidas cautelares. Por determinação da 34ª Vara Criminal do Rio, ele terá que usar tornozeleira eletrônica e está proibido de deixar o Rio. A Justiça também determinou o comparecimento periódico em juízo e a proibição de manter contato com a vítima — o ex-vereador foi acusado de forçar relações sexuais com uma mulher de 22 anos após lhe apontar uma arma, em julho de 2022.

Sua saída de Bangu 8 ocorreu por volta das 20h10, após assinar documentos na porta da unidade. De acordo com a Secretaria estadual de Administração Penitenciária (Seap), a pasta recebeu no início da noite o alvará de soltura de Gabriel Luiz Monteiro de Oliveira e realizou os "procedimentos de praxe" para que o detento deixasse a cadeia.

O processo corre em segredo de Justiça. O ex-vereador tem cinco dias para se apresentar para a colocação da tornozeleira. Ele foi preso em novembro de 2022, após se apresentar a uma delegacia em Niterói. Na ocasião, já havia perdido seu mandato de vereador, por quebra de decoro parlamentar.

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