Indiciamento de Valdemar aumenta pressão no PL para aliança com o centro e moderação no discurso
Parlamentares mais antigos pretendem conter radicalismo, especialmente com Bolsonaro inelegível e indiciado por tentativa de golpe
O indiciamento do presidente do PL, Valdemar Costa Neto, por participação em uma tentativa de golpe para manter Jair Bolsonaro no poder aumentou a pressão interna para que a legenda adote uma postura mais moderada daqui para a frente. O movimento, capitaneado pela chamada ala histórica da legenda, é uma tentativa de isolar discursos considerados radicais ao grupo que se filiou à sigla com o ex-presidente e tem como pano de fundo um reequilíbrio de forças para as eleições de 2026.
De um lado, parlamentares com mais tempo de casa defendem uma postura de construir alianças com partidos de centro, em especial no caso de Bolsonaro continuar inelegível. Do outro, bolsonaristas são favoráveis a candidaturas apenas de nomes identificados com as bandeiras da direita.
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Condução
Dono da maior bancada do Congresso e, consequentemente, da fatia mais gorda do fundo eleitoral, o partido evita discutir publicamente apoio a algum outro nome para 2026 que não seja Bolsonaro. A sigla, contudo, tenta atrair o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, hoje no Republicanos. Apesar de próximo ao ex-presidente, Tarcísio não é considerado do grupo mais radical do bolsonarismo e é cotado como alternativa pelo campo da direita para enfrentar Lula.
— Eu não tenho dúvida nenhuma de que o partido caminhará mais para o centro. As eleições municipais mostraram que quem ganhou as eleições foi o centro. Valdemar está conduzindo o partido e está ajustando nessa base do pessoal ficar mais moderado. A eleição mostrou que a tendência é essa — disse o deputado Antonio Carlos Rodrigues (PL-SP), ex-presidente do partido.
A avaliação de integrantes da legenda é que a inclusão de Valdemar na lista de indiciados pelos crimes de tentativa de golpe de Estado, tentativa de abolição do estado democrático de direito e organização criminosa se deu porque ele aceitou dar guarida a iniciativas golpistas. O dirigente virou alvo após o PL ingressar com uma ação no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), em novembro de 2022, pedindo a anulação de votos que deram a vitória eleitoral a Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Para a PF, a peça continha dados técnicos inconsistentes, “deliberadamente apresentados com ciência e autorização” de Valdemar.
— O PL é um partido plural, com deputados de centro-direita e a ala bolsonarista, no qual todos têm liberdade. O partido não terá uma orientação direta para a moderação, e a sucessão do Valdemar não é debatida. Mas, pode ser que seja natural que a turma mais à direita tenha mais cuidados, neste contexto de Bolsonaro e Valdemar indiciados — reconhece o líder do PL na Câmara, deputado Altineu Côrtes (PL-RJ).
Como mostrou a colunista Malu Gaspar, integrantes da legenda responsabilizam o senador Marcos Pontes (PL-SP), ex-ministro de Bolsonaro, por ter indicado a Valdemar o Instituto Voto Legal (IVL) para fiscalizar as urnas. A empresa, contratada pelo PL, foi quem produziu o relatório que embasou a ação no TSE.
Na ocasião, outras siglas que faziam parte da coligação de Bolsonaro, como Republicanos e PP, também constavam no documento, mas recorreram ao TSE para dizer que não concordavam e não tinham sido consultadas sobre a ação.
O movimento do grupo que prega moderação também tenta evitar nova ofensiva de bolsonaristas para tomarem o poder da legenda. Após o primeiro turno, o deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP), filho do ex-presidente, chegou a afirmar que poderia assumir o lugar de Valdemar. A justificativa, na época, foi a proibição de o mandachuva da legenda manter contato com Bolsonaro, determinada pelo ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF).
A iniciativa, porém, foi barrada por Valdemar. Em entrevistas, o presidente nacional da sigla disse que não deixará o posto “nem por reza brava”.
— Quando se falou sobre uma troca de comando, não foi algo pessoal, mas é porque é impossível você tocar um partido político em que o presidente de honra, Bolsonaro, e o administrativo, Valdemar, não podem se falar. A coisa não anda — afirmou o senador Jorge Seif (PL-SC), ex-secretário da Pesca de Bolsonaro.
Filho mais velho do ex-presidente, o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) nega que haja intenção de troca no comando da legenda neste momento.
— Não tem porque mudar. Valdemar é uma figura emblemática tem de ficar, a não ser que ele mesmo queira sair, o que também não é o caso. Não existe essa conversa — afirmou Flávio.
A alternativa de Valdemar para frear a ofensiva de bolsonaristas para comandar o PL foi dar mais espaço para o grupo ligado ao ex-presidente na estrutura da sigla. O partido criou uma secretaria de relações internacionais e a entregou a Eduardo, que tenta se colocar no papel de porta-voz da direita brasileira com outros líderes do mundo.
Preceitos da sigla
Além disso, a sigla planeja investir em iniciativas como “cursos de doutrinação” para propagar o pensamento da direita em regiões do país. Intitulado de Rota 22, o plano é promover eventos como os feitos antes das eleições pela ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro, que preside o PL Mulher. O dinheiro do fundo partidário financiaria o projeto.
— Vamos mostrar o que foi o governo Bolsonaro, quais são os valores que nos inspiram e que nos aproximam da grande maioria da população nordestina que pensa como nós — disse o secretário-geral da legenda, senador Rogério Marinho (PL-RN).
Temas como descriminalização das drogas, liberalismo econômico e segurança pública devem figurar entre os principais debates a serem colocados nessa caravana.
Os sinais trocados dentro do PL
Candidatura em 2026: Enquanto a ala histórica do PL defende a construção de alianças com partidos de Centro, sobretudo se Jair Bolsonaro se mantiver inelegível, o bloco bolsonarista é favorável apenas a nomes identificados com as bandeiras da direita.
Discurso modulado: integrantes do PL raiz avaliam que o melhor a se fazer diante do indiciamento pela PF de Valdemar Costa Neto e Bolsonaro é adotar um tom moderado nos discursos, em detrimento dos enfrentamentos bélicos comuns à ala ligada ao ex-presidente.
Comando da legenda: O grupo moderado tenta evitar nova ofensiva de bolsonaristas para tomar o poder da legenda. Após o 1º turno, Eduardo Bolsonaro chegou a afirmar que poderia assumir o posto de Valdemar, mas o presidente já disse que não sai “nem por reza brava”.