Juiz federal, militante de Lula em 89, governador e morte de filho: a trajetória de Flávio Dino
Ministro da Justiça precisa ser aprovado com maioria absoluta na CCJ e no plenário do Senado Federal para ter sua indicação ao Supremo aprovada
Indicado ao Supremo Tribunal Federal (STF) pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o ministro da Justiça, Flávio Dino, será sabatinado pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado Federal nesta quarta-feira (13). Na sequência, o nome vai a plenário e precisa dos votos favoráveis de ao menos 41 dos 81 parlamentares. Senador eleito em outubro, Dino, de 55 anos, foi juiz federal e ingressou na política ainda jovem. O magistrado também foi governador do Maranhão por dois mandatos, deputado federal e presidente da Embratur.
Filiado ao PT em 1987, Dino iniciou a carreira política no movimento estudantil maranhense, tendo participado da campanha presidencial de Lula dois anos depois. Aos 26, se tornou juiz federal do Maranhão e Distrito Federal. Ele ocupou o cargo entre 1994 e 2006.
Entre 2000 e 2002, presidiu a Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe). Depois, foi o primeiro secretário-geral do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), órgão criado em 2005 para supervisionar o funcionamento do Judiciário.
Mestre em Direito Público pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), sua dissertação, defendida em 2001, foi justamente sobre a proposta de criação do CNJ, que se concretizaria anos depois. Também é professor licenciado da Universidade de Maranhão e membro da Academia Maranhense de Letras.
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No mesmo ano em que se filiou ao PCdoB, em 2006, Dino se elegeu para uma vaga na Câmara dos Deputados. Como deputado, Dino apresentou uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) prevendo mandato de 11 anos para ministros do STF. Ele voltou a defender a proposta neste ano, já como ministro da Justiça. Na época, também foi relator de uma minirreforma eleitoral que determinava, entre outros pontos, a adoção do voto impresso em parte das urnas eletrônicas.
Com dois anos de mandato, disputou o cargo de prefeito de São Luís nas eleições municipais de 2008, sem sucesso. Ele não conquistou o cargo e voltou à Câmara. Em 2010, tentou pela primeira vez disputar o governo do Maranhão, mas foi derrotado ainda no primeiro turno por Roseana Sarney (MDB). Roseana era apoiada por uma ampla coligação de partidos, entre eles o PT.
Em 2011, durante o governo de Dilma Rousseff, assumiu a presidência da Embratur, com a promessa de aumentar o fluxo de turistas estrangeiros no Brasil, diante de eventos como a Copa do Mundo de 2014 e as Olimpíadas, em 2016.
No ano seguinte, uma tragédia familiar abalou a vida de Dino: a morte do filho Marcelo, de 13 anos. O adolescente morreu depois de dar entrada no Hospital Santa Lúcia, no Distrito Federal, devido a uma crise de asma. A família entrou na Justiça contra a médica e a auxiliar de enfermagem, acusadas de erro médico.
A alegação foi a de que a médica abandonou o posto da UTI pediátrica do hospital e, por isso, houve demora no atendimento do menino. A profissional e uma auxiliar de enfermagem foram absolvidas em 2018 "por insuficiência de provas".
Em 2014, Dino deixou o cargo na Embratur para concorrer ao governo do Maranhão. Foi eleito com mais de 60% dos votos, vencendo o adversário do MDB, Lobão Filho. Sua gestão foi marcada por ações na Educação do estado, com investimentos na reforma de escolas e em medidas contra o analfabetismo.
Dino foi reeleito governador em 2018, ao disputar a vaga com Roseana Sarney, filha de José Sarney, poderoso cacique do estado. Dino foi um dos principais políticos que fizeram oposição à família Sarney no Maranhão. O ministro da Justiça e o ex-presidente da República, no entanto, se aproximaram nos últimos anos e ele foi um dos cabos eleitorais no Senado da indicação de Dino para o STF.
Pai de três filhos e autor de diversos livros sobre Direito, deixará a vaga no Senado para sua primeira suplente, Ana Paula Lobato (PSB), que foi vice-prefeita do município de Pinheiro. Dino deixou o PCdoB rumo ao PSB em 2021.
Como governador, também foi presidente do Consórcio Amazônia Legal, grupo que reúne representantes dos nove estados da região. Em 2022, deixou o governo estadual antecipadamente para poder concorrer ao Senado. Foi eleito, mas não chegou a exercer o cargo por ter sido nomeado ministro da Justiça.
No comando da pasta, ele lidou logo nos primeiros dias com os atos de 8 de janeiro. Determinou a atuação da Força Nacional e foi essencial na articulação que levou o secretário-executivo da pasta, Ricardo Cappelli, a exercer o cargo de interventor na Segurança Pública do Distrito Federal. A atuação também acirrou ânimos e fez com que ele fosse convocado diversas vezes a prestar esclarecimentos na Câmara.
Durante a gestão de Dino, as investigações sobre o assassinato da vereadora Marielle Franco e do motorista Anderson Gomes deram novos passos: o ex-policial Élcio Queiroz fechou uma delação premiada com a Polícia Federal e o Ministério Público do Rio, confessou participação no crime e confirmou que os disparos foram feitos por Ronnie Lessa. As revelações resultaram na prisão do ex-bombeiro Maxwell Corrêa, que, de acordo com as apurações, atuava na "vigilância e acompanhamento" de Marielle. De acordo com Dino, é "indiscutível" que a morte de Marielle tem relação com a atuação das milícias no Rio.
Os últimos meses de Dino à frente do ministério foram marcados por crises de segurança pública em estados do país, entre eles a Bahia e o Rio, que está com um decreto de Garantia da Lei e da Ordem (GLO) em vigor até maio de 2024. Sob pressão de parte do PT por não deixar uma “marca” da gestão na área da Segurança Pública, Dino lançou recentemente o Programa Nacional de Enfrentamento às Organizações Criminosas, com o objetivo de fortalecer a investigação criminal, atividade de inteligência e um enfrentamento sistêmico das organizações criminosas.
A indicação do pessebista ao STF ocorreu em meio à pressão sobre o presidente Lula para a indicação de uma mulher para a vaga, principalmente após as seguidas demissões de representantes femininas de cargos do primeiro escalão do governo. O presidente, no entanto, afirmou que o critério não seria esse.
A vaga no STF estava aberta desde o dia 29 de setembro. Depois de idas e vindas, a decisão foi sinalizada por Lula durante encontro com os ministros do STF Gilmar Mendes, Alexandre de Moraes e Cristiano Zanin. Dino tem proximidade com Gilmar e Moraes e a possível escolha de seu nome sempre foi bem-vista pelos dois ministros da Corte. Dino poderá ficar no STF por duas décadas. — a aposentadoria compulsória de magistrados ocorre aos 75 anos.
Sabatina no Senado
O presidente da CCJ, Davi Alcolumbre (União-AP), decidiu fazer a sabatina dos indicados do petista para o STF e para a Procuradoria-Geral da República (PGR) simultaneamente. Desta forma, Dino e o subprocurador Paulo Gonet serão questionados em uma mesma sessão pelos senadores.
Apesar da avaliação conjunta e dos pareceres favoráveis aos dois nomes, nos bastidores a avaliação é de que a sabatina recairá muito mais sobre Dino do que sobre Gonet. O foco dos senadores, sobretudo da oposição, deverá se concentrar sobre o ministro da Justiça, que antagonizou com líderes da oposição em diversas ocasiões no Congresso.
A oposição planeja transformar a sabatina de Dino em uma extensão da CPI do 8 de Janeiro. O objetivo é desgastá-lo com assuntos ligados ao Ministério da Justiça, como a ausência de imagens do circuito interno no dia dos atos golpistas, o recebimento de alertas da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) e a atuação da Força Nacional.
Adversários do governo preveem uma sabatina longa, que também passará pela pauta de costumes e a presença da mulher de um líder de facção criminosa no Amazonas, condenada a dez anos de prisão, em dois encontros com auxiliares de Dino na Justiça. A gestão no Maranhão, estado que governou de 2014 a 2022, também deve ser alvo de questionamentos.
Segundo o blog da Malu Gaspar, no Globo, bolsonaristas também devem explorar a visita de Dino ao Complexo da Maré, em março. À época, parlamentares da oposição acusaram o ministro de ter sido aceito na região por algum tipo de ligação com criminosos, o que foi rebatido pelo ministro como “ódio” da extrema-direita “a lugares onde moram os mais pobres”.