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Câmara dos Deputados

Lira amplia espaço no governo e mantém indicados em postos que controlam R$ 25 bilhões

Presidente da Câmara tem apadrinhados em cargos estratégicos e negocia indicações com partidos para mantê-los em seu bloco de apoio

Arthur Lira, presidente da Câmara dos DeputadosArthur Lira, presidente da Câmara dos Deputados - Foto: Zeca Ribeiro/Câmara dos Deputados

A nomeação de um aliado, Carlos Antônio Vieira, à presidência da Caixa Econômica Federal ampliou o leque de influência do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), sobre postos do Poder Executivo que tratam de interesses locais a agendas centrais do governo Lula. A verba sob a alçada de indicados por ele na administração federal ultrapassa R$ 25 bilhões. Para efeito de comparação, o orçamento secreto, usado para destinar verbas da União a parlamentares de forma desigual e sobre o qual o deputado tinha forte influência, previa R$ 19,4 bilhões neste ano, antes de sua extinção. Especialistas veem a ascendência sobre recursos e bancadas na Câmara como evidência de um protagonismo inédito de Lira, na comparação com antecessores no comando da Casa.

Além da Caixa, o deputado federal, em seu terceiro mandato, mantém apadrinhados no Ministério do Esporte, numa unidade regional da Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (Codevasf), no comando da Companhia Brasileira de Trens Urbanos (CBTU), no Departamento Nacional de Obras Contra as Secas (Denocs), assim como Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) e no Porto de Maceió.

O avanço sobre novos espaços, além da manutenção de apadrinhados nomeados nos governos de Michel Temer (MDB) e de Jair Bolsonaro (PL), vem ocorrendo a despeito de críticas feitas pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, na última campanha eleitoral, ao poder de seu neoaliado. À época, ao comentar uma proposta de adoção do semipresidencialismo, o petista acusou Lira de querer “tirar poder do presidente para que fique na Câmara dos Deputados”, e se referiu ironicamente ao parlamentar como “imperador do Japão”.

Relações pessoais
Agora, após indicar o comando da Caixa, Lira articula a distribuição das vice-presidências do banco entre partidos como PL, Republicanos e PSDB, de olho em mantê-los no seu próprio bloco de apoio na Câmara.

A cientista política Joyce Luz, pesquisadora do Observatório do Legislativo Brasileiro (OLB) da Uerj, avalia que há uma diferença qualitativa no método de indicações de Lira em comparação ao ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha, que manteve influência em diretorias da Caixa e de Furnas durante diferentes governos. Cunha e seu antecessor no comando da Casa, o emedebista Henrique Eduardo Alves, chegaram a ser condenados em primeira instância por desvios na Caixa, mas a sentença foi anulada pela Justiça Federal em 2021.

— Por mais que houvesse indicações ligadas ao Cunha, a unidade de apoio era o PMDB (hoje MDB). Com Lira, a indicação ganhou cunho mais pessoal do que partidário, já que os parlamentares foram deixando de atuar em referência a seus partidos. Isso obriga o governo a negociar diretamente com ele (Lira)— afirma.

Lira já mantinha um feudo na CBTU, presidida desde 2017 por um aliado, José Marques de Lima. Com orçamento de R$ 1,3 bilhão, a maior parte em despesas obrigatórias, a estatal é responsável pela malha ferroviária em Maceió e outras três capitais.

Sob Lula, Lira avançou sobre o Ministério do Esporte, com a indicação do aliado André Fufuca (PP-MA), negociada junto com o ingresso do Republicanos no governo. A pasta, recriada neste ano com dotação de R$ 1,2 bilhão, custeia tanto esportistas de alto rendimento quanto a construção de equipamentos, como campos de futebol, para uso de times amadores e regionais.

Para o cientista político Rafael Cortez, professor do Instituto Brasileiro de Ensino, Desenvolvimento e Pesquisa (IDP) e sócio da Tendências Consultoria, a centralidade de Lira na troca da Caixa reforça uma atuação “presidencialista” da Câmara, o que não necessariamente “afeta a governabilidade, mas sim o poder de barganha do Executivo”. O banco estatal tem uma carteira de financiamentos para projetos de infraestrutura em estados e municípios que soma R$ 14,7 bilhões só em contratos firmados em 2023.

A Caixa também é responsável pela operação e gerenciamento de recursos do Minha Casa Minha Vida, uma das principais vitrines do governo. Neste ano, a previsão orçamentária do programa é de R$ 9,8 bilhões, em sua maioria de dois fundos — o Fundo de Arrendamento Residencial (FAR) e o Fundo de Desenvolvimento Social (FDS) — custeados pela União.

Pesquisador do Centro de Estudos de Administração Pública e Governo da FGV, o cientista político Marco Antônio Teixeira afirma que a influência sobre recursos públicos “cria uma rede de dependências”, com desdobramento na “lealdade eleitoral”.

— No financiamento privado de campanha, Cunha comandava a bancada do Centrão ao coordenar doações de empresas. Lira atingiu maior eficiência, pois comandar recursos públicos vale mais do que brigar por doação eleitoral. Nesse sentido, a Caixa tem um simbolismo muito forte, é um meio para efetivar políticas públicas — diz Teixeira.

Fiador de aliados
Cunha teve o mandato na presidência abreviado por sua cassação, em 2016, em meio a denúncias de corrupção. Com trajetória similar, o ex-presidente da Câmara Severino Cavalcanti, representante do baixo clero, sucumbiu após sete meses no cargo em 2005, envolvido em denúncias de desvios na Casa. Ele se notabilizou por cobrar do governo Lula a nomeação na Petrobras de um aliado “na diretoria que fura poço e acha petróleo”.

Antecessor de Lira, Rodrigo Maia teve longevidade e influência semelhantes na Casa, segundo especialistas, mas sem a mesma ramificação fora dela. Após ajudar na sustentação política do governo Temer, quando a Câmara barrou dois pedidos da Procuradoria-Geral da República (PGR) para processar criminalmente o então presidente, e articular a reforma da Previdência em 2019, Maia acumulou atritos com aliados, como o próprio Lira, e perdeu espaço.

Lira também é fiador de uma rede de aliados em cargos federais em Alagoas. Seu primo, Joãozinho Pereira comanda a superintendência da Codevasf no estado, e tem usado obras de pavimentação custeadas com emendas do deputado como plataforma para concorrer à prefeitura de Junqueiro, reduto de Lira, em 2024.

Com atuações similares, o superintendente do Incra, César Lira, e o coordenador do Dnocs, Arlindo Garrote, ambos indicados por Lira, devem concorrer às prefeituras de Maragogi e Estrela de Alagoas. Caso eleitos, a tendência é que atuem como cabos eleitorais de Lira em uma possível disputa ao Senado em 2026.

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