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Corrupção

Investigação de miliciano confirma método de contato com ex-assessores de Flávio Bolsonaro

Trocas de mensagens no celular de Márcia indicam que o objetivo do encontro era estabelecer contato com Adriano

Senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ)Senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ) - Foto: Jefferson Rudy/Agência Senado

A investigação sobre o período de fuga do miliciano Adriano da Nóbrega apontou que seus familiares tinham celulares exclusivos para manter contato com ele.

A informação confirma o método de contato apontado pelo Ministério Público do Rio de Janeiro entre pessoas ligadas ao senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ) e o miliciano, quando Adriano já estava foragido, em dezembro de 2019.


A apuração do caso das "rachadinhas" mostrou que Márcia Aguiar, mulher de Fabrício Queiroz e ex-assessora de Flávio, e Luiz Botto Maia, advogado e também ex-assessor do senador, foram até o interior de Minas Gerais se encontrar com Raimunda Veras Magalhães, mãe de Adriano e também ex-funcionária do filho do presidente Jair Bolsonaro.

Trocas de mensagens no celular de Márcia indicam que o objetivo do encontro era estabelecer contato com Adriano, em fuga sob acusação de comandar uma milícia.

As mensagens também sugerem que Júlia Lotuffo, namorada do miliciano, também participou do encontro. Esse foi um dos argumentos para prisão de Queiroz em junho do ano passado, atualmente revogada.

 



Adriano era amigo e foi companheiro de batalhão de Queiroz, amigo do presidente Jair Bolsonaro e apontado como operador financeiro da "rachadinha" no gabinete de Flávio na Assembleia do Rio.

O miliciano teve a ex-mulher e a mãe lotadas no gabinete de Flávio, ambas denunciadas junto com o senador sob acusação de envolvimento no esquema de desvio de dinheiro público.


Raimunda, Júlia e outros familiares e comparsas do miliciano eram, no mesmo período, alvos de escutas da Operação Gárgula, investigação que mirou a estrutura de lavagem de dinheiro de Adriano, bem como a tentativa de protegê-lo durante a fuga.


As interceptações telefônicas desta apuração mostram que Adriano, ex-capitão da Polícia Militar, exigiu que todos adotassem uma técnica chamada ponto-a-ponto, na qual mantinham aparelhos exclusivos para entrar em contato com ele.

O objetivo do método é evitar que o telefone usado para essas conversas fosse identificado em contato com outro membro da quadrilha. Todos também trocavam periodicamente de número de telefone a fim de fugir do monitoramento das autoridades.

Uma das responsáveis por organizar o contato e distribuir celulares era Júlia, atualmente considerada foragida. Ela é apontada pelo MP-RJ como a responsável por gerir os bens com dinheiro sujo do miliciano.

As escutas não flagraram conversas de Raimunda com Adriano ou com pessoas ligadas ao senador. Mas indicam que o método de contato com o miliciano descrito pelo MP-RJ na investigação da "rachadinha" era de fato utilizado por sua família.

Uma das evidências apontadas pela Polícia Civil é uma conversa da irmã de Adriano, Tatiana Magalhães da Nóbrega, com um outro alvo da investigação. Ela relata que precisa levar "o telefone" até a mãe, no interior de Minas Gerais, para que ela pudesse conversar com o filho.

Em outra conversa, Tatiana relata estar com cinco telefones, que a polícia suspeita serem aparelhos destinados ao contato com o miliciano.

Uma outra irmã do ex-PM, Daniela Magalhães da Nóbrega, afirma numa conversa telefônica que receberia a visita de um coronel da PM interessado em pedir dinheiro emprestado para Adriano. A conversa indica que ela estabeleceria o contato por meio de um dos telefones destinados para este fim.

Os investigadores grampearam dezenas de telefones entre junho de 2019 e fevereiro de 2020 para tentar identificar os celulares que estabeleciam contato com Adriano. A busca, porém, coletou apenas evidência da técnica ponto-a-ponto, mas sem conseguir descobrir seus números.

O ex-capitão foi morto num sítio em Esplanada (170 km de Salvador) em 9 de fevereiro de 2020 numa operação da Polícia Militar da Bahia com a participação de agentes fluminenses. A polícia da Bahia afirma que ele disparou contra os agentes quando foi localizado. Ele estava foragido havia um ano sob acusação de comandar a milícia da favela Rio das Pedras.
Dez dias antes ele havia conseguido escapar de um cerco na Costa do Sauípe, onde estava com Julia.


O encontro de ex-assessores de Flávio com a família de Adriano foi apontado na investigação da suposta "rachadinha" no antigo gabinete de Flávio na Assembleia Legislativa. Ele ocorreu entre os dias 3 e 4 de dezembro, de acordo com os promotores.


Segundo os investigadores deste caso, Botto Maia e Márcia Aguiar, mulher de Queiroz, se encontraram em 3 de dezembro de 2019 com Raimunda e Julia em Astolfo Dutra (MG), cidade da zona da mata mineira.

A prova apresentada pela Promotoria para apontar como razão do encontro a comunicação com Adriano é uma mensagem apreendida no celular de Márcia em que ela relata a Queiroz que também estaria presente a mulher do miliciano.


"A esposa do amigo vai estar com a mãe dele terça-feira [dia 3/12/19]. Aí ela vai falar com o amigo sobre o recado.

Depois que ela falar com o amigo, ela vai entrar em contato comigo", escreveu Márcia. O amigo, para os investigadores, é o miliciano até então foragido Adriano da Nóbrega.

O miliciano tem um histórico de relacionamento com os Bolsonaro desde 2003, quando recebeu uma homenagem de Flávio Bolsonaro na Assembleia Legislativa.

Dois anos depois, enquanto estava preso preventivamente pelo homicídio de um guardador de carros, foi condecorado por Flávio com a Medalha Tiradentes, a mais alta honraria da Assembleia Legislativa do Rio.

Adriano também foi defendido por Jair Bolsonaro, então deputado federal, em discurso na Câmara dos Deputados, em 2005, por ocasião da condenação por homicídio. O ex-capitão seria absolvido depois em novo julgamento.

Em 2007, o miliciano indicou a ex-mulher e a mãe para trabalharem no gabinete de Flávio na Assembleia. Queiroz afirmou que foi o responsável pela nomeação. Segundo o MP-RJ, as duas eram funcionárias fantasmas e foram denunciadas junto com o senador.

De acordo com a quebra de sigilo bancário do caso, anulada pelo STJ (Superior Tribunal de Justiça), parte do dinheiro repassado ao ex-assessor de Flávio passava por contas geridas pelo miliciano. A investigação também identificou conversas entre Adriano e sua ex-mulher que indicam que parte do valor recebido por ela beneficiava também o ex-capitão.

A defesa de Queiroz e Márcia não comentou o suposto contato com Adriano. Ela negou o envolvimento do ex-assessor do senador no esquema da "rachadinha"

A defesa de Julia Lotuffo disse, em nota, que nega as acusações contra sua cliente.

"Ela nunca teve qualquer participação em eventuais condutas ilegais que possam ter sido praticadas por seu falecido marido. Ela teme pela sua vida e pela vida de sua filha, razão única pela qual ainda não se entregou", afirma a nota da defesa da namorada de Adriano.

 

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